jmrainho 27/01/2013
Rumo à estação Finlandia
Rumo à Estação Finlândia. Edmund Wilson. Companhia das Letras, 1986, 470 páginas.
Primeiro livro da Companhia das Letras. É um estudo crítico e histórico das teorias revolucionárias européias que estabeleceram as bases do socialismo bolchevique. Desde a Revolução Francesa até a Russa, em 1917. O autor utiliza um método para que o leitor não incorpore o erro de imaginar que as grandes idéias são geradas por uma raça especial de grandes homens.
O nome da obra (Estação Finlândia) homenageia exatamente o momento em que Lenin chega à Rússia no início da revolução, desembarcando em São Petersburgo na estação que leva este nome.
Livro escrito em 1940 durante a aliança Hitler/Stalin.
Edmund Wilson (1895 - 1972), jornalista e crítico literário norte-americano. Escreveu também O Castelo de Axel.
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Excelente resenha no blog de Marcelo Campos, que cito trechos.
http://historiaeautoconhecimento.blogspot.com.br/2011/07/rumo-estacao-finlandia-edmund-wilson.html
Edmund Wilson faz um panorama da história social, do contexto social, político e econômico que está por traz das transformações protagonizadas por grandes personagens históricos, e principalmente os teóricos que influenciaram o marxismo e foram influenciados por ele até finalizar com LENIN. Traz biografias de todos.
Edmund Wilson faz uma análise crítica do pensamento marxista, e de como Marx/Engels foram mal interpretados por muitos marxistas; toma por exemplo a questão da dialética; Marx usa o termo não como o método argumentativo de Sócrates, mas a partir do principio da mudança proposto por Hegel. Para o filósofo alemão a dialética é uma lei que rege tanto os domínios da lógica como o mundo natural e a história; segundo ela todos processos de mudança possuem um elemento de uniformidade: atravessam um ciclo de três fases; a primeira fase (tese) é o processo de afirmação e unificação; em seguida vem a dissociação e negação da tese (antítese); por fim ocorre uma conciliação entre tese e antítese (síntese). Marx e Engels adotam o mesmo principio, e diferente de Hegel o projetam para do futuro: a sociedade burguesa é a tese; a antítese é o proletariado; e para eles a síntese seria a sociedade comunista.
Enquanto Hegel vê um principio que ele denomina Idéia Absoluta se auto-realizando através do mundo material, Marx inverte essa lógica de ponta cabeça: as idéias são humanas, e traduzem a matéria dentro da mente humana. Daí materialismo dialético, e o entendimento simplista de que a economia é a grande mola do esforço humano, e tudo ocorre por conta de uma motivação econômica; para Edmund Wilson isso é uma leitura equivocada do próprio Marx. Engels esclarece que não há essa prevalecência do fator econômico
O autor considera irônico que o pensamento marxista, ao afastar-se da metafísica hegeliana, terminará construindo uma mística materialista; há uma trindade sagrada (tese-antitese-sintese), e a dialética torna-se um espécie de demiurgo (188), uma força divina irresistível que move a história; os marxistas se esforçam na crença de que são agentes dessa força sobre-humana.
Marx é completamente cético em relação à democracia; foi criado num país autoritário e sempre imprimiu uma administração profundamente autoritária ao movimento socialista; só concebe transformações a partir de revoluções sangrentas. Ignorou completamente a eleição de deputados socialistas para o Reichstag, a partir de 1867, e o caminho intermediário de conquistar direitos e concessões a partir de pressão eleitoral.
Como salienta o autor, o pensamento marxista não é um sistema acabado: os dois últimos livros de O Capital saíram postumamente, quase 12 anos após a morte de Marx (1883). Engels terminou a série do Capital.
O conjunto de idéias de Marx é para o autor uma mistura de judaísmo tradicional, rousseaunismo do século XVIII e utopismo do início do XIX (444); e arremata:
“Não basta que o Estado assuma o controle dos meios de produção e se estabeleça uma ditadura que defenda os interesses do proletariado para que esteja garantida a felicidade de ninguém – exceto a dos próprios ditadores.”
O método marxista só leva a resultados válidos quando aplicado de modo novo por homens realistas o bastante para verem com seus próprios olhos – e corajosos o bastante para pensarem com suas próprias cabeças.
Este livro parte da premissa de que um passo importante foi dado, que uma “ruptura” ocorreu, que nada na história da humanidade jamais seria como antes.
