Malle 10/01/2024
Tem ninguém doido aqui nessa cidade não, seu moço.
Um livro de fantasia e sobrenatural verdadeiramente brasileiro, ambientado no Brasil-sil-sil. O Auto da Maga Josefa preenche um vazio, um lugar desesperadamente necessário dentro da literatura brasileira: é a desmistificação do pensamento auto pejorativo que alguns brasileiros tem, de que boa fantasia é somente a estrangeira. Com Paola Siviero mostrando que basta nada mais, nada menos que amor pelo Brasil e adaptação ao nosso cantinho do mundo.
Acompanhar as aventuras de Toninho e Josefa foi um deleite, algo harmonioso de se ver sem deixar de perder as boas piadas, com um humor natural e que realmente parece ser algo que os personagens da trama diriam Além de ter uma boa dose de ação, também traz um pequeno mistério que nos persegue o livro todo - por que será que Josefa ajuda Toninho? Com referências também a acontecimentos históricos, o livro ambientado no Nordeste (mais precisamente, na Paraíba), vem com coisas como rapadura anti-veneno, um galho de cajueiro como vassoura de bruxa, uma vampira fã de cachaça. Aqui, o regionalismo é positivo: o Nordeste é tratado como o belo lugar que é, rico em cultura e brilhantismo, em que somente quem não o conhece o reduz a secas e miséria.
Os diálogos são cheios de coloquialismo e naturalidade, que acompanham bem o cenário retratado - o cenário do dia-a-dia, no quintal de alguém, numa casa velha abandonada da vizinhança. A amizade entre os protagonistas floresce no decorrer da história com cada conto que passamos, e nem percebemos o tempo passar. A leitura tem uma fluidez ótima, com um ritmo equilibrado.
O único ponto negativo que encontrei, que talvez tenha passado batido por alguns, é uma retratação estereotipada de um homem judeu. Ele é descrito como tendo um nariz encurvado e olhos pequenos, e quem conhece bem as imagens pejorativas usadas contra judeus sabe que essa imagem é usada para pintá-los de uma determinada maneira. Talvez tenha sido uma retratação sem más intenções, além de ser passageira, mas existe no livro.
Apesar disso, eu recomendo muito O Auto da Maga Josefa como uma fantasia nacional sólida, bem humorada e divertida.