blacktonks 10/09/2022
Esse livro é acima de tudo sobre solidão.
Decidi que iria maratonar Gabriel Garcia Márquez depois de uma tarde que senti saudade dele. Já tinha lido "Do amor e outros demônios" e "As aventuras de Miguel Líttin clandestino no Chile", obras que não são as suas mais famosas, mas que são ótimas e que vez ou outra me fazem ir até a estante, pegar o exemplar e reler algumas partes... sou fissurada na escrita desse homem. Então, pensei "por que não começar do começo?" e aqui estou eu em uma jornada pelas histórias do Gabo e iniciando com a sua primeira publicação: A Revoada (ou o enterro do diabo).
Em um resumo, a história narra a preparação para um enterro de um homem odiado por toda a cidadezinha da qual vivia (Macondo, também cenário do clássico "Cem anos de solidão") narrado sob três perspectivas: do Coronel (aparentemente a única pessoa que ainda se importava com ele o suficiente para que se fizesse o enterro), a sua filha Isabel, Chabela para os íntimos, e o filho de Isabel, uma criança de pouco mais de 10 anos. No entanto, embora pareça que o protagonista do livro seja o homem odiado do qual conhecemos apenas pelo nome de doutor, o grande astro do livro na verdade é a solidão.
A solidão em "A Revoada" está impregnada em cada linha, é tão exposta que por vezes nem a notamos quando focados no drama e curiosidade sobre os personagens (dramas esses que muitas vezes nem tivemos respostas). É a solidão dentro de um casamento confuso e turvo, a solidão de um velho coronel que perdeu tudo na guerra e que precisou deixar sua terra e tornar refugiado em uma cidadezinha no meio do nada se apoiando em baús velhos cheios de tralhas dos antepassados na ilusão de trazer consigo tudo que precisou deixar para trás, a solidão das descobertas do fim da infância e início da juventude, a solidão de um homem odiado que já estava tão sozinho dentro de si que se fez ser odiado e a solidão da própria Macondo que parece ter sido esquecida por tudo, inclusive pela modernidade que avançava no solo latino naqueles tempos, e que só espera o vento final para ser varrida totalmente a sua existência.
As descrições desoladoras é algo típico do Gabo que ele faz tão bem e os diálogos são sempre muito interessantes, mas senti falta por mais informação e as vezes me perdi nas trocas de ponto de vista. No todo, o livro de estreia de Gabriel, escrito no auge dos seus 28 anos, já mostrava seu talento como um dos autores mais consagrados do mundo.