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O livro Inicia com as idéias do Italiano GIOVANI VICO, ou Giambattista Vico,(1668 - 1744), filósofo que elaborou uma teoria crítica da história e influenciou JULES MICHELET. Criticava Descartes. Vico passou anos elaborando a idéia de que a abordagem histórica da lei como desenvolvida nas diferentes sociedades, aliada à visão metafísica da lei divina imutável, poderia delinear uma ciência que compreendesse as verdades conhecíveis pelo homem.
JULES MICHELET (1798-1874), filósofo e historiador Frances, introduziu a pesquisa histórica com fontes manuscritas extensas, e ênfase nos grupos e não nos líderes, sendo o autor principal o povo. Sua grande obra é História da Revolução Francesa; nela ressalta as contradições fundamentais: solidariedade de classe x dever patriótico; individualismo x solidariedade. Denunciou a traição da igreja católica romana frente ao povo. Queria combinar história e filosofia. Tinha 10 anos quando seu pai foi preso por não poder pagar as dívidas. Aos 17 anos perdeu a mãe, vítima de câncer. A fome e o frio o obrigava a procurar alimento e calor na própria mente e imaginação.
Até então (Vico e Michelet) a história sempre fora escrita como uma série de biografia de grandes homens, ou como uma crônica de acontecimentos notáveis, ou como um grande préstito comandado por Deus. Mas agora podemos ver que o desenvolvimento de uma sociedade foi afetado por suas origens, seus contexto; que, assim como os indivíduos, as sociedades passam por fases regulares de crescimento.
Vico: “O mundo social é certamente obra dos homens. Os governos se adaptam necessariamente à natureza dos governados; são resultado mesmo dessa natureza” . Para Vico, a meta do aperfeiçoamento é o Céu, sendo portanto, a salvação divina uma questão individual, que depende da graça divina.
Para Michelet, os indivíduos notáveis só interessavam na medida em que eram representativos de grupos e movimentos. Ele tornou Joana d´Arc popular e famosa, porém ela o interessava como portadora da voz do sentimento nacional do povo e não como mística ou santa. “Preciso transmitir a ele o que meus pais fizeram por mim, dando-me, através de sacrifícios inauditos, liberdade, a liberdade de ter tempo para dedicar a meu trabalho. Que não nos entreguemos a atitudes falsamente democráticas. O trabalhador é escravo ou da vontade alheia ou do destino. Disso escapei, graças a meu pai e minha mãe”. “Aquele que sabe ser pobre sabe tudo”. O leitor tem impressão de que Michelet é o próprio espírito humano em sua luta secular – suportando prolongados períodos de degradação, triunfando em extáticos renascimentos, dilacerado por terríveis conflitos interiores. O contexto era a revolução de 1848 em vários países da Europa. Na obra Da servidão e do ódio, analisa as classes da rede sócio-econômica, cada uma delas exploradora ou explorada. O camponês, eternamente devendo dinheiro ao agiota ou ao advogado, sempre com medo de ser despejado, inveja o operário da indústria. O operário, praticamente confinado e desprovido de vontade própria devido a sua subjeção à máquina, desmoralizando-se ainda mais, nos poucos momentos de liberdade que lhe permitem, na dissipação, inveja o artesão. Este quando aprendiz, pertence a seu mestre, é ao mesmo tempo criado e trabalhador, e tem inquietantes aspirações burguesas. Na burguesia, o industrial, tomando dinheiro emprestado do capitalista, sempre ameaçado de ser arruinado pela superprodução, comanda seus empregados como se o demônio o comandasse. Passa a odiá-los, por serem os únicos elementos incertos que impedem o funcionamento perfeito do mecanismo. Os empregados, detestam o capataz. O comerciante, pressionado por seus fregueses, que estão sempre tentando levar vantagem, pressiona o industrial para que este lhe forneça produtos malfeitos. É ele talvez que ele a via mais infeliz de todos, obrigado a ser servil para com seus fregueses, odiado por seus concorrentes, e odiando-os também, sem produzir nada nem organizar nada. O funcionário público, mal pago, também certifica-se de que suas idéias políticas e religiosas não desagradam o governo. O burguês perdeu o contato com o povo, diz Michelet. Todas as classes se odeiam mutuamente. Os ricos e os pobres devem freqüentar as mesmas escolas. Os pobres devem esquecer sua inveja, e os ricos devem deixar de lado o orgulho. O homem foi levado a moldar sua alma conforme sua situação material. Michelet rejeita o socialismo: para ele, a propriedade da França já foi demasiadamente subdividida. Nós mesmos somos o último capítulo da história, e que o próximo capítulo cabe a nós escrever.
