Nenhum mistério

Nenhum mistério Paulo Henriques Britto




Resenhas - Nenhum mistério


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Pretti 28/02/2022

Nenhum mistério
Quando vou para um livro de poemas, eu espero duas coisas: técnica e conexão. Técnica é algo mais simples de avaliar, é mais objetivo, depende de elementos quase sempre fixos que a gente de alguma forma procura no poema: ritmo, concisão, a forma como o texto se distribui e ocupa a página etc. Conexão já é algo muito mais subjetivo e cujos critérios são difíceis de estabelecer.

Com este preâmbulo, posso falar de Nenhum Mistério, de Paulo Henriques Britto. O livro é fascinante em termos de técnica. A sonoridade é belíssima, a forma como os textos se distribuem e ocupam as páginas também. É fácil notar que o poeta se debruça sobre o texto, refina, trata. Porém, ao mesmo tempo, eu infelizmente não me conectei com quase nada. Tirando um ou outro poema ou verso que me alcançou (e que copiei no caderninho de referências), o livro, num geral, não conversou comigo. Os temas não me foram caros, os sentimentos não despertaram os meus. Passei pelo livro sem mistérios, com o perdão da brincadeira, e saí dele muito pouco maior do que entrei.

Apesar disso, recomendo. Acredito que seja uma questão muito mais de simpatia que qualquer outra coisa, então pode ser que a conexão funcione com outros leitores. Além do mais, a técnica refinada vale uma visita.
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Aguinaldo 15/10/2018

nenhum mistério
Você termina de ler "Nenhum mistério" e se sente esgotado, como se tivesse passado horas no mais extenuante dos trabalhos. Todavia, o primeiro impulso após terminá-lo é voltar aos poemas iniciais, folhear o livro para encontrar aquela passagem particularmente feliz, aquele verso que nos arrebatou de vez, retornar ao assombro, ao encantamento. Nas ultimas semanas li vários livros, inclusive de poesias, como o bom "Coral e outros poemas", de Sophia Andresen, que já registrei aqui. Entretanto, nunca deixei longe esse volume de Paulo Henriques Britto, voltei aos poemas enfeixados nele várias vezes. São apenas 27 poemas, alguns anteriormente publicados em jornais e revistas, do Brasil, de Portugal e do Peru. Algumas partes de alguns poemas foram escritas originalmente em inglês (Britto é um dos mais seminais e respeitados tradutores brasileiros). Os poemas tratam das perdas, do vazio, da inutilidade da vaidade, do ofício do tradutor e do poeta, dos rancores contidos, da melancolia, dos esgares provocados pela consciência das limitações alheias, do fluir do tempo, das barreiras, dos limites (do Metron e da Húbris, diria um grego). Cada poema provoca no leitor uma reflexão dura. Somos senhores de nós mesmos ou detritos orgânicos que são continuamente arremessados de um lado para o outro, por acaso, por capricho de uma deidade brincalhona? Já li vários conjuntos de poemas de Paulo Henriques Britto ("Mínima lírica", de 1989; "Trovar claro", de 1997; "Macau", de 2006; "Formas do nada", de 2012), mas esse é o que mais me impressionou. Que poeta dos diabos. Que assombro, que potência, que festival para os sentidos. Qual poema reproduzir aqui? Como dar uma ideia ao eventual leitor das maravilhas que ele cria? Escolho esse (Dos nomes), bom divertimento: "Os nomes se enchem aos poucos, / Um dia eles perdem o estofo, / aos poucos, ou então de repente. / Então ficam ocos. // O mundo está sempre se enchendo / de cascos vazios deste tipo. / Inúteis. No entanto, assim mesmo / continuam sendo, // ocupando tempo e lugar, / iludindo quem os assume, / prestando falso testemunho / do que já não há. // E o mundo se presta a essa farsa. / É como se já não bastassem / as coisas e os nomes das coisas / que as coisas disfarçam. // E há quem (imagine!) ache pouco, / e abrace esses nomes sem estofo / e diga e rediga esses ocos / feito louco". Vale!
Registro #1334 (poesia #101)
[início 05/09/2018 - fim: 10/10/2018]
"Nenhum mistério", Paulo Henriques Britto, São Paulo: Editora Schwarcz (Grupo Companhia das Letras), 1a. edição (2018), brochura 14x21 cm., 70 págs., ISBN: 978-85-359-3137-2

site: http://guinamedici.blogspot.com/2018/10/nenhum-misterio.html
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Eduardo 13/04/2024

Li alguns dos poemas desse livro há alguns anos e havia gostado bastante. Suspeitava que para além do aspecto sisudo ou rígido deles, pelo apreço à metrificação, às rimas e às formas fixas, além da tematização de certo niilismo, havia mais jogo por trás deles. Ajudava a corroborar essa impressão as entrevistas com o autor, em que ele apresenta sempre bastante inteligência com um toque de humor e simpatia.

Talvez fosse um livro mais chato se não tivesse nas suas entrelinhas justamente isso, um humor de quem ri da própria condição de quem encontra limites a todo o tempo, na morte e na dificuldade de representar através das palavras. Outro elemento que tempera os poemas são as indicações de amor, de sentimento. Eles aparecem muito sutilmente nos poemas, que tendem ao reflexivo e ao racionalizante, mas sempre uma razão que esbarra em seus próprios limites, e deixa como resto essa indicação de algum falsa esperança, algum ledo engano, algum sentimento que parece querer enganar efemeridade de tudo.

Justamente quando falta esse humor, de riso de canto de boca, ou o sentimento que se entremeia nas impossibilidades da razão totalizante é que os poemas parecem mais chatos, parecem se levar a sério demais, fazendo a leitura perder gosto. No entanto, para quem souber procurar bem, vai encontrar muita coisa que valha a pena nos versos desse livro, que me pareceu uma das coisas mais interessantes de ler do que li publicado nos últimos anos.
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