Aione 13/03/2020Esse Duque É Meu é o último volume da série Contos de Fada de Eloisa James, publicada no Brasil pela editora Arqueiro. Originalmente, esse é o terceiro livro da série, a qual se propõe a trazer releituras de contos de fada clássicos através de romances de época. Aqui, a autora trouxe uma recontagem do conto A Princesa e a Ervilha.
Olivia e Georgiana Lytton são gêmeas, mas bastante diferentes entre si: enquanto Georgie seguiu às riscas a educação dos pais e é considerada uma perfeita dama, Olivia é espontânea demais e tem um peculiar gosto por trocadilhos considerados um tanto quanto vulgares. Por ter nascido primeiro e ser, portanto, a filha mais velha, foi prometida desde criança a casamento com o duque de Canterwick, união que não traz a ela nenhuma perspectiva de felicidade — exceto pelo dote que ela dará à Georgie, garantindo, assim, que sua irmã faça um bom casamento. Surge então a oportunidade de Georgie ser escolhida pelo duque de Sconce, cuja mãe está à procura da futura duquesa ideal. As duas irmãs partem para a propriedade, para que Georgie seja submetida à avaliação da duquesa viúva. Nenhuma delas contava, contudo, que Olivia e o duque de Sconce se apaixonariam um pelo outro.
É a narrativa de Eloisa James que, principalmente, me faz gostar dessa série. Seu tom é tão divertido e irônico que é impossível para mim não fazer uma leitura recheada de sorrisos e risadas pelo humor que desponta a cada página. Nesse caso, o humor é acentuado pelo gosto “vulgar” de Olivia, que adora trocadilhos e piadas de duplo sentido. Essa, aliás, foi uma das maneiras da autora trazer algo de A Princesa e a Ervilha, que na época de sua publicação — segundo a nota da autora ao final do livro — foi considerada uma história controversa pelas possíveis interpretações do significado da “ervilha” que estaria incomodando a princesa em seu colchão. Em termos de releitura, aliás, diria que esse é um dos livros da série Contos de Fada em que a associação com o conto original mais parece distante — em A Torre do Amor, também tive essa impressão. Nesse caso, além dessa questão do humor de Olivia ser uma ligação com A Princesa e a Ervilha, a outra conexão se dá pelo fato da mãe do duque de Sconce estar em busca da candidata ideal para casar com seu filho. Tirando esses fatores, Esse Duque É Meu segue narrativa e caminhos próprios.
Outro fator que também sempre me agrada nos livros de Eloisa James é como ela trabalha as histórias pautadas em questões de sororidade e empoderamento feminino. Aqui, fiquei curiosa em ver como ela faria isso, considerando que temos duas irmãs interessadas no mesmo homem. Felizmente, o enredo não é conduzido por nenhum clima de competição entre elas, assim como há também a exposição do fato injusto de que Georgiana seria uma excelente pesquisadora, porém não tem o direito de estudar as ciências única e exclusivamente por ser mulher.
Apesar disso, outros aspectos da história me incomodaram conforme foram aparecendo, apesar de Eloisa James ter também apresentado contrapontos a eles. O primeiro é que toda a apresentação inicial do duque de Canterwick é feita para gerar humor, mostrando-o como um homem dotado de pouca inteligência. Contudo, esse mesmo personagem foi alguém que, na hora do nascimento, sofreu complicações que afetaram a oxigenação em seu cérebro. Sendo assim, é um personagem com deficiência mental, e me pareceu de mau gosto zombar dele por isso. O contraponto é que Olivia, ao longo da leitura, passa a encarar o personagem de maneira carinhosa e demonstra que não é certo tratá-lo como incapaz. O outro aspecto refere-se à própria Olívia e à contraposição feita entre ela e Georgie. A protagonista é descrita como gorda e sente-se mal por isso, uma vez que a silhueta de Georgie, magérrima, é dada como a ideal para uma duquesa. O problema não está nesse paralelo, já que seria interessante explorar a injustiça de alguém se sentir mal com seu próprio corpo pelo estabelecimento de padrões e é positivo que a protagonista seja a não-padrão. O que me incomodou foi a forma “rechonchuda” de Olivia ser considerada como um dos meios de fazer dela alguém vulgar, além de o fato de o duque de Sconce achá-la bonita ter a ver com a ideia de “os homens na verdade gostam de mulheres assim”. Tanto Georgie quanto Olivia deveriam ser apresentadas como mulheres bonitas, cada uma a seu jeito e independentemente de seus corpos, e o parâmetro da beleza não deveria ser a preferência masculina — o corpo de nenhuma mulher está a serviço dos homens. Como mencionei, a autora coloca contrapontos a essas questões, e ela de fato insere uma ou outra fala que combatem essa ideia, mas não senti que foram suficientes, ao longo da história, para não passar tais incômodos.
Mesmo que eu tenha ficado incomodada com a maneira de como esses pontos foram trabalhados, a leitura de Esse Duque É Meu, em termos de narrativa e desenvolvimento de enredo, entrou para meu top 3 livros da série, ficando atrás apenas de Quando A Bela Domou a Fera e Um Beijo À Meia-Noite. Foi um livro gostoso e divertido de se ler, cujos aspectos positivos se sobressaíram. Vale dizer que, como alguém apaixonada pelo poder das palavras, adorei o fato da protagonista e do duque de Canterwick também serem interessados por elas. A passagem em que Olivia explica para o duque de Sconce, muito prático e objetivo, a importância e o alcance da linguagem poética foi uma das minhas favoritas de todo o livro.
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