caroline.carolmora 16/04/2024
"Vergonha", de Brittainy C. Cherry, mergulha em um enredo carregado de drama excessivo. Jackson enfrenta uma demonização injusta pelos habitantes da cidade, que o rotulam como monstro e cruel devido ao seu estilo de vida mulherengo e a um incidente traumático envolvendo seu pai na infância. A autora exagera a curiosidade dos moradores de Chester ao ponto de torná-la caricata, retratando a cidade como se fosse habitada por apenas cinquenta pessoas.
Jackson é um personagem encantador, apesar de suas cicatrizes emocionais. Seu humor ácido, ternura surpreendente e amor genuíno por seu cachorro Tucker acrescentam profundidade à sua personalidade. Ele defende apaixonadamente aqueles que ama, demonstrando uma lealdade inabalável, independentemente das consequências. Essas características o tornam um protagonista complexo e envolvente, capaz de conquistar o leitor apesar dos desafios que enfrenta.
Por outro lado, a protagonista, Grace, não consegue despertar o mesmo interesse. Apesar de ser uma personagem de força incomparável, moldada pela pressão psicológica imposta por seus pais e pelo seu ex-marido. Em sua jornada, ela luta contra as amarras do passado e busca a liberdade de viver sua própria verdade, enfrentando desafios que a tornam resiliente. Porém, parece preferir lidar com seus traumas emocionais por meio de relacionamentos amorosos, em vez de buscar ajuda profissional, revelando uma dependência emocional, incluindo em relação com Jackson. Sua falta de maturidade emocional é evidente, influenciada pela intervenção de terceiros em suas atitudes e pensamentos. Apesar de entendermos a influência de seu passado, sua apatia excessiva sugere uma fragilidade emocional desproporcional.
A resolução dos conflitos familiares é simplista e pouco convincente, com os pais de Grace e o pai de Jackson resolvendo suas diferenças principalmente devido ao relacionamento entre os filhos.
A transformação repentina da mãe de Grace é quase justificada pela traição de seu esposo e da mãe de Jackson, o que, em minha opinião, não se encaixa de forma coerente. Entendo que ser traída causa traumas, mas não justifica tornar-se repugnante com todos, inclusive com as filhas. A maneira como a autora escolheu retratar o pai de Jackson lidando com esse trauma, ao se tornar alcoólatra após descobrir a traição, parece mais plausível do que simplesmente transformá-lo em uma pessoa horrível sem um vício aparente para "justificar" seu comportamento.
O pai de Grace, um pastor da igreja com um passado obscuro, é retratado de forma contraditória, o que contrasta com a imagem pública que ele construiu ao longo dos anos.
A descrição de Autumn, uma personagem problemática que traiu sua melhor amiga com o marido, como uma vítima vulnerável, é desconcertante, especialmente pela falta de remorso evidente. Apesar de a autora tentar amenizar sua imagem ao ajudar Grace a se reaproximar de Jackson.
Finley é apresentado como um personagem extremamente inconveniente e abusivo, cujo suposto arrependimento parece mais relacionado à perda de controle sobre Grace do que a uma compreensão genuína de seus erros.
O aspecto mais decepcionante do livro é a abordagem superficial das perdas gestacionais de Grace, deixando uma lacuna significativa na trama. A falta de exploração de possíveis soluções para seu desejo de ser mãe, como tratamentos de fertilidade ou adoção, é frustrante e deixa um vazio na conclusão da história. A protagonista enfrentou sete abortos e a gravidez de sua melhor amiga, sendo esse um ponto crucial na história e o maior sonho de sua vida.
Em síntese, embora "Vergonha" tenha seus pontos positivos, também apresenta falhas que podem ser melhoradas. A inclusão de tratamentos psicológicos na trama e a abordagem da possibilidade de adoção pela protagonista seriam adições relevantes, capazes de enriquecer a narrativa e provocar reflexões significativas nos leitores, mesmo em um contexto fictício.
? ? Se um dia você se apaixonar de novo, por favor, que seja por mim. ?