Markarroni 13/05/2020Diante da atual conjuntura política, esse livro é essencialLevitsky e Ziblatt - professores de Ciência Política da Universidade de Harvard, especialistas na América Latina e Europa Ocidental, respectivamente -, fizeram pesquisas substanciais na forma como os países fazem a transição de regimes democráticos para regimes autoritários.
Usando evidências de várias épocas históricas, os autores estudaram e isolaram alguns dos sinais que ficaram evidentes nas transições de regimes na Argentina, Chile, Equador, Hungria, Peru, Polônia, Rússia, Turquia, Venezuela, entre outros países.
Não se trata apenas de uma análise histórica, e sim de uma análise comparativa com o que já aconteceu e o que vem acontecendo atualmente. A tese é consistente, coerente e extremamente plausível. Ela mostra as dificuldades e ameaças inerentes que as democracias modernas enfrentam.
Os autores listam os pontos fortes e fracos, e as regras não escritas que fazem os líderes democráticos se manterem dentro de certos limites que a constituição pode ter deixado abertos à interpretação.
Levitsky e Ziblatt mostram com bastante clareza que a maioria das democracias não mais terminam com um golpe militar, onde o general estaciona um tanque de guerra numa praça pública e remove o presidente democraticamente eleito, como aconteceu no Chile em 1973.
Atualmente, as democracias morrem quando demagogos - indivíduos que gozam de amplo apoio popular e vêm de fora do estabelecimento político normal - chegam ao poder por meios democráticos e depois subvertem gradualmente as regras escritas e não escritas da democracia. Esses líderes geralmente exibem quatro características:
1. Rejeitam as regras estabelecidas da democracia, atacam leis e constituições, tentam minar a legitimidade das eleições, tentam usar medidas extra-constitucionais para mudar coisas que foram projetadas para garantir seu poder.
2. Negam a legitimidade dos opositores políticos. Acusam seus oponentes de traição ou atividade criminosa, os prendem ou defendem que eles sejam presos - mesmo depois de terem vencido as eleições. Tentam encontrar maneiras de deslegitimar seus oponentes e impedir que eles participem do processo democrático.
3. Toleram ou incentivam a violência. Encorajam - inicialmente de forma sutil e depois abertamente - seus seguidores a usar ou ameaçar com violência. "Elogiam ou se recusam a condenar, outros atos significativos de violência política, seja no passado ou em qualquer outra parte do mundo".
4. Se movem para cercear as liberdades civis de seus oponentes, incluindo partidos de oposição, veículos de mídia ou críticos.
Alguma semelhança com Jair Bolsonaro? Todas, né? Afinal, ele é um sintoma de um sistema democrático em decadência. Em um ambiente político são, ele nunca teria sido capaz de se erguer. Ele não teria saído impune com a normalização de uma linguagem ultrajante e insultuosa. Ele não teria sido capaz de reunir tantos apoiadores.
Podemos concordar que o avanço desse populismo direitista e bolsonarista se deu porque o governo que foi responsável pela pior recessão econômica na história do país e pelo maior escândalo de corrupção entre todos os países democráticos, era de esquerda.
Outro ponto importante do livro é quando os autores dissertam sobre quando Donald Trump - um demagogo populista clássico que cumpre todos os quatro critérios padrão - foi eleito presidente. E desde que se tornou presidente, ele demitiu funcionários filiados a partidos da oposição, atacou implacavelmente a imprensa, continuou a defender o processo criminal de seus oponentes, elogiou ou se recusou a condenar atos de violência política, e constantemente difamou qualquer um que o desafiasse como "um inimigo do povo".
Duas normas básicas são necessárias para preservar os pesos e as contrapesos da democracia: a tolerância mútua (entender que as partes concorrentes devem se aceitar mutuamente como rivais legítimos) e a indulgência (ideia de que os políticos devem exercer contenção no uso de suas prerrogativas institucionais).O problema é que a tolerância e a indulgência mútuas tornaram-se qualidades raras no mundo político de hoje, particularmente no Brasil.
Recomendo para quem quer ler um relato inteligente e altamente coerente sobre um assunto de política que todos nós precisamos estar cientes. Este não é um livro “Nós contra a direita e o conservadorismo”, é uma avaliação política do status quo - mas é também um aviso para ser levado muito a sério, pois mostra o que realmente estamos perdendo.
Levitsky e Ziblatt não dizem que a democracia está morta, mas eles argumentam convincentemente, que muitas das coisas que tornaram a democracia razoavelmente estável, foram minadas pelos acontecimentos recentes - e que precisamos prestar atenção a esse fato e fazer algo a respeito.
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