Ernest RENAN (1823-1892) coloca o santo em primeiro lugar e o homem de ação em último. Michelet rechaçava o amigo Renan, pela liberdade interior passiva, que se preocupa com sua própria salvação e entrega o mundo ao mal. Marco Aurélio: “Resignar-se, enquanto se passa a vida em meio a homens falsos e injustos – era este o programa de vida do sábio. E tinha razão. A mais sólida bondade é a que se baseia no tédio perfeito, na constatação inequívoca de que tudo neste mundo é frívolo e sem bases reais”.
Quando François BABEUF, ou Graco Babeuf (jornalista, 1760-1797) estava na prisão, sua filha de sete anos morreu de fome. Ele conseguira permanecer pobre durante toda a vida. Sua popularidade era somente entre os pobres. Seus cargos públicos só lhe trouxeram problemas. Assim que saiu da prisão, fundou a Sociedade dos Iguais e foi executado por isso. Para ele, propriedade é roubo. Todas as nossas instituições civis, nossas transações comerciais normais, são atos de latrocínio, perpetuados e autorizados por leis bárbaras.
As revoluções ocorrem quando as molas humanas da sociedade são esticadas além do que podem suportar.
Conde de SAINT-SIMON.(1760-1825), filósofo e economista francês, um dos fundadores da sociologia. Passou por dificuldades financeiras, tentou suicidar-se. Propõe um novo tipo de cristianismo. O princípio básico de Cristo de amar ao próximo, aplicado à sociedade moderna, nos obriga a reconhecer que a maioria de nossos semelhantes são miseráveis e infelizes. Criou o sansionismo. Auguste Comte foi discípulo de Saint Simon e pregou o positivismo.
ROBERT OWEL (1771-1858), um dos fundadores do socialismo e do cooperativismo . Socialismo utópico. Filho de uma família de modestos artesãos. Após galgar diferentes degraus da produção, a partir do aprendizado, tornou-se, aos 30 anos, co-proprietário e diretor de importantes indústrias escocesas de fiação, em New Lanark. Ali reduziu a jornada de trabalho para 10,5 horas diárias - um avanço para a época, já que a jornada de trabalho de um típico operário têxtil era de 14 a 16 horas diárias. . Preocupou-se ainda com a qualidade de vida dos seus empregados, construindo casas para as famílias dos operários, o primeiro jardim-de-infância e a primeira cooperativa. Fundou, nos Estados Unidos, a colônia socialista de New Harmony (Nova Harmonia) que funcionou nos primeiros anos. Logo se deu conta que terrível discrepância entre a grande atenção dada à máquinas inanimadas e o descaso e desprezo com que se tratavam as máquinas vivas. E percebeu que por pior e mais insensata que seja a escravidão existente na América, a escravidão branca das fábricas inglesas era, nesse período em que tudo era permitido, coisa muito pior que os escravos domésticos. E não apenas os trabalhadores que sofriam: os próprios patrões eram degradados. “Eu estava absolutamente farto de s[ócios que eram treinados apenas para comprar barato e vender caro. Esse trabalho faz deteriorar e muitas vezes destrói, as melhores e mais elevadas faculdades da natureza. Com base na longa experiência de uma vida em que passe opor todos os níveis de comércio e manufatura, estou absolutamente convicto de que é impossível formar um caráter superior dentro desse sistema absolutamente egoísta. A verdade, a honestidade, a virtude continuarão a ser apenas palavras, tal como o são agora e sempre foram. Sob esse sistema não pode haver civilização digna desse nome; pois todos são treinados pela sociedade para entrar em conflito uns com os outros e mesmo destruírem-se mutuamente pela oposição de interesses que eles próprio criaram. É uma forma mesquinha, vulgar, ignorante e inferior de conduzir os negócios da sociedade; e nenhum melhoramento permanente, geral e substancial poderá surgir enquanto não for adotada uma maneira superior de formar o caráter e gerar riquezas.
Se as massas vivessem bem e fossem independentes, como as classes dominantes poderiam controlá-las?
As comunidades da época eram prejudicadas pela falta de fé quando se tinham fundos, e a falta de fundos quando se tinha fé. (Cabet)
KARL MARX, em 1835, na escola (Friedrich-Wilhelm Gymnasium, em Trier) escreve a composição para exame final “Reflexões de um jovem a respeito da escolha de uma profissão”. Com 17 anos. “Deve-se ter certeza de não se estar colocando na posição de mero instrumento servil nas mãos de outrem: o indivíduo deve manter sua independência em sua própria esfera, e certificar-se de que está servindo à humanidade – caso contrário, ainda que venha a se tornar famoso como erudito ou poeta, não será jamais um grande ser humano. Nunca nos realizamos verdadeiramente a menos que estejamos trabalhando pelo bem de nossos semelhantes; nesse caso, não só nosso fardo não será pesado demais, como também nossas satisfações não serão apenas alegrias egoístas.
