Luiz Pereira Júnior 20/06/2020
Se for assim, é melhor nem pensar no que vem depois...
Se você já leu alguma resenha minha (não se preocupe, não estou aqui para pedir likes ou para que você ative sininhos – até porque aqui não é o lugar, não é mesmo?), já sabe que eu não faço resumos nem escrevo enredos de livros (isso dezenas de sites já fazem melhor do que eu). Escrevo apenas o que penso, o que sinto, ao ler.
E esse livro aí em cima, de título tão instigante?
Alerto que, primeiramente, você enfrentará um cipoal para entender do que o livro fala: uma linguagem confusa, hermética, um intrincado fluxo de consciência de um personagem que já está morto (Brás Cubas? Muito distante disso...), sendo melhor buscar ajuda nas resenhas e nos resumos já publicados. Então, o mundo (ou melhor, o livro) começa a se tornar mais claro.
Depois dos primeiros capítulos (sem spoiler, por favor), a narrativa assume tons – digamos – mais convencionais. O livro se torna mais fácil de ser compreendido, mas em nenhum momento a esquisitice, a bizarrice, a originalidade abandona a obra.
Dito isso, vamos ao que talvez seja o mais importante: não é um livro fácil, sob hipótese alguma. A visão do pós-vida é inquietante, lúgubre, macabra, angustiante, enojante. Pensar que alguém pode viver a eternidade (ou até a próxima reencarnação, pelo menos) com os abortos, os filhos mortos e as sobras falantes da gordura perdida e ganha durante toda a vida (essas informações constam de qualquer resumo do livro), não é um exemplo de literatura que possa ser chamada de “agradável”, nem nos dá conforto algum para quando a nossa hora chegar.
Também não ajudam em nada as várias referências aos lugares de Londres, com seus itinerários descritos de forma a simplesmente deixar o leitor com cara de tacho, pulando certos parágrafos sem remorso algum. Imagine que eu escrevesse um livro em que uma alma penada precisasse fazer o percurso de Candeias ao Janga, mas que precisasse alterar seu percurso também indo ao Poço da Panela, ao Jardim Atlântico e a Santo Amaro. Apenas os que tivessem nascido em uma determinada região metropolitana brasileira (não direi qual) entenderia as referências e o contexto do percurso. Você também não pularia esses trechos, se nada mais fosse informado sobre esses locais a não ser os nomes deles?
E a pergunta final com que (quase) sempre encerro meus textos: vale a pena?
Não, se você gosta de livros fofos, que vão deixar um sorriso em seu rosto e derramar lágrimas de felicidade em ter encontrado o final que sonha para a sua vida.
Não, se você gosta de livros que prendam a sua atenção logo nas primeiras páginas, de fazer os outros ficarem impressionados com a sua leitura incrivelmente rápida.
Sim, se você gosta de uma história original, mesmo que irritantemente difícil, angustiante por vezes e mais horrenda do que muitas histórias de terror fofo que andam por aí.
Sim, se você é daqueles leitores que lutam para terminar um livro, porque sabem que o prazer dessa leitura não pode ser mensurado pelas réguas normais da leitura do prazer imediato e reconfortante.
Enfim, conheça por sua conta e risco como vivem os mortos – mas não diga que eu não avisei (só para encerrar meu texto com uma frase bem chavão...).