Renan Barcelos 29/05/2012
Fracasso só no Título
Fracasso de Público – Heróis Mascarados e Amigos Encrencados(Editora Gal; 240 páginas; 38 reais; 2009) é o primeiro encadernado da série escrita por Alex Robinson. Publicada de forma independente nos Estados Unidos, os quadrinhos conseguiram um Eisner de Talent Deserving a Wider Recognition em 2001, faturar o Prix Du Premier Album no Festival Internacional de Angoulême, além de ser considerado a melhor Graphic Novel Indie de todos os tempos pela Wizard Magazine sem se valer do tema de super-heróis, que domina o mercado Americano.
A obra de Alex Robinson passa longe dos temas que acabam chamando mais atenção no mundo das HQs. Não existem super poderes, uma trama cheia de ação, misticismo ou mesmo um crime ou investigação em andamento. Fracasso de Público se mostra como um slice of life, mostrando o cotidiano de jovens enquanto vivem suas vidas na Grande Maçã, Nova York.
Com uma trama bem leve, a revista mostra o decorrer da vida de Sherman, um escritor amador que almeja se tornar profissional enquanto tem uma vida difícil no trabalho que odeia, e Ed, rapaz sem sorte com garotas que sonha em desenhar para uma grande editora. Não existe um personagem principal, por se dizer, Sherman e Ed recebem um destaque a mais no encadernado, mas seus colegas, amigos e chefes são tambem de muita importancia para o roteiro.
Apesar de certas referências à vida nova iorquina poderem passar despercebidas pelo leitor brasileiro – assim como outros pontos da cultura americana – o gibi cumpre seu papel de criar uma identificação para com leitor. A trama mostra coisas da vida de jovens que voltam seus sonhos para atividades artísticas fora do que a sociedade comumente aceita como padrão, trazendo à tona as dificuldades que atingem aqueles que se aventuram no mundo dos quadrinhos e também dos que fazem da escrita a sua ambição.
Os protagonistas e coadjuvantes da história passam por momentos que muito lembram a vida real, eles são vivos e carismáticos, seus momentos cotidianos são tão comuns e ao mesmo tempo tão peculiares que fazem com que tenham uma personalidade própria e vivaz. Seu dia a dia, mesmo numa cidade distante como Nova York, ainda assim consegue trazer uma proximidade talvez universal para aqueles que gostariam de trabalhar com quadrinhos ou com a escrita. Mas não é só humor que reside no roteiro da revista, momentos de drama também existem, inclusive sendo mostrados aspectos do lado “podre” da indústria do entretenimento, sob a forma de Irving Flavor, um desenhista que criou – na década de 40 – um personagem gerador de uma franquia de bilhões e que no entanto vive em um apartamento ruim ilustrando caixas de cereais, sem ter os direitos sobre sua obra.
A arte de Fracasso de Público não é nenhum primor, no entanto, cumpre seu papel. Com um visual cartunesco, consegue criar uma identificação imediata para seus personagens e ilustrar tanto momentos cômicos, quanto românticos e dramáticos sem que tudo isto pareça forçado. Em certa medida, tanto a forma de arte adotada, quanto ao estilo da série, lembram vagamente a HQ canadense “Scott Pilgrim”, mas sem utilizar-se de temas fantásticos e surreais.
Talvez o grande triunfo da série seja que o próprio autor parece ter vivido algo do que ele escreve. É possível notar a proximidade com que Alex Robinson trata o trabalho de Sherman na livraria, onde ele constantemente passa por horas terríveis em meio a clientes insuportáveis e as crescentes explorações e reclamações que vêm da chefia da loja. Ou as dificuldades envolvendo a publicação de contos e de um trabalho regular numa editora de grande porte.
Fracasso de Público – Heróis Mascarados e Amigos Encrencados é uma obra que certamente merece o tempo do leitor. Uma boa pedida para quem quer fugir um pouco dos super-heróis e das lutas fantasiosas e se perder um pouco num divertido humor cotidiano.
A edição da Gal Editora divide o original de apenas um volume (Office Box Poison) em três, uma boa estratégia para publicação por aqui, devido ao preço que poderia alcançar. A qualidade do encadernado aceitável, superior aos quadrinhos mensais que são lançados no Brasil, e possui uma tradução que deixa a história fluir sem cometer gafes astronômicas que por vezes figuram as traduções brasileiras.
Mais resenhas, contos e coisas em http://eoutroscenarios.wordpress.com/