“Não é bom trabalhar para a liberdade como escravo, e lutar com alfinetes em vez de porretes”.
Para ENGELS, os operários embriagavam-se todas as noites. Viviam brigando, e vez por outra chegavam a se matar. Desde os seis anos de idade haviam feito com eles todo o possível para minar sua força e roubar-lhes a alegria de viver. Para eles, só restavam o evangelismo e o conhaque. Em 1841, na Universidade de Berlim leu A essência do Cristianinismo, de Ludwig Feuerbach (1804-1872, obra que o libertou da teologia e o colocou no mundo da ação humana.
Nos anos de depressão, o superávit de mão-de-obra, que era tão útil nos anos em que a economia ia bem, era despejado nas cidades; estas pessoas tornavam-se mascates, varredores, lixeiros ou simplesmente mendigos – viam-se às vezes famílias inteiras mendigando nas ruas. Numa vez em que chegou a Manchester acompanhado de um burguês inglês, Engels mencionou a miséria terrível da cidade e disse que amais vira uma cidade tão mal construída; o inglês ouviu seus comentário sem dizer nada; ao chegarem na esquina onde se separariam, porém, o homem saiu-se com esta: “E, no entanto, aqui se ganha um bom dinheiro, até logo, meu senhor. Engels afirmava que as teorias de Adam Smith, MacCulloch e James Mill, eram basicamente racionalizações hipócritas dos impulsos gananciosos subjacentes ao sistema de propriedade privada que estava destruindo os povos britânicos; o Livre-Câmbio, e a Livre-Concorrência não impediam que o povo continuasse escravizado, e consolidavam o monopólico da burguesia sobre tudo que valia a pena possuir – todas as filosofias do comércio não faziam senão santificar as fraudes de comerciantes inescrupulosos.
Marx e Engels extrraíram da filosofia de HEGEL o conceito de transformação histórica, e que revelara que aas grandes figuras revolucionárias da história não eram apenas indivíduos extraordinários, que moviam montanhas simplesmente com a força de vontade, e sim agentes através dos quais as forças das sociedades em que eles se inseriam realizavam seus propósitos inconscientes.
Era impossível, para eles, que pequenas unidades comunistas por si só conseguissem salvar a sociedade, ou mesmo sobreviver em desafio ao sistema comercial;… porque esse movimento (comunista Americano, de Humphrey Noyes) ignorava o mecanismo da luta de classes. Um advogado Frances chamado Antoine Barnave, que fora presidente da assembléia revolucionária de 1790 afirmara que a diferença entre as classes era resultado das desigualdades econômicas; que a classe no poder numa determinada época não apenas fazia leis pra toda a sociedade com o fim de garantir o domínio de suas propriedades, mas também “orientava os hábitos e criava os preconceitos” da sociedade; que a sociedade estava constantemente mudando sob a pressão das necessidades econômicas; e que a burguesia ascendente e triunfante que substituíra a nobreza feudal terminaria produzindo uma nova aristocracia. (145)
A teoria marxista, segundo a qual a história era uma sucessão de conflitos entre uma classe exploradora e uma classe explorada. Esses conflitos eram resultados dos métodos de produção prevalecentes durante diversos períodos. No final do Manifesto Comunista (1848, pouco lido na época): “Que as classes dominantes tremam ante a idéia de uma revolução comunista. Os proletários nada tem a perder a não ser suas correntes. Tem um mundo a ganhar. Proletários de todo o mundo, uni-vos.” A idéia de Guerra justa, juntamente com a idéia de ódio justificado, veio substituir o socialismo de Saint-Simon, que se apresentara como um novo tipo de cristianismo. Agora os homens não são mais todos irmãos; não há mais uma solidariedade meramente humana. O verdadeiro humano será concretizado quando tivermos chegado à sociedade sem classes.
Gottschalk, que já havia sido solto, atacou Marx em termos semelhantes aos empregados por Weitling: “Eles não estão realmente interessados em salvar os oprimidos. Os sofrimentos dos trabalhadores, a fome dos pobres, para eles, só tem interesse científico e doutrinário.
