Lasca

Lasca Vladímir Zazúbrin




Resenhas - Lasca


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Pandora 08/03/2021

Se vocês soubessem, camaradas... como eu quero viver!
“Virou-se. Viu, na madeira da porta, um monte de buraquinhos. E teve vontade de ser uma mosquinha pequena, bem pequena, de se esgueirar por um daqueles buracos e depois achar uma fresta e sair voando para a liberdade.” - pág. 20

Assim pensa um dos condenados ao fuzilamento, antes de sua execução pela Tcheká, uma das primeiras organizações de polícia secreta da URSS.

Neste livro, acompanhamos o chefe da Tcheká, Srúbov, no dia a dia de suas atribuições: conferir a papelada, analisar denúncias, promover interrogatórios, assinar sentenças de morte, acompanhar fuzilamentos. Firme, disciplinado e astuto, ele acredita não haver espaço para compaixão ou sentimentalismo em suas funções. Tudo o que faz é por ELA - a Revolução.

Numa narrativa metafórica e subjetiva, os questões que ocupam a mente de Srúbov vão sendo reveladas: a desaprovação de sua mulher pelo caráter de sua função, o desprezo dos que consideram os membros da Tcheká cidadãos de segunda categoria, sua determinação em eliminar os problemas com os meios que fossem necessários.

“Dizem: o inimigo está desarmado. Enquanto viver, ele não está desarmado. Sua arma principal é a cabeça.” - pág. 66

Aos poucos, porém, toda aquela carga pesa nos ombros de Srúbov.

Nota: Escrita em 1923, esta novela ficou no limbo até 1989, quando em razão da glásnost (processo de abertura política) de Gorbatchov e graças aos esforços da estudiosa de literatura Rimma Kolésnikova, ela foi finalmente publicada. Alguns anos depois, com o nome de O tchekista, foi um dos seis filmes de Novelas Russas - projeto de adaptação de obras literárias para o canal francês La Sept.

Zazúbrin foi fuzilado em 1937, acusado de pertencer a uma organização de terrorismo e sabotagem de direita. Fonte: posfácio de Irineu Franco Perpétuo.
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Fabio Di Pietro 17/05/2020

Inquietante
Com uma narração cheia de metáforas, pensamentos, divagações, o autor nós mostra o terror do órgão responsável por fuzilar os inúmeros da revolução, onde os fins justificam os meio. Mas mais do que isso, mostra a banalização do mal, como o responsável pelas sentenças de morte, acaba ficando insensível a tudo, mas perturbado ao mesmo tempo. Também, escancara a hipocrisia dos que apoiam o regime e desprezam os seus carrascos.
Natalia1175 17/05/2020minha estante
Com essa sua resenha ele já foi para a minha meta de leitura. Obrigada!




IvaldoRocha 27/01/2021

Não é para qualquer um, tem que ter estomago forte.
Um dos livros mais fortes e intensos que já li.
Se você já está familiarizado com a literatura russa, isso vai te ajudar, um pouco, mas não muito.
O primeiro capítulo já é um soco no estomago. Srúdov o chefe da Tcheca, órgão antecessor da KGB, e seus comandados vão começar a execução. O barulho dos caminhões no pátio, à espera da carga que deve ser retirada e levada para ser enterrada.
Srúdov, com seus assessores repassam mentalmente os passos que seguem o protocolo das execuções. E aí vem o desespero dos presos, o último fio de esperança que se vai, o imediatismo da morte, a humilhação e o desalento.
Srúdov acredita que a revolução é um organismo vivo, “Ela” tem sua vida própria e cobra a austeridade das autoridades e de toda a máquina pública. Srúdov conta com sua rede de informantes, sabe tudo que está acontecendo ao seu redor, quem está denunciando por motivos pessoais, quem está se vingando de alguém, quem está buscando algum ganho financeiro. Ele, porém, sabe separar o que é verdade e o que é intriga.
É uma pessoa respeitada, mas ao mesmo tempo vista com temor e certo desprezo pelas pessoas, sua mulher se queixa, sua mãe se desespera e ele tem que prover a “Ela” a revolução sempre mais, de si mesmo e de todos.
Não bastasse a história relatada pelo livro, escrito em 1923, ele, o livro, também tem sua história, rejeitado pela revista onde o próprio Zazúbrin era um dos responsáveis, é considerado impossível de ser publicado pelos próximos cinquenta anos. O livro desapareceu, haviam relatos de sua existência, mas ninguém tinha ideia do seu paradeiro. Com a “glásnot” (abertura) de Gorbatchov foi dado acesso a pesquisas nos arquivos da União Soviética e vários livros puderam ser localizados, entre eles Lasca. A ideia do título é o desespero de quem está se afogando e se agarra a uma lasca de madeira, na esperança de poder se salvar.
Edição primorosa da Carambaia, a um preço um tanto salgado, mas trata-se de uma edição limitada a 1000 exemplares numerados, espero que seja lançada na coleção Acervo da editora a um preço mais acessível.
Zazúbrin, foi considerado um expoente da literatura russa, protegido por Górky que o ajuda se estabelecer em Moscou. Com a morte de Górky e empoderamento de Stalin, Zazúbrin e sua esposa são presos e ele é fuzilado em 1937.
Não sei como citar isso, sem parecer mórbido, mas fico imaginando como teria sido para alguém que descreveu de uma maneira tão intensa as cenas de execução, vivenciar a sua. É claro que seu sofrimento é inimaginável, mas será que nessa hora o escritor ainda surgiu e pensou em algo mais, que poderia ter descrito ou alterado no livro? De repente ele se torna um de seus personagens.
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Val 20/09/2023

