Ivy (De repente, no último livro) 01/02/2019
Resenha do blog "De repente, no último livro"
Máquinas Mortais é o primeiro volume de uma tetralogia steampunk, que recentemente ganhou uma adaptação para o cinema, e que conta com uma grande vantagem: embora seja uma série, suas historias possuem começo, meio e final conclusivos, sendo que cada continuação contará com um conflito diferente do anterior, permitindo que o leitor possa vivenciar toda uma nova situação com cada livro. Num mundo literário onde quase tudo se torna série e as continuações de histórias até comuns parecem se prolongar até o infinito, é bacana poder contar com uma saga que, embora retrate sempre o mesmo universo (que diga-se de passagem é muito original e amplo), vai mudando com relação à trama, inserindo novos personagens e prometendo um final fechado em cada edição.
Nessa primeira parte o leitor é ambientado nesse futuro sombrio e improvável de Phillip Reeve. Depois da grande Guerra dos Sessenta Minutos onde a humanidade praticamente se dizimou, e países inteiros desapareceram do mapa, os sobreviventes tiveram que se reagrupar e com o passar dos anos, a vida em movimento tornou-se a regra. Agora, as cidades já não estão em um lugar definido como outrora, mas são navegantes, mudando a rota e a localização à cada instante. É impossível rastrear outros países e essa inconstância fez cada cidade tornar-se isolada das demais. Além disso, esse novo modo de vida possui sua própria cadeia alimentar. Para sobreviver, uma cidade se alimenta de outras. É como se fossem verdadeiros piratas, engolindo os menores e mais frágeis que há pelo caminho, saqueando seus bens e matéria prima, muitas vezes escravizando populações, tudo em nome de uma sobrevivência voraz.
Thaddeus Valentine é uma lenda em Londres, ele é um famoso historiador, o mais importante de todos e suas descobertas causam inveja. Valentine é aventureiro, desbravador e conhece até os lugares mais longinquos. Ele é um ídolo para Tom Natsworthy, um jovem aprendiz. Porém, quando uma jovem tenta assassinar Valentine, Tom pensa que se tornará um herói ao salvar a vida do grande historiador, no entanto, quando Tom escuta algo que não deveria, ele é traído por Valentine, e arremessado para fora de Londres, em terra firme, forçado a viver como um andarilho, num mundo hostil. Em princípio Tom não entende porque o bondoso Valentine o traiu, mas com o passar do tempo, ao ser obrigado a conviver com Hester Shaw, a garota que busca matar Valentine, Tom descobre que Londres é mais perigosa do que imaginava e que os planos do líder da cidade podem causar uma nova onda de destruição capaz de abalar a civilização inteira mais uma vez.
Enquanto Tom tenta desarmar a ameaça em Londres ao lado de aliados improváveis nesse estranho mundo novo, a filha de Valentine, Katherine, já está desconfiada de algum esquema suspeito e após o atentado contra Valentine, ela fará de tudo para descobrir a verdade por trás das mais famosas expedições de seu famoso pai e essa verdade pode unir os destinos de todos eles, outra vez.
Máquinas Mortais desde os primeiros capítulos já começa cheio de intriga e com revelações inesperadas. O autor vai inserindo o leitor nesse mundo novo bem aos poucos, mas de uma maneira bastante firme, simples, que permite que o leitor entenda sem dificuldades esse universo onde nações se voltam contra outras nações numa espécie de lei do mais forte. Gostei demais do livro porque o ritmo não decaiu nem o começo e nem no final, Reeve soube manter-se sempre na mesma linha de narração, e a alternância de personagens que contam sua história deixou a trama mais interessante, pois temos os pontos de vista de Tom e de Katherine, cada um nos permitindo conhecer um lado diferente da moeda, e ao fim o leitor se torna apto também para julgar quem está correto e quem é vilão.
Os personagens são fortes e carismáticos. Katherine foi uma revelação pra mim porque no começo me pareceu a filha mimada do herói da cidade e então, de repente, se torna uma fortaleza, guerreira e determinada em descobrir uma verdade que ela sabe que foi escondida de todos. Katherine não se ilude, e se permite duvidar de todos, ao mesmo tempo em que ainda mantém uma certa inocência que é coerente com o perfil do personagem.
Os outros dois protagonistas, Tom e Hester também são igualmente interessantes, justamente por não possuírem os perfis típicos de protagonista. Nenhum deles é extremamente heroico, e eles possuem debilidades e complexos que os mostram muitas vezes como frágeis, porém, em momentos cruciais, conseguem se defender, surpreender e garantir momentos de tensão ao leitor. Essas personalidades inconstantes de cada personagem garante um toque bem único à história.
A ambientação foi o que mais gostei porque é complexo, mas não é complicado. Foi fácil de entender os conceitos todos e até mesmo visualizar essa realidade sob rodas criada pelo autor. Embora seja uma ambientação totalmente nova pra mim, não me causou estranheza em nenhum momento, e a linguagem acessível do autor deixou a trama leve, perfeita para todas as idades.
Phillip Reeve não tem dó de seus personagens. É uma trama bem brutal, retratando um mundo predador, então, Reeve consegue deixar bem demonstrada a insegurança daquelas pessoas e o quão incerto é o futuro de cada um deles. A trama toda é cheia de perdas, e o fato de eu ter me apegado à alguns personagens ali só me fez sofrer pois como disse, as perdas são inevitáveis durante toda a trama.
Há mortes, há tiros, há conflitos e traições e temos também um vilão bem caracterizado porque pra mim ele também não foi típico. É um vilão que apesar de fazer o mal, possuí também um lado bom, um vilão que consegue demonstrar frieza e amor em momentos distintos da leitura, e o fato de possuir dois lados, um capaz de amar e outro capaz de destruir o torna inconstante e imprevisível.
A narrativa de Reeve como já disse se mantém sempre no mesmo ritmo, é simples e fácil de entender, numa linguagem agradável, que prende o leitor à história. Nada de palavras rebuscadas ou conclusões difíceis, nada de ficar dissertando demais acerca de um tópico ou aprofundar-se em excesso nas descrições. Phillip Reeve conseguiu poupar o leitor, e entregar uma obra fresca em originalidade e envolvente.
Se eu quero seguir lendo a saga? Com certeza esperarei ansiosa pela segunda parte pois, apesar do final fechadinho, fiquei bem curiosa em conhecer mais desse universo steampunk e futurista, com ares bem obscuros que, com certeza, ainda tem muito à revelar.
Enfim, Máquinas Mortais foi um inicio de saga convincente que pude ler rapidamente por conta da narrativa fluída e simples. Os personagens carregados de dualidades ficaram bem caracterizados e a ambientação foi o que mais me encantou pois é algo novo dentro do que sempre leio. Estou querendo também conferir a adaptação pois uma história grandiosa como essa tem tudo para estar sensacional também nas telonas.
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