Marx e Engels denominavam sua filosofia de materialismo dialético – um nome que tem o efeito indesejável de fazer com que o leigo tenha uma idéia errada do que é o marxismo, pois nele nem a palavra materialismo nem a palavra dialético são empregadas no sentido comum. A dialética de Platão era uma técnica de se chegar a verdade através da conciliação de duas afirmativas opostas. A dialética a que se referiam não era o método argumentativo de Sócrates e sim o princípio de mudança proposta por Hegel, uma lei que envolvia contradição e conciliação. O mundo está sempre mudando, diz Hegel, porém há nessas transformações um elemento de uniformidade: o fato de que cada processo de mudança atravessa necessariamente um ciclo de três fases: tese, antítese e síntese. Para Marx a tese era a sociedade burguesa, que constituíra uma unificação em relação a o regime feudal que desintegrava. A antítese era o proletariado, que fora gerado pelo desenvolvimento da indústria moderna. A síntese seria a sociedade comunista que resultaria do conflito entre a classe operária e as classes proprietárias e patronais. O que há neles de importante é a idéia de que o espírito humano virá a dominar sua natureza animal através da razão, e não o contrário, como muita gente pensa deles.
Marx havia tentado explorar as dificuldades de se estabelecerem relações entre arte e condições econômicas. E observa que os períodos de maior desenvolvimento artístico não coincidem com os de maior progresso da sociedade. Como as epopéias gregas.
Feuerbach: os homens fazem sua própria história, qualquer que seja seu resultado, na medida em que cada pessoa procura o objetivo que ela própria deseja conscientemente; e é precisamente a resultante dessas inúmeras vontades que atuam em diferentes direções e de seus efeitos diverso sobre o mundo externo que constitui a história. Assim, também entra em jogo aquilo que os inúmeros indivíduos desejam. A vontade é determinada pela paixão ou pela deliberação.
Contra a crença de um poder divido na história, Marx tentou afastar a idéia de uma Providência. “A História não faz nada, não possui riquezas colossais; não luta em nenhum combate. É o homem – o homem real vivo – que age, possui e luta sempre. A doutrina da salvação pelas obras, conforme mostra a história do cristianismo, com muita facilidade se transforma na doutrina da salvação peça graça. Identificando-se que a antítese da Dialética.
Engels demonstra que a revolta de LUTERO fora transformada num movimento de classe média com objetivo de derrubar a autoridade política e expropriar as riquezas do clero.
Marx consegue acesso à sala de leitura do Museu Britânico e lá passou a estudar diariamente das dez às sete. Foi despejado do elegante subúrbio de Camberwell em 1850 e se mudaram para uma rua pobre no Soho, com a família em dois cômodos. E com a empregada Helen Demuth, chamada Lenchen, que fora dada a esposa Jenny por sua mãe e acompanha os Marx por toda a vida. O menino que havia nascido alguns dias antes da mudança para Londres morreu nesse apartamento em novembro. O despejo ocorreu quando Jenny estava amamentando a criança. Dois oficiais de justiça se apossaram de todas as poucas coisas que tinham – cama, roupas de cama, roupas, até o breco e os brinquedos. Um amigo acudiu a dívida. Uma das mais notáveis contradições de Marx é o fato de que o homem que, mais do que ninguém, chamou a atenção para a motivação econômica, era incapaz de fazer o qu quer que fosse para ganhar dinheiro. Em 30 anos que viveu em Londres, só uma vez ele tentou arranjar um emprego regular. Vivia da publicação de artigos, muitos escritos por Engels e da ajuda financeira deste. Engels escrevia com facilidade e Marx tinha dificuldades para escrever. Quando jovem Marx escreveu: “O escritor tem de ganhar dinheiro para poder viver e escrever, mas ele não deve jamais viver e escrever a fim de ganhar dinheiro”. “Não deixarei que a sociedade burguesa me transforme numa máquina de ganhar dinheiro”. Porém, o fato é que ele está confinado neste mundo por suas necessidades e desejos humanos, e se ele não vai deixar que o transformem numa máquina de ganhar dinheiro, alguém terá que sofrer essa transformação para ganhar dinheiro por ele.
Relato do local onde Marx vivia em Londres, feito por um policial:
“Marx vive num dos bairros piores, e portanto dos mais baratos, de Londres. Ocupa dois aposentos. O que dá para a rua é a sala, sendo o dos fundos o quarto. Não há um móvel limpo nem apresentável em nenhum dos dois cômodos: tudo está quebrado, rasgado, e esfarrapado; a poeira cobre todas as coisas, e a bagunça é completa. No meio da sala há uma mesa grande e antiga coberta com oleado. Sobre ela há manuscritos, livros e jornais, bem como brinquedos, utensílios de costura de sua esposa, xícaras desbeiçadas, talheres sujos, lamparinas, um tinteiro, copos, alguns cachimbos, cinzas – tudo empilhado na mesma mesa.”.