Lasca, um pedacinho da barbárie comunista.
A bestialidade assume o comando deste pouco conhecido romance desde seu início. Tudo é admirável em Lasca, de 1923, do siberiano Vladímir Zazúbrin, proibido por mais de setenta anos nos domínios russo e soviético e publicado há pouco no Brasil na Coleção Acervo: 21 da Editora Carambaia.
A linguagem extremamente dinâmica – por vezes figurativa -, narrativas rápidas, metáforas e linguagem cinematográfica surpreendem e envolvem-nos a partir da primeira página, quando deparamo-nos com a selvageria física e psicológica da cruel da Tcheká – a Comissão Extraordinária para Luta contra a Contrarrevolução e Sabotagem, polícia política antecessora da KGB comunista soviética.
Com a intenção de ser preciso na descrição das crueldades, Zazúbrin, também um prisioneiro dos bolcheviques na Sibéria, chega a ser exaustivo nas descrições de atrocidades sanguinolentas. E não podemos culpá-lo pelo exagero, pois se trata principalmente de uma denúncia histórica, além de uma novela política de época.
Nesta obra o fanático protagonista tem a Revolução Comunista como uma deusa e tudo faz em seu nome, em sua honra e é a ela submisso. Este é o seu destino. Sua vida. E assim Zazúbrin demonstra o ambiente, o comportamento, a dramaticidade de um negro período histórico onde não podemos chamar seus participantes de humanos. Nem de animais, pois nem estes, irracionais, jamais chegaram a tamanha carnificina. E o pior: sem remorsos. Um período que marcou de forma indelével a história e o povo russos.
Pelos meados da obra o médico, pai do protagonista e também vítima da barbárie, manda um recado: “... sua doença, a doença de todo o povo russo, indubitavelmente é curável e, com o tempo, desaparecerá sem deixar rastro, e para sempre. Para sempre, pois o organismo que padece dela produz anticorpos suficientes. Adeus.”. Mas, pelo que parece, essa moléstia – já modernizada - ainda circula no seio dos russos que detém o poder na atualidade.
Na sequência, Zazúbrin surpreende novamente e brinda-nos com uma pérola do carrasco chamando pela própria mãe, pedindo proteção após um pesadelo. E como tudo na vida e na história, basta um desvão involuntário e tudo muda, até radicalmente sem nosso controle. Como escreveu o editor Valerian Pravdúkhin, à época, “Aqui temos diante de nós um herói como a história da humanidade ainda não viu. Aqui há a tragédia interna desse herói, que não suportou sua façanha heroica” diante do colapso de Srúbov, que sucumbe diante da repressão que ele mesmo comanda na Tcheká.
E da mesma forma, após a glasnost soviética, milhares de publicações então proibidas e censuradas pelo “Terror Vermelho” vieram ao público. Iniciava-se assim, desta forma, pela escrita, a grande denúncia sobre os barbarismos impetrados pelos comunistas.
Ao condenar os nazistas pelos seis milhões do Holocausto judeu, a Humanidade se esquece dos 17 milhões de euroasiáticos exterminados pelos comunistas, de diversas formas bastante cruéis, a mando de Stalin, gerindo sua revolução operária a partir de 1917. Dentre esses episódios, sem dúvidas, destacam-se a transformação da Sibéria num grande açougue humano, e o chamado Holodomor, onde o regime totalitarista de Stalin assassinou 7,5 milhões de ucranianos apenas pela fome.
Um detalhe: seus parceiros de comando da revolução foram também por eles assassinados. Traídos, Lenin foi morto em 1924 e Trotsky – após fuga espetacular pela Ásia Central, Europa e América do Norte - foi assassinado no México em 1940.
Por seu pesado teor, este é um livro para ser lido apenas por quem se interessa pelo assunto e deseja conhecer em detalhes o que foi o grande açougue humano estabelecido no começo do século passado pelo regime totalitarista dos comunistas a comando de Stalin.
Valdemir Martins
20.09.2023


site: https://contracapaladob.blogspot.com/
Pedro 20/09/2023minha estante
Excelente resenha!
E o nosso presidente ainda diz que tem orgulho de ser comunista. O comunismo é a pior ideologia já criada na história da humanidade. É muito pior do que o nazismo, por exemplo. O resultado não me deixa mentir.


