Sobre Poeira e Sol e Uma Certa Calça Floral

Sobre Poeira e Sol e Uma Certa Calça Floral Catarina Guedes




Resenhas - Sobre Poeira e Sol e Uma Certa Calça Floral


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Krishnamurti 01/10/2018

Sobre poeira e sol e uma certa calça floral
O romance de título longo da senhora Catarina Guedes, retrata uma narrativa que faz lembrar o livro –inclusive vagamente referenciado na obra -, On the Road de Jack Kerouac. Em “Sobre poeira e sol e uma certa calça floral – Segundo volume da série Isadora e a BR. Uma tal Isadora, patricinha consumista de trinta e oito anos, lá um belo dia sai “de casa com a roupa do corpo para entregar um press-kit num jornal” e decide mandar tudo às favas. A criaturinha se mete dentro dum fusca amarelo e começa uma jornada, “sem lenço e sem documento” pelas estradas do Extremo Oeste baiano, mas precisamente entre as cidades de Juazeiro, Barreiras e Luís Eduardo Magalhães. A estradeira que adora, e não vive sem, referências de roupas de marca, bolsas importadas, perfumes famosos, celulares e os Skyps da vida, encontra pela frente bastante aventura. Se depara com animais peçonhentos em banheiros de beira de estrada, termina se enturmando com a alta sociedade (leia-se endinheirada), de Barreiras, vai a festinhas, e finalmente conhece um tal piloto da aviação comercial. Um personagem cinematográfico, daqueles que juntam ao frisson da profissão, uma beleza de deus grego. Hummm.
E Lá vai a garotinha (na verdade uma adolescente de meia idade), na barca das loucurinhas juvenis. E tome-lhe, passeios de monomotor, namoros ardentes com o tal piloto, e aventuras em povoados de gente humilde. No rastro da “felicidade” surgem também problemas, visto que não há paraíso sem serpentes na face da Terra. Enfrentou obstáculos, primeiro como vítima, depois como representante dos grevistas caminhoneiros que pararam o país por quase uma semana (alguém lembra dessa nossa baderna ‘logística’?), e acabou sendo recolhida na cadeia. Surgem também na narrativa, intrigas, ciúmes e aventuras amorosas outras, o que de resto, ela não contava nessa caça à liberdade, para dar um Up na existência insossa que até ali vivera. Ser mais ela mesma, libertar-se das amarras da existência vazia, a seu modo claro. Louve-se a coragem da personagem.
Ainda que não seja o objetivo precípuo do romance da senhora Catarina Guedes, duas questões latejam de maneira subjacente no texto e, em assim sendo, mérito para a autora que as desperta. O de por em evidência circunstâncias gravíssimas desse nosso país pouco dado a coisas sérias. Para o leitor que se der ao trabalho da abstração, há de notar em meio ao tom irônico e divertido no qual a história é contada, as descrições de léguas e mais léguas sem viva alma, ou ocupada com plantações e plantações a perder de vista. A nossa velha e extrema desigualdade quanto à distribuição demográfica da população, (somos campeões em desequilíbrios). A título de lembrança e seguindo dados recentes do IBGE, o Brasil tem mais de 208 milhões de habitantes. Destes, 23,8% da população (ou 49,7 milhões) vive nas 27 capitais e mais da metade da população (57%) vive em apenas 5,7% dos municípios do país. Se compararmos as densidades populacionais por região, temos: Região Sudeste 86 habitantes/km², Sul-48, Nordeste-34, Centro-oeste – 9 e Norte, 4 habitantes por/km². Uma catástrofe. Como desenvolver o território nacional com esses indicadores?
Segunda questão decorrente da primeira; e típica justamente da falta de planejamento em todos os níveis. O tal do agronegócio é tech, agro é top, agro é tudo! Ainda nos ressentimos, ainda que pesem certos avanços eu sei, do modelo latifundiário. Muito bem, quem conseguiu de berço, ou das oportunidades que as muitas crises nos apresentaram ao longo do tempo, de possuir grandes extensões de terra (como alguns personagens endinheirados do romance que migraram do sudeste em tempos das vacas magras do café), conseguiu. Quem não, não. Há... O agronegócio representa um comércio da China. Da China não, do mundo todo. Uma belezura. Vejamos trecho, na página 15 que se passa em Barreiras:
“No salão do café, percebi o que meu amigo Piotr queria dizer sobre aquela ser uma região diferente do que eu havia visto até então. Os coreanos que me contemplaram seminua no dia anterior estavam lá, empertigados em ternos escuros. Em outra mesa, mais estrangeiros. Um grupo de holandeses criadores de vacas leiteiras. No bufê, disputei o pegador de queijo com gente de várias partes do planeta. Todo mundo muito loiro, muito japonês, um tanto quanto nordestino e todos com uma meta em comum: fazer o Oeste, a fronteira aberta poucas décadas antes e cheia de oportunidades para quem fosse capaz de desapegar-se de umas tantas comodidades”.
Sem uma política demográfica que não seja a simplista atitude de dificultar ou estimular novos nascimentos, seguimos ao deus dará das circunstâncias de momento. Não nos entra na cachola a urgente necessidade de promover a ocupação ordenada de vastos territórios habitáveis do país, que ainda hoje continuam sendo os mesmos sertões de séculos a fio. Continuamos a ter as populações locais de certos rincões brasileiros como a dos Jecas Tatus de Monteiro Lobato, ou os personagens de Graciliano Ramos e Raquel de Queiroz. Melhoradas talvez, porque tudo se atualiza, inclusive os personagens. Os vaqueiros de hoje em dia, por exemplo, não são mais trogloditas, andam de motocicletas pastoreando vastidões de plantações de soja e algodão. Continuam emprenhando (como não?) as mocinhas da terra que já não são mais ingênuas Marias (agora têm os nomes de marcas de consumo – como certa Melissa de 18 anos, e já devidamente emprenhada, assim batizada, em homenagem a uma marca de sandálias). No mais é jogatina de sinuca (estudo pra quê?), as comidinhas da terra e muita cachaça de toda qualidade possível.
O escritor Lima Barreto, em 1911 ao fechar o seu famoso romance Triste fim de Policarpo Quaresma” retratou a atitude da personagem Olga que tentava de todas as formas salvar a vida de Quaresma. A certa altura ele escreve:
“Saiu e andou. Olhou o céu, os ares, as árvores de Santa Teresa, e se lembrou que, por estas terras, já tinham errado tribos selvagens, das quais um dos chefes se orgulhava de ter no sangue o sangue de dez mil inimigos. Fora há quatro séculos (grifo meu). Olhou de novo o céu, os ares, as árvores de Santa Teresa, as casas, as igrejas: viu os bondes passarem; uma locomotiva apitou; um carro, puxado por uma linda parelha, atravessou-lhe na frente, quando já a entrar do campo... Tinha havido grande e inúmeras modificações. Que fora aquele parque? Talvez um charco. Tinha havido grandes modificações nos aspectos, na fisionomia da terra, talvez no clima... Esperemos mais (novo grifo), pensou ela”.
Vamos continuar caminhando por aí desembestados, mais uns quinhentos anos, por certo...


