Carol 29/01/2019A Cabana do Pai TomásNão sei como calcular o impacto da publicação de A Cabana do Pai Tomás em termos político, histórico e de sucesso de vendas - só perdendo em números de venda para a Bíblia, no século XIX.
Ainda que hoje se conteste sua qualidade literária - melodramático demais, sentimental demais, "cristão" demais - e o retrato condescendente e estereotipado que faz dos escravos, baseado nas teorias raciais da época, A Cabana do Pai Tomás é um livro poderoso.
Contextualizando, estamos num Estados Unidos pré-guerra civil, dividido entre norte (livre) x sul (escravagista), logo após a entrada em vigência da Lei do Escravo Fugitivo, que definia penas severas a todo cidadão que acolhesse ou auxiliasse escravos fugitivos em estados nortistas.
Ao escrever sua obra, Harriet Beecher Stowe pretendia convencer sua audiência que a escravidão não era algo que um bom cristão pudesse defender sem ser hipócrita. Ao criar personagens como o Pai Tomás e a pequena Evangeline St Clare, tão idealizados, a autora buscou angariar a simpatia e a compaixão de seus leitores. E, nisso, ela foi muito eficaz.
As histórias de Pai Tomás, George Harris, de St Clare, de Simon Legree e de tantos outros personagens ganham profundidade pela análise sociológica que a autora faz da escravidão. Harriet analisa o padrão moral duplo da sociedade, da religião e traça paralelos entre a escravidão e o acúmulo de lucros do capitalismo.
Há 160 anos, ela já levantava uma questão ainda hoje relevante: como integrar à sociedade uma população a quem tudo foi negado? Libertar os escravos sem uma política de inclusão cidadã só levaria ao desastre.
A Cabana do Pai Tomás é um livro obrigatório a todo leitor. E pensar que uma mulher, filha e esposa de pastores protestantes, por seu ideal cristão, abalou as estruturas de todo um sistema escravagista. Harriet Beecher Stowe é atipicamente uma feminista de primeira onda, ao conseguir voz no debate público. Recomendo!
Obs.: Em 1969, a Rede Globo apresentou uma novela baseada na obra de Harriet Beecher Stowe. E escalaram um ator branco para o papel de Pai Tomás...