Queria Estar Lendo 10/07/2018
Resenha: Graça e Fúria
Graça e Fúria é o lançamento da Editora Seguinte para esse mês de Julho. Consegui esse ARC lá na Flipop e não poderia ter ficado mais feliz! A obra de Tracy Banghart te prende desde a primeira página, e fala sobre mulheres encontrando a voz em um mundo que resolveu silenciá-las.
O reino de Viridia é cruel com suas mulheres. Elas não têm direitos, subjugadas às vontades de seus familiares e dos governantes - dos homens. Serina e Nomi tiveram criações diferentes, apesar de serem irmãs. Serina foi criada à perfeição, à submissão, a ser uma graça da cabeça aos pés. Nomi, a ajudá-la e servi-la e obedecer à posição de aia, caso a irmã fosse escolhida pelo herdeiro ao trono.
Uma confusão no palácio acaba por incriminar Serina de algo que ela não fez, e Nomi se torna a graça do príncipe herdeiro. Serina é enviada para uma ilha-prisão, e Nomi aprisionada pelas paredes do palácio. Para sobreviverem, precisarão mudar tudo em seus trejeitos e em suas crenças. Para aguentar, precisarão encontrar suas vozes e resistir.
Graça e Fúria já estava na minha estante do Goodreads desde seu anúncio. Quando soube que a Seguinte traria para cá simultaneamente, me segurei pela edição brasileira. E, senhoras e senhores, que livro.
"A toda mulher que mandaram sentar e ficar quieta... e que se levantou mesmo assim."
Acho que é uma das histórias de "Fantasia" mais feministas que já li em muito tempo. A autora soube desenvolver suas personagens femininas com maestria, dando personalidades e conflitos e ânsias para mulheres subjugadas por uma sociedade extremamente machista e patriarcal. Graça e Fúria é sobre suas mulheres; sobre as protagonistas e as coadjuvantes, sobre os diferentes tipos de submissão com as quais elas são obrigadas a conviver. É, principalmente, um livro sobre rebelião. A silenciosa e a que grita pelo fim da opressão de gênero.
"- Não é uma escolha quando você não tem a liberdade de dizer não."
Através de uma narrativa rápida e sem grandes devaneios ou descrições, Tracy Banghart entrega uma obra carregada em adrenalina e mistério para te obrigar a virar as páginas em busca do fim. E que fim!
As questões de escolha, liberdade e empoderamento são grandes dentro dessa obra. A posição das mulheres, criada pelo governo e pela história do reino, é devastadora - mas pequenas faíscas de revolta e de esperança nascem conforme a trama se desenrola. Pequenos sinais de que essas mulheres não vão continuar em silêncio. Não vão permitir que falem por elas.
Serina e Nomi não poderiam ser mais diferentes, e eu amei, absolutamente vivi pelo fato de a narrativa nunca as colocar como rivais. Mesmo nas situações mais extremas, mesmo quando Serina confrontava o pior ou quando Nomi se culpava pelo destino da irmã, em momento algum a história colocou a culpa em sua relação, em seu apoio, nelas. A culpa sempre reside na sociedade, no governo opressor, nos homens que escolheram subjugá-las.
"- Sua habilidade de mascarar seus verdadeiros sentimentos, seu verdadeiro eu, será sua maior arma.
- Preciso de uma arma?
- Toda mulher precisa."
Serina é a graça em pessoa, até que se torna a fúria. Nomi se disfarça em meio à graciosidade, mas carrega um coração furioso. São dois lados de uma mesma moeda. Duas garotas lutando pela liberdade conforme começam a entender o que ela realmente significa.
O leque de personagens femininas ao redor das duas é poderoso. No núcleo da Nomi, temos as outras 2 graças escolhidas pelo herdeiro, Cassia e Maris (suas futuras esposas/companheiras) e as graças do superior (o rei de Viridia). Cassia e Maris são bastante opostas - a primeira, satisfeita com sua posição, ansiosa para se provar digna. Maris, condenada a todo o cenário tal como Nomi, forçada a exercer um papel que nunca desejou.
"- Não me curvei antes e não vou me curvar agora."
A narrativa mostra suas histórias e seus conflitos sem nunca rivalizar de fato. Diferente de outras obras nesse estilo, que pecam em mostrar a dualidade das personagens femininas sem condenar uma para mostrar como a outra é perfeita, aqui todas são bem humanas. Reais. Empáticas.
No núcleo da Serina, a parte mais interessante, porque temos as ditas criminosas. Mulheres que desobedeceram as leis e foram enviadas à ruína por isso. Desde as ladras e assassinas até simples sobreviventes; leitoras, veja bem. Porque, em Viridia, mulheres não podem ler. Não podem questionar. Não podem lutar.
"- Vocês devem ser tão fortes quanto esta prisão, tão fortes quanto a pedra e o oceano que as cercam. Vocês são concreto e arame farpado. Vocês são feitas de ferro."
Nomeadas de acordo com seus trejeitos e com a maneira com que se portam na ilha, essas mulheres se tornam um espelho do que Serina pode se tornar caso se dobre ao que são forçadas a fazer para sobreviver ali. O mais interessante no arco dessa protagonista é como ela reage a esse novo mundo; um mundo distante da graça, onde é forçada a outro tipo de obediência. Ver a chama da rebelião nascer em Serina foi de uma emoção indescritível.
"- Meu pai costumava dizer que a opressão não é um estado final. É um peso que se carrega até que não se possa mais. E ele então é removido. Não sem esforço, não sem dor. Mas meu pai acreditava que toda opressão, sempre, sempre seria combatida e superada."
A obra desenvolve dois núcleos de romance para suas personagens principais, mas eles não tomam grande tempo na narrativa - o que é maravilhoso, considerando toda a trama. Para Serina, é oferecido um personagem gentil, diferente da crueldade e da selvageria que ela experimenta na ilha. Para Nomi, dois opostos da realeza, que faz nascer dúvidas a respeito de todas as suas escolhas.
Em relação à edição, este exemplar ainda é um ARC - mas não acho que tenha algo para mudar. A tradução e a revisão estão nos trinques. Corre pra garantir o seu porque, na moral, ESSE LIVRO PRECISA SER LIDO POR TODO MUNDO!
Graça e Fúria é a pedida perfeita para quem gosta de histórias épicas sobre personagens femininas poderosas. É um livro intenso, com um final devastador para ficar no chão exigindo mais e mais. Essa obra entrou para o hall das minhas favoritas do ano - e vocês vão me ouvir falar nela por muito tempo.
site: http://www.queriaestarlendo.com.br/2018/07/resenha-graca-e-furia.html