Livro: “Sobre poeira e sol e uma certa calça floral (Segundo volume da série Isadora e a BR) ” – Romance de Catarina Guedes – Editora Penalux – Guaratinguetá - SP. 2018, 188 p.
ISBN 978-85-5833-398-6
Link para compra e pronto envio: http://editorapenalux.com.br/loja/catarina-guedes

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Isabela | @readingwithbells 16/10/2018

Isadora decide pegar a estrada e deixar o destino a guiar rumo ao desconhecido. Ela decide ir para o cerrado baiano, passando por Juazeiro, Barreiras e Luís Eduardo Magalhães.
A protagonista, ao entrar em seu fusca amarelo, mal imagina as diversas situações e aprendizados lhe esperam nessa viagem.
Não só Isadora vai ter vários passeios maravilhosos com pessoas novas, ela também vai enfrentar uma situação complicada, uma greve que realmente aconteceu no Brasil.
Isadora é independente e destemida. Apesar de certo medo do inesperado, ela embarca em todas as aventuras que a vida lhe proporciona.
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“O visual, a personagem são singularidades inseridas em um mundo que esconde complexidades humanas: traições, paixões, conflitos. Uma deliciosa viagem rumo às páginas da obra que direcionam, metalinguisticamente, à viagem da protagonista que faz seu caminho rumo à construção dos seus valores e opiniões.”
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