Otávio - @vendavaldelivros 05/04/2024
“Eu sou Oyá, filha do vento e das mulheres-búfalo. O fogo é meu consorte, o raio minha vontade! Vocês são apenas areia do deserto sob meus pés.”
A mãe do ódio e da intolerância é a ignorância. Levo isso pra vida e tento enxergar isso no dia a a dia porque eu já estive do outro lado. Em algum momento da minha vida, há muitos anos, minha total ignorância sobre as religiões de matrizes-africanas me fazia ser preconceituoso e falar coisas absurdas aos meus ouvidos de agora. O conhecimento é capaz de abrir as portas para o respeito e a arte tem um papel fundamental nesse processo.
Publicada em 2019, Contos dos Orixás é uma HQ do autor Hugo Canuto que traz os principais orixás do panteão Iorubá como personagens principais de uma saga heroica, no melhor estilo “Liga da Justiça” e “Vingadores”. Na obra, Xangô é o personagem principal, mas tem a companhia de Oyá, Ogum, Exu e Oxum no enfrentamento dos invasores do Reino de Iemanjá, chamados de "A Manada".
Ricamente alimentado com a cultura e a tradição iorubá, claramente fruto de uma pesquisa profunda sobre os símbolos e as histórias, Contos dos Orixás tem ainda um trabalho visual belíssimo, digno de obra de arte, com cenas que merecem molduras.
Em tempos onde terreiros são expulsos, violentados, e agredidos até pela força policial, entregar um conteúdo tão rico, belo e informativo é essencial para auxiliar no combate ao ódio e à violência. Enfrentar a demonização das religiões de matrizes-africanas pelos fundamentalistas passa, também, por reforçar a identidade, a beleza e a força desses povos.
Mais do que isso, reconhecer nos mitos e nos Orixás as mesmas potências e forças das mitologias grega e nórdica, tão exploradas pelo Ocidente, reverenciadas e levadas para as grandes produções literárias e cinematográficas, traz um pouco mais de justiça para uma sociedade que ainda privilegia a história branca e judaico-cristã.
É através do machado de Xangô, rei e provedor da Justiça que “Contos dos Orixás” abre os caminhos no enfrentamento do ódio e do preconceito, mostrando como a arte pode e deve ser usada para mudar a sociedade.