Vitória 02/05/2023
Eu comecei esse livro por um motivo específico e, assim que terminei, percebi que tinha caído num golpe. Já li gente ansiosa do mesmo autor e fiquei completamente apaixonada, então pegaria esse aqui em algum momento de qualquer forma, mas o motivo principal foi saber que ele tinha sido uma das leituras do clube do geefe. A minha vontade de ler e assistir a discussão depois, ainda que atrasada, bateu com força, então imaginem a minha surpresa quando abri o Instagram e descobri que o perfil do clube não existia mais. Estou revoltada? Óbvio, mas a minha revolta maior agora é pelo fato de não saber a fofoca completa. Fofoca pela metade mata fofoqueira, então quem souber do ocorrido, por gentileza explane.
Começando agora a falar do livro em si, ele possui alguns aspectos muito parecidos com gente ansiosa, e outros completamente diferentes. Já percebi que esse autor gosta de apresentar um grupo pro leitor e focar nele até o final da história. Em gente ansiosa foi a galera que tava visitando o apartamento, em um homem chamado ove (que eu só assisti o filme mesmo) é a vizinhança da vila, e aqui são as pessoas que moram no prédio. Sinceramente, eu amo que ele tenha escolhido esse jeito pra construir tudo, porque ainda que sejam muitos personagens, e que eu tenha confundido alguns deles nos momentos iniciais, o autor consegue apresentá-los pro leitor com muita profundidade, de uma forma que eu realmente achei que conhecia cada um deles, e sofri com cada plot que eles precisavam enfrentar ao longo da narrativa.
O ponto diferente é a narração. Em gente ansiosa, apesar de ter uma grande revelação sobre quem é o narrador no final, a gente sabe que está acompanhando tudo pelos olhos de um adulto, e aqui a gente permanece o tempo todo ao lado de uma criança. Isso poderia ter sido prejudicial pra história, mas o autor soube usar isso de uma forma que só enriquecesse a sua narrativa. A Elsa é uma menina de 7 anos e, apesar de ser um tanto quanto precoce, ela não deixa de ser isso em momento algum. Como qualquer outra criança, ela não entende o luto, e acaba achando na fantasia, e nas histórias que a avó contava pra ela, uma forma de enfrentar tudo isso. Eu tinha 14 anos quando perdi a primeira pessoa importante pra mim, e mesmo que eu tivesse o dobro da idade que a Elsa tem aqui, foi impossível não ver aquela Vitória sendo retratada aqui. Naquela época, eu me refugiei nos livros, que eram e ainda são o meu local de segurança, pra não encarar uma realidade que era assustadora pra mim, e é exatamente isso que a Elsa faz aqui. O autor cria uma mitologia de livro de fantasia sem estar escrevendo um livro de fantasia, utiliza tudo isso e ainda faz com que faça todo sentido junto com os plots da história "no mundo real". Não dá pra ser mais genial que isso.
A história de cada vizinho é importante de uma forma diferente. Confesso que o monstro e o taxista foram os que mais me encantaram, mas não existe sequer um desses persoangens que não seja interessante. Aqui o autor se utiliza novamente da idade da Elsa pra tirar uma carta da manga. Como toda criança pequena, ela tem a ideia dentro de si de que a vida de todos ao seu redor começou no momento de seu nascimento. O autor usa disso pra fazer com que o leitor crie um pré-julgamento a respeito das histórias dos secundários e construa uma narrativa (ou quase uma fic) dentro da sua cabeça sobre cada um deles, só pra depois a gente quebrar a cara junto com a Elsa e descobrir como tudo estava errado. É incrível vê-la percebendo que a sua avó, que era a pessoa mais próxima dela no mundo inteiro, tinha segredos, outras amizades, outras convivências. Isso, como era de se esperar, gera uma revolta nela num primeiro momento, e tenho que dizer que eu mesma fiquei revoltada, mas assim que ela aceita o passado de cada um à sua volta, inclusive da sua avó, e aceita mergulhar nisso, a história deslancha.
Inclusive, temos que falar da vovó, porque eu acho que esse livro é tanto dela quanto é da Elsa. A mulher é incrível desde a primeira página. Totalmente fora dos padrões, a gente sequer consegue imaginar o que ela pode fazer na páginas seguinte, porque a mulher não segue absolutamente regra alguma. O autor consegue fazer com que o leitor se apegue a ela rapidamente e sofra profundamente com a sua morte que acontece na página 40. Dá pra acreditar? E como se não bastasse, ele novamente nos coloca no papel da Elsa, porque o leitor também não conhece o que essa mulher fez ou quem ela era no passado, então a gente vai descobrindo tudo, se surpreendendo e se revoltando junto com ela. A cada carta que a Elsa recebia a missão de entregar eu queria bater numa parede me perguntando onde estaria a carta endereçada a ela, ao mesmo tempo que morria de curiosidade pra saber o motivo das desculpas.
O tema principal da história é obviamente o luto, e não só um tipo de luto, porque mais pro final temos outra morte que eu não vou dizer de quem é, mas que também foi dolorosa com força. Ainda assim, o autor versa sobre muitos assuntos que, eu creio, se encaixam na vida de quase todo mundo. Não vou nem tentar comentar sobre cada um deles aqui, porque são vários, mas basta dizer que todos são tratados com muita responsabilidade e um toque de humor, e que eu poderia ler mais 500 páginas desse homem versando sobre cada um deles. Nesse momento eu realmente não sei dizer se o meu favorito do autor é o gente ansiosa ou esse daqui, mas minha avó pede desculpas com certeza acabou de entrar pra minha lista de favoritos do ano. Só acho que vou precisar de um bom tempo antes de pegar a próxima obra do autor, ele mexe demais comigo, de um jeito que eu não aguento ser mexida com frequência.