Marx sofria de hemorróidas e furúnculos que o impediam de freqüentar a biblioteca. Em março de 1851 tiveram mais uma filha, porém, morreu de bronquite um ano depois. Jamais teve berço. Quando morreu sua mãe pediu duas libras a um refugiado francês para comprar o caixão. Marx recitava trechos de Fausto e a Divida Comédia. Marx saiu de Soho em 1856, quando a mãe de Jenny falecera legando a filha 120 libras esterlinas.Mudaram para uma casa de quatro andares em Haverstock Hill. Laura Marx casou com um jovem médico cubano chamado Paul Lafarge (que escreveu O Direito a Preguiça). Jenny casou-se com um socialista Frances chamado Charles Longuet. Em 1867 terminou o primeiro volume de O Capital. Marx afirma que o livro é “a tarefa pela qual sacrifiquei minha saúde, minha felicidade e minha família”. Sua esposa Jenny Longhet morreu em janeiro de 1883. Em março Marx descobre que está com abscesso pulmonar. Dia 14 Lenchen encontrou seu patrão desacordado no gabinete. Engels tomou-lhe o pulso e viu que havia morrido. Morreu trabalhando. Lenchen foi tomar conta de Engels. O Capital foi terminado por Engels (que morreu em 1895) e depois Kautsky. Eleanor Marx, sua filha, continuou atividades revolucionarias. Escreveu ela: “Cada vez mais me convenço de que os comportamentos errôneos nada mais são que uma doença moral”. Eleanor, que herdou dinheiro de Engels, tomou veneno e morreu quando descobriu que o homem que vivia, Aveling, casou com uma jovem artriz. Aveling herdou o que restou do dinheiro de Engels e foi viver com a nova esposa. Paul e Laura Lafargue perderam todos os filhos que tiveram. Lafargue fechou o consultório e virou fotógrafo, vivendo em dificuldades. Laura também herdou dinheiro de Engels, e ela e seu marido decidiram suicidar-se em 1912 quando já tinham 70 anos. Os dois injetaram morfina e foram encontrados mortos em suas camas. Os Marxs tiveram 5 filhos, dos quais 3 homens e uma mulher sobreviveram. Um deles Jean Longuet, tornou-se líder da ala esquerdista dos socialistas franceses. Seu filho, Robert-Jean Longuet, bisneto de Marx, está (no momento deste livro) editando uma revista em Marrocos em defesa dos interesses dos nativos contra o regime militar frances. Karl-Jean Longuet escultor francês (1904, 1981 Paris). É bisneto de Karl Marx. Passou a militar no campo simbólico da cultura enunciado pelo Bourdieu através das artes plásticas. Juliette Longuet é neta de Karl-Jean Longuet e, por consequência, tataraneta de Karl Marx. É uma estilista francesa que deixou Paris em 2003 para morar em Nova York. É famosa por ter criado o vestido do tipo Longuet. O paisagista Roberto Burle Marx, sobrinho-neto do Marx, viveu no Brasil. Marx teve um filho ilegítimo com Lenchen e registrado com o sobrenome da mãe, como Henry Frederick Demuth (1851) e ele foi provavelmente entregue a uma família proletária e só reapareceu em 1880, foi motorista de táxi, depois emigrou para a Austrália. Deixou na Inglaterra esposa e os quatro filhos que Marx cuidou.
A intuição psicológica de Marx: ninguém jamais enxergou com olhos tão implacáveis a infinita capacidade humana de não perceber ou encarar com indiferença a dor que infligimos aos outros quando temos oportunidade de tirar dela algum lucro.
Marx nos apresenta a imagem de um mundo em que as mercadorias mandam nos seres humanos. “ Todas as nossas invenções e progressos parecem ter a consequência de atribuir às forças materiais uma vida intelectual e reduzir a existência humana à condição de força material”. Esses princípios econômicos que se prestam a demonstrações tão elegantes provêm simplesmente das leis do egoísmo humano. Enquanto as massas humanas do mundo industrial são escravizados apenas para “transformar uns poucos novos-ricos vulgares e semi-instruídos em eminentes produtores de algodão, grandes fabricantes de salsichas e influentes comerciantes de graxa. O sistema feudal ao menos garantia certos direitos em troca de certos deveres.
Mais-valia. O trabalhador vende sua capacidade de trabalho como qualquer mercadoria. Seu valor é determinado pela quantidade mínima para mante-lo vivo e em condições de trabalhar e gerar uma nova oferta de trabalhadores. É obrigado, para não perder o emprego, a trabalhar, oito, dez horas por dia. Desse modo, o padrão rouba do trabalhador de duas a quatro horas de trabalho e vende o produto desse trabalho por seu valor. Esse valor do trabalho roubado é a mais-valia e seria o lucro do industrial. É esse valor que lhe permite tornar-se gordo e insolente, enquanto o trabalhador é reduzido ao mínimo necessário a sua subsistência. Os fabinanos ingleses, com base em Stanley Jevons, elaboraram uma teoria contrária fundamentada na demanda: o preço de qualquer mercadoria é determinado pelo seu grau de utilidade para as pessoas que a ela tem acesso, e isto, por sua vez, pode ser considerado o determinante do valor do trabalho necessário para produzi-la Quanto ao comerciante, ele não produzia valor do mesmo modo que o trabalhador, apenas economizava dinheiro para o industrial, ao distribuir as mercadorias por ele produzidas, e recebia uma parte da mais-valia do industrial.
