Pandora 08/01/2023Comecei a ler este livro no dia 20/12/2022, mas quando chegou a véspera do Natal eu parei, porque eu amo Natal, é uma época alegre para mim e o livro é triste. É triste, mas é uma reunião de histórias muito boa: dei cinco estrelas para 13 dos 17 contos, quatro para 2, duas para 1 e outro não entendi lhufas, nem me atrevi a classificar. No fim, terminei a leitura no Dia de Reis. :D
Todos os contos se passam na época do Natal, mas esqueça festas familiares com muita comida, troca de presentes e as tradicionais figuras polêmicas desta época como o tio do pavê. Os protagonistas destas histórias, em geral, não estão nos melhores dias de suas vidas: há uma família de bóias-frias caminhando sob o sol escaldante após perder o emprego; a mulher com dor de cotovelo pelo abandono do ex; o funcionário que teme ser demitido e acredita que uma mendiga possa lhe trazer sorte ou azar; a sedução velada de uma esposa traída ao hóspede do marido; a viajante que escuta a história de uma mãe desafortunada, mas cheia de fé; o soldado que passa a noite na cadeia por causa de um superior; um burocrata que enfrenta ele mesmo a burocracia do sistema para que possa viajar com o filho às custas do governo; o filho que tenta afastar do Natal em família a figura do pai morto que sempre foi um estraga-prazeres; o homem que vai ao cinema para não pensar em suicídio; a mulher que tem todas as coisas menos um filho, que é o que mais deseja; a família tradicional brasileira e os critérios para escolher o melhor pretendente para a filha; o rapaz sensível que chora de saudade de um Natal passado; o homem que repensa a própria solidão ao ver a solidão do outro.
Foi uma experiência muito rica e reflexiva, são situações e vidas tão díspares! Às vezes eu me pego pensando no que estará acontecendo com um ser humano que eu não conheço em outro lugar do Brasil naquele momento, ou mesmo em outro pais, quem estará chorando enquanto eu estou rindo, quem estará morrendo enquanto estou comemorando mais um ano de vida, enfim… e este livro me trouxe estas reflexões.
Destaco três contos que me tocaram por motivos diversos:
Feliz Natal, de Luiz Vilela, que me levou de volta à minha cidade natal, especificamente à rua onde eu morei por 13 anos e conhecia praticamente todos os vizinhos do quarteirão.
Presépio, de Carlos Drummond de Andrade, pela incrível construção linguística e literária que, colocando o tempo cronológico versus o tempo interno, trata com maestria e humor a condição feminina na sociedade brasileira no início do séc. XX.
Natal no Paraguai, de Rachel de Queiroz, que partiu meu coração em mil pedaços.
Parabéns ao Luiz Ruffato pela organização desta ótima coletânea!