Janaina Edwiges 26/12/2021
Se você gosta da Charlotte Brontë, vai AMAR este livro!
Antes de iniciar a leitura de A vida de Charlotte Brontë é muito importante que você preste atenção em duas questões:
1. Há uma intenção por trás de quem escreveu este livro. Elizabeth Gaskell foi contemporânea e amiga de Charlotte Brontë e buscou redigir uma biografia que enaltecesse a amiga, que transmitisse a imagem de filha e irmã dedicada, de boa esposa e de uma escritora com uma vida respeitável. Para atingir seu propósito, Gaskell omitiu vários episódios que poderiam causar danos à reputação de Charlotte Brontë ou que poderiam envergonhar o pai, Patrick Brontë e o marido, Arthur Bell Nicholls, ainda vivos na época. Dentre eles, a forte paixão de Charlotte por seu antigo professor, Constantin Héger, um homem casado.
2. Na primeira edição, publicada em 1857, Gaskell enfrentou uma série de acusações por difamação e ações judiciais, vindas de pessoas que foram citadas na biografia, mas que se sentiram de alguma maneira prejudicas. Em razão desses problemas, a segunda edição lançada foi totalmente mutilada, sendo essa a utilizada para tradução.
Buscando corrigir essas duas questões, a edição da Editora Pedrazul apresenta várias notas de rodapé explicativas ao longo do texto, bem como informações complementares na conclusão, muitas delas descritas por outros biógrafos de Brontë. Tudo isso possibilita ao leitor um maior entendimento do contexto, das controvérsias e do que foi suprimido por Gaskell.
As fontes para elaboração desta biografia foram, principalmente, as cartas enviadas por Charlotte à sua melhor amiga (Ellen Nussey) e a outras amigas e conhecidos próximos, como seus editores. Ler as cartas escritas pela própria Charlotte é simplesmente incrível, pois nos permite ter acesso aos sentimentos mais íntimos da autora. Além disso, Gaskell se utilizou de muitos depoimentos. Os dela própria e de outras pessoas que conviveram com Charlotte, como empregadas do presbitério, vizinhos e escritores.
Esta biografia é extremamente rica, revela vários detalhes pessoais e traços da personalidade de uma das mais talentosas escritoras inglesas da era vitoriana. Ao longo das páginas, temos acesso ao relacionamento dos pais de Charlotte, fatos de sua infância e adolescência e situações vivenciadas no trabalho como professora e governanta. Conhecemos as impressões sobre os lugares novos que ela visitava, além dos detalhes marcantes do tempo em que ela passou em uma escola de Bruxelas. Ouvimos suas opiniões acerca de diversos assuntos, como os relacionados à política e à situação das mulheres. Também podemos conhecer um pouco mais da personalidade das outras irmãs Brontë, Emily e Anne e dos graves problemas enfrentados pelo irmão, Branwell. Mergulhamos na paixão de Charlotte pela literatura, suas opiniões sobre diversos escritores e livros famosos, sua relação com a própria escrita e em como ela lidava com as críticas às suas obras e com a fama alcançada após a publicação de Jane Eyre.
Se você já leu algum livro da Charlotte, esta biografia vai te fazer querer relê-lo e, se não leu, vai te permitir fazer a leitura com um olhar bem diferenciado, porque, como nos revela Gaskell: ?Charlotte Brontë foi uma autora que se utilizou dos acontecimentos pessoais para compor seus romances; não somente daquilo que se passara com ela e os seus, mas daquilo que ouvira. Sobretudo, as impressões que esses acontecimentos tinham sobre ela. Nada era desperdiçado, tudo era transformado em arte".
Terminei a leitura ainda mais fascinada pela vida de Charlotte Brontë! Com certeza ela não era a filha e irmã perfeita, que esta biografia quis ressaltar na maior parte do tempo. Muitos atritos devem ter ocorrido, como sabemos que existem e são comuns nas relações familiares. Para mim, é justamente neste ponto que reside o encanto. Charlotte era como qualquer outra pessoa, com erros e acertos, visões de mundo, alegrias, medos, angústias, dores e sofrimentos. Sua trajetória nos toca em vários momentos, especialmente na solidão que ela enfrentou após o falecimento de suas irmãs.
No final desta edição temos ainda os dois primeiros e únicos capítulos do livro Emma, obra inacabada da Charlotte Brontë. Infelizmente, ela faleceu antes de finalizar a história e o começo nos deixa com um gostinho de quero mais.