Marx e Engels leram obras de antropólogos que os convenceram de que uma gens comunista fora a verdadeira forma primitiva de organização social. No livro A origem da família, da propriedade privada e do Estado, Engels (após a morte de Marx) tenta, com base em Lewis Morgan (que viveu entre os índios iroquis), demonstrar que a singela grandeza moral da velha sociedade pagã sem classes fora minada e destruída pelos meios mais desprezíveis – roubo, violência, astúcia, traição, e o novo sistema de classes fora instituído pelos impulsos mais mesquinhos.
Se orgulhavam de ter elaborado um novo socialismo científico em contraste com o velho socialismo utópico.
Para Marx é direito para os proletários expropriar os burgueses, e até mesmo aprisioná-los e matá-los. Uma contradição entre o bem que ele propõe a humanidade e a crueldade e o ódio que deu origem a muitas confusões morais.
Marx passaria o resto da vida afirmando que todo ser humano era dotado – para usar a terminologia de Thomas Jefferson – do direito à vida, à liberdade e à busca da felicidade. Com 60 anos aprendeu russo.
Diz Marx no Capital, que “no sistema capitalista todos os métodos de incrementar a produtividade social da força de trabalho atuam em detrimento do trabalhador individual: que todos os meios de desenvolver a produção são transformados em meios de dominar e explorar o produtor; que eles mutilam o trabalhador e o reduzem a um fragmento de ser humano, à condição degradada de acessório da máquina, fazem de seu trabalho um tormento tamanho que seu significado essencial é destruído; isolam-no das potencialidades intelectuais do processo de trabalho na medida exata em que a ciência é a ele incorporada como força independente: que distorcem suas condições de trabalho, sujeitando-lo, durante o processo de trabalho, a um despotismo que é tão mais odioso quanto mesquinho; que transformam toda a sua vida em expediente e arrastam sua mulher e filhos ao holocausto do ídolo do capital”.
Marx escreve a Engels: “Sofro tantas desgraças quanto Jó, embora não seja temente a Deus”. E Prometeu continua sendo seu herói predileto. O herói que trouxe a luz foi torturado por Zeus por meio de uma águia que lhes bicava precisamente o fígado devorado, como o do pai, pelo câncer. E no entanto, se o pai Zeus enviou uma ave voraz para torturar o rebelde, é também um devorador voraz e destruidor o fogo que Prometeu deu aos homens. E nesse ínterim, o salvador jamais é salvo. É esse o trauma responsável pela angústia e pelo desafio que reverberam por todas as páginas de O Capital. Chamar atenção a ele não é diminuir a autoridade da obra de Marx. Pelo contrário, na história, como em outras áreas, a importância de um livro depende não apenas da abrangência da visão e da quantidade de informação nele contidas, mas também das profundezas de onde ele foi arrancado. As obras mais cruciais do pensamento humano – excluída as das ciências exatas – são sempre as que exprimem em obras os resultados de experiências novas e fundamentais às quais os seres humanos tiveram de se adaptar. O Capital é um desses livros.
A proletariado não soube administrar uma nova sociedade. Quando, através das negociações sindicais, o proletariado obtinha melhores salários e mais horas de lazer, ele não pensava numa revolução mundial; quando gerava um líder parlamentar de valor, este era comprado ou absorvido pela classe governante. E o homem comum quer uma casa com confortos possibilitados pela máquina (enquanto Marx jamais se preocupara em garantir para a mulher e as filhas um mínimo de condições de vida decentes em seu lar).
Hoje em dia parece claro que apenas o homem que já desfrutou de um bom padrão de vida e uma certa segurança financeira é realmente capaz de lutar pela segurança e pelo conforto. Mas , quando ele obtém essas coisas, ele se transforma em algo muito diferente da concepção que Marx tinha de proletário. Não há limites ao processo pelo qual as pessoas que vivem de lucros continuarão indiferentes ou ignorantes em relação à miséria daqueles que lhe garante o sustento.
Marx e Engels eram revolucionários até o âmago. Sua visão revolucionária sempre os colocava num plano acima dos azares do destino e dos atos dos homens.
