A mulher é uma degenerada

A mulher é uma degenerada Maria Lacerda de Moura




Resenhas - A mulher é uma degenerada


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Tatá 15/05/2020

Transmitir, transformar e transgredir
Maria Lacerda de Moura (1887-1945) é a pioneira do anarcofeminismo no Brasil. Anticapitalista, antifascista (considerada uma das primeiras antifascistas das Américas), vegetariana, nos traz em "A mulher é uma degenarada" uma acidez e potência dignas de leitura. Essa edição da obra comentada enriquece e atualiza as palavras ditas nos anos 20 pela a autora. Principalmente no que concerne a atualização do feminismo de Maria Lacerda, onde algumas das comentaristas reparam que dentro dessa atualização, haveria de ter críticas que levassem em conta raça e classe de um modo profundo, o que só enriquece a obra. As comentaristas enfatizam a forma que a autora faz críticas anarcofeministas à modernidade, ao capitalismo e a cultura patriarcal e como ela sonha com um mundo mais justo, digno e de caráter libertário.
O período dos anos 20 no Brasil estava passando por muitas transformações, principalmente em São Paulo, com a indústria e o movimento operário crescendo respectivamente e com as ideias anarquistas ganhando força. Apesar de ter nascido em Minas Gerais, Maria Lacerda de Moura foi para São Paulo e vivenciou essa realidade em ebulição.

É incrível ler a autora antecipando questões como a maternidade ser uma escolha e não uma imposição à mulher, ou fazendo críticas severas ao feminismo liberal e colocando a educação como potência transformadora, como ferramenta fundamental para o processo revolucionário, defendendo a educação libertária.

Este livro foi escrito em resposta à um psiquiatra, o Miguel Bombarda, responsável por dizer que a mulher é uma degenerada. A partir dele, ela constrói uma narrativa ácida, usando argumentos de outros cientistas para bater de frente com o psiquiatra, chamando o que ele defende de pseudociência, criticando também a ciência eugênica e racista, principalmente no que concerne à pseudociência de superioridade das raças (evolucionismo cultural) - que veio a se tornar ferramenta que legitimou o nazismo, anos mais tarde-. Também alfineta Lombroso, médico famoso por dizer que as características das pessoas determinavam quem elas seriam, ou seja, ele usava de um determinismo biológico para classificar o caráter das pessoas. E a partir disso, ela nos mostra sua visão de mundo acerca de diversas questões, como por exemplo, uma crítica sobre a ideia de filantropia, defendendo a renovação social, o direito das pessoas serem livres e não dependerem de caridades dadas pelos/as burgueses que não querem ver a autonomia da classe trabalhadora, mas sim a dependência.

A autora entende perfeitamente que as desigualdades que se perpetuam pelo viés de gênero se dão devido à questões puramente sociais e culturais e não biológicas. Expõe, para fortalecer seus argumentos, a carta do antropólogo Roquette Pinto, que elogia as colocações da autora quanto a luta pela equidade feminina e reafirma que a desigualdade é promovida por aspectos culturais e sociais, e não biológicos.

Defende uma ciência que seja pela verdade do coletivo, ou seja, ela entende que a premissa científica parte de uma subjetividade, de um interesse. Isso é discutido com clareza nas Ciências Sociais nos dias de hoje, que toda pesquisa parte de um ponto subjetivo e com um determinado interesse. A questão é saber se o interesse é coletivo ou patronal.

É um livro que precisa ser lido fazendo as ressalvas do tempo em que foi escrito. Muitas coisas que a Maria Lacerda de Moura diz, estão desatualizadas, inclusive terminologias como palavras que constantemente aparecem no livro "civilizados/selvagens" ou então, um inconsciente complexo de inferioridade ao colocar, em alguns momentos, europeus como superiores. Um vício que infelizmente, até hoje vemos no país, não é?
Ou também quando ela vai por uma perspectiva negativa de observação da mulher, colocando-as como sem espírito combativo e sugerindo que é preciso que os homens se movam para que as mulheres consigam se mover. Hoje, o que se vê nas atualizações dos feminismos, é uma narrativa que visa positivar as mulheres em seus tempos históricos, entendendo-as como transgressoras em todos os tempos históricos em que foram oprimidas e que elas sempre estiveram ali independente dos homens, só que agindo às sombras. Ainda assim, quando a autora exalta as mulheres chamadas por ela de "exceções", que peitaram essa lógica patriarcal de frente, ela enfatiza a força feminina ao fazer isso mesmo diante de tantas entraves.

São muitas coisas a serem ditas sobre esse riquíssimo livro. Leiam e se surpreendam, vejam como havia coragem, ousadia e acidez nas falas da nossa grande anarquista brasileira.
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Laura Regina - @IndicaLaura 31/03/2022

Neste escrito de 1924, conhecemos a visão de uma das principais feministas e anarquistas brasileira.
Felizmente, a editora Tenda dos livros lançou em seu site a nova edição do escrito de Maria Lacerda, com fac-símile do jeitinho que ela escreveu, além de vários textos de estudiosas atuais pontuando a importância deste livro.

E qual é sua importância? Numa época em que os grupos feministas mais famosos lutavam principalmente pelo direito ao voto, Maria aprofundava bastante a questão, lembrando a importância da educação para todos e livre de amarras religiosas e partidárias. Além disso, falou bastante sobre a capacidade jurídica e econômica das mulheres, rebatendo pseudocientistas da época com uma escrita científica de verdade.

Isto tudo há quase 100 anos! Quanto esta mulher foi à frente do seu tempo! Quanto aprendemos com ela, com sua visão de melhoras sociais que integram a todos nas responsabilidades e direitos! E quanto ainda precisamos percorrer!

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