Aione 21/06/2018Surprise me é o mais recente lançamento de Sophie Kinsella, publicado no Brasil pela editora Record sob o título Mas tem que ser mesmo para sempre?. Se com Minha Vida (Não Tão) Perfeita a autora já havia inovado ao não colocar a relação amorosa como centro da trama, em seu novo título ela inova mais uma vez ao dessa vez abordar o casamento (de maneira diferente do feito em A Lua de Mel), em vez de um casal que está se apaixonando.
Sylvie e Dan são “um casal com C maiúsculo”: próximos, estáveis e felizes, sentem que conhecem um ao outro com profundidade e que nada pode abalar a sólida relação entre eles. Até que uma consulta médica revela que eles têm a probabilidade de viver por ainda muitas décadas e a perspectiva os aterroriza: como eles vão conseguir manter o relacionamento por mais quase setenta anos? Então Sylvie tem a ideia de começarem a fazer pequenas surpresas um para o outro para manter o vigor da relação, sem imaginar que isso poderia desencadear a revelação de surpresas nem um pouco agradáveis.
Falar da narrativa de Sophie Kinsella é redundante quando esse comentário vem de mim. Assim como em seus outros livros, mergulhei na leitura desde o início: a escrita de Mas tem que ser mesmo para sempre? é deliciosamente espirituosa, com passagens divertidíssimas que, em primeira pessoa, sobretudo revelam os pensamentos mais íntimos de Sylvie. Com isso, já temos uma parte bastante característica da construção das personagens de Kinsella, já que a protagonista tem os momentos de insegurança, neurose e até mesmo imaturidade que as tornam tão típicas. No fundo, essas mocinhas revelam algo existente em todos nós, ainda que não gostemos de admitir por não serem atributos louváveis. Porém, é justamente aí que o momento cômico se faz na leitura: rimos pelo absurdo das situações, mas também rimos por aqueles momentos com os quais nos identificamos, ainda que somente em partes. Merece destaque também, em relação à escrita, o trabalho de tradução. Sophie Kinsella faz uso de alguns neologismos utilizados por Sylvie e a escolha de Raquel Zampil como tradutora foi bastante interessante, especialmente por manter o sentido original desejado pela autora agora aplicado ao português brasileiro.
De qualquer maneira, o que me ganhou em Mas tem que ser mesmo para sempre? não foi simplesmente o fato de ter me proporcionado uma leitura tão gostosa e cativante, mas a maestria com que Sophie Kinsella dominou o enredo e foi capaz de desenvolvê-lo tão bem, especialmente por ter se aprofundado com delicadeza e habilidade nas personagens. A história começa sendo tipicamente divertida, com passagens hilárias que beiram o improvável (e por isso nos fazem rir). Mas, pouco a pouco, a autora encaminha a trama para as questões que quer trabalhar e logo nos vemos em uma espiral de sentimentos: sentimos a dor pelas dificuldades, ficamos angustiados com as incertezas e nos vemos ávidos pelas revelações que trarão consigo novamente a calmaria. Nesse meio tempo, acompanhamos Sylvie questionando o quanto conhece as pessoas ao seu redor e, mais do que tudo, o quanto conhece a si mesma.
E, apesar de ser completamente fã de Sophie Kinsella, a autora ainda assim conseguiu me surpreender — eu não esperava encontrar o que li em Mas tem que ser mesmo para sempre?. Inclusive, fiquei completamente satisfeita com a maneira de como ela abordou uma temática importantíssima que surge com as reviravoltas da história pela importância que Sylvie dedica ao caso, mesmo em meio ao seu caos e reestruturação interior. Os conflitos vivenciados pela personagem especialmente ao fim da leitura soaram extremamente reais e trouxeram ainda mais significado à trama.
Mas tem que ser mesmo para sempre?, no fim, é um livro sobre as dificuldades de um relacionamento a dois, mas é também uma história sobre as imprevisibilidades da vida e as dificuldades em se lidar com esses imprevistos. É uma história sobre como enxergamos as situações com as quais nos deparamos e sobre como, muitas vezes, somos levados a enxergá-las. É uma história sobre se redescobrir e redescobrir o outro, sem deixar de ser, também, uma história sobre a força do amor. Terminei a leitura, mais uma vez, com lágrimas nos olhos e um sorriso bobo no rosto, agradecida por mais uma experiência completamente inebriante que apenas Sophie Kinsella é capaz de me proporcionar.
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