Embora não tente e não consiga explicar a excelência dos poemas homéricos como produtos de uma cultura que deveria ter sido primitiva – problema esse que Marx jamais viria a resolver.
MIKHAIL BAKUNIN, anarquista, fora um súdito fiel do Czar na juventude e em Berlim, sob influência dos jovens hegelianos, foi caminhando para a esquerda. Ficou oito anos preso. Em um bilhete à sua irmã durante a época da prisão, acorrentado na parede: “Você jamais compreenderá o que significa ser enterrado vivo, dizer a si próprio a cada momento do dia e da noite: sou um escravo, estou aniquilado, reduzido à condição de impotência pelo resto de meus dias.” A questão central da luta entre os seguidores de Bakunin e os de Marx foi a abolição do direito de herança. Era uma medida que Bakunin exigia com veemência, talvez porque ele estava tentando sem sucesso, convencer os irmãos a lhe enviarem uma parte dos bens da família. Segundo Bakunin, o revolucionário é um condenado, sem interesses nem sentimentos pessoais, sem sequer um nome que seja seu. Morreu em 1876 anunciando sua desilusão com as massas.
VLAIMIR ULIANOV(LENIN) – Líder do movimento social-democrata da Rússia ainda jovem. Sofrendo de tuberculose gástrica, habituou-se a poupar energias e adaptar-se às vicissitudes da vida. Foi preso e na prisão fazia 50 reflexões todos as noites antes de deitar. Escreveu entre outros, Um passo a frente, dois passos atrás. Para ele, “os escritores, jornalistas e artistas representam um mundo mais atraente do que qualquer outro, um mundo reservado apenas para os eleitos”. Ele escrevia textos de critica literária e pequenos ensaios, que eram publicados num jornal siberiano, durante seu exílio. Ficou na sua cabeça o refrão de Antonio Labriola (1843-1904) – “as idéias não caem do céu”. Ao contrario de Marx, Lênin não tinha muitos livros, estudava mais nas bibliotecas. Escreve Lênin em seu panfleto O colapso da Segunda Internacional: “A experiência da guerra, como a experiência de qualquer crise na história, de todo grande desastre e toda súbita virada numa existência humana, atordoa e destrói alguns, porém (o grifo é de Lênin) ilumina e endurece outros. Os grandes lucros, enquanto isso, tinham sido usados para seduzir a camada mais privilegiada do proletariado, e os socialistas haviam virado imperialistas também.Tinha convicção candente de que o sofrimento não era uma parte essencial e inevitável da vida, porém uma abominação que as pessoas podiam e deviam eliminar.
LEV DAVIDOVITCH – ou TROTSKI (1879-1940) adotou esse que era o nome de um carcereiro.
Leon Trótski foi um intelectual marxista e revolucionário bolchevique, fundador do Exército Vermelho e rival de Stalin na tomada do PCUS à morte de Lênin
Trotski não é como Marx, um grande pensador original, não é nem um grande estadista original, como Lênin; talvez não fosse sequer inevitavelmente um grande rebelde: é como se ele se visse jogado no mundo da revolução. É um desses homens superiores que prosperam dentro de uma escola, sem criar um sistema nem tampouco romper com ele. Trotski não arriscou coisas como seu conforto e paz de espírito, mas também a própria vida e as vidas de seus seguidores e seus familiares, mais o desfrute do pode político que é a única satisfação material que o marxismo permite a seus sacerdotes. (é o personagem do filme Dr. Jivago que se encontra com o protagonista num trem blindado). Como comissário de guerra em 1918-19 ele conseguiu, viajando em seu trem blindado, deslocar-se tão depressa de um front a outro... É a teoria do marxismo, o diagrama do desenvolvimento social, e não as vicissitudes imediatas das vidas de seus semelhantes, que está presente na mente de Trotski. Para ele, meios tais como a mentira e o assassinato em si não são nem bons nem maus. Ambos são necessários em tempo de guerra, e os aprovamos ou reprovamos dependendo do lado cuja vitória desejamos.
MÁXIMO GÓRKI (1868-1936), pseudônimo de Aleksei Maksimovich Peshkov, foi um escritor, romancista, dramaturgo, contista e ativista político russo. Gorki sempre levou a sério a religião – embora não se considerasse cristão – e falava sobre a busca de Deus, algo que tornava Lenin furioso. Seu livro Meus dias com Lenin sofreu modificações consideráveis no tempo de Stalin. O texto original terminava assim: “No final das contas, o que terminava vencendo é o que há de honesto e direito naquilo que o homem faz, aquilo sem o qual ele não seria homem”.