Val 28/09/2023minha estante
Concordo com você Pedro. Recomendo também a leitura de "O homem que amava os cachorros", do cubano Padura, sobre a caçada de Stalin ao dissidente Trotsky. Veja meu comentário em https://contracapaladob.blogspot.com/2018/11/o-comunismo-morreu-no-berco.html




Fabiana 09/05/2020

Considero um livro que merece uma releitura. Várias nuances, principalmente do personagem principal. Merece um estudo mais aprofundado desse período histórico. Bom livro e, com certeza, icônico pelo período no qual se passa.
Vilamarc 09/05/2020minha estante
Também gostei. Senti a dureza e a impessoalidade dos militantes atrozes. Mandei meu exemplar para Cassia.


Fabiana 10/05/2020minha estante
Eu gostei bastante tb. A forma como a violência influencia na relação cotidiana me impressionou. Por um lado o "costume" daquele que a pratica como algo rotineiro e, por outro, a recepção de quem espera por aquele (a quem "possivelmente" se ama) que tem por função de trabalho matar... Como se acostumar com uma vida assim? Como conversar sobre como foi o dia de ambos naturalmente?




Wellington 28/08/2021

Lasca – 7,0
Rude. Viscoso. Quebradiço. Essas são as palavras que me vêm à mente ao pensar sobre Lasca, livro de Zazúbrin – pseudônimo de um autor outrora admirado e depois fuzilado.

Gráfico e perturbador, trata do trabalho e cotidiano de Srúbov, líder da Tcheká, a polícia secreta que antecedeu a KGB. Responsável por incontáveis “processos” (que mais são condenações sumárias), preside sessões de fuzilamento; aplica todo o rigor da paranoia totalitarista que vê inimigos em todo lugar e tem o extermínio como única solução possível. Torna-se compreensível, portanto, que o protagonista seja alguém severamente perturbado. Srúbov se abstém da realidade, dissocia-se dela, tanto por estratégia de sobrevivência (também é humano, afinal) como por cinismo descarado. Os familiares dos presos lhe aparecem como cabeças de alfinete, olhados de cima pelo trono que ocupa. Os cadáveres, mera carne branca que pinga sangue. Sacerdotes, mulheres, idosos, seu próprio pai; nada importa, são todos inimigos da revolução. Todos merecem um tiro na nuca, nus, rumo à terra.

Se minhas palavras soam brutais ou insensíveis, imagine como é o livro. Como de costume, a revisão, posfácio e tradução da Carambaia são excelentes, mas é o projeto gráfico que se torna extraordinário: inclui no íntimo de cada página um spray de tinta que se avermelha e aumenta quanto mais próximo do fim você chega. Ao final, há tanto sangue que é impossível imaginar que se trata de uma página branca...

...assim como impossível imaginar que Srúbov tenha qualquer tipo de salvação. Sou esperançoso, acho que tem; a parte mais bela do livro é algo que ele faz, algo realmente bom. Respira-se um ar limpo, o sangue já foi enterrado; bolas de neve são lançadas, risadas surgem. O frio inverno russo se ilumina com o gesto de bondade de um tirano. Quedas posteriores podem acontecer, mas o milagre do pecador permanece.

A nota é meio baixa por um simples motivo: náusea. Entra-se no íntimo de Srúbov e ali há coisas podres. Não é uma leitura fácil. Importante dizer: não penso se tratar tanto de uma crítica a uma ideologia, mas ao modelo adotado, ao totalitarismo, à sanguinária máquina que tanto se alimentou. Não à toa, Lênin elogiou o autor. Stálin o matou. Se vejo exagero de Zazúbrin? Talvez. A forma da escrita murmura sombras do escritor. Mas, com essa escolha de temática e protagonista, não poderia ser diferente.

Para fãs de 1984, Metrópolis, Hannah Arendt e criminologia.

site: https://www.instagram.com/escritosdeicaro/
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Mel 14/02/2022

Lasca
História de Srúbov, um dos carrascos da tchecá, que acaba vítima dEla, a Revolução Russa. Excelente leitura!
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Paulo.Vitor 27/07/2023

"Aos vivos, é desagradável ficar perto de tumbas. Ela é alheia."
Lasca nos conta um período na vida de Andrei Srúbov, burocrata chefe da Tcheka (segurem a 5ª série por favor), que era uma polícia política do início da União Soviética, que ficou marcada pelas inúmeras execuções realizadas.
Como é de se imaginar, Srúbov começa a se questionar se está fazendo a coisa correta, e, acompanhamos esse processo mental do protagonista quanto a essas perguntas. Aqui, vemos a revolução tratada sempre com letra maiúscula, como se fosse uma entidade, quase uma Deusa, e que para ela, se pode tudo.
Creio que é aí que mora a reflexão sobre o livro. Ao final, nos posfácio vemos que o autor sempre se encontrava em dúvida quanto a sua posição política durante esse período, as vezes a favor, as vezes contra, e por meio do livro, creio que Zazúbrin coloca seus principais empecilhos para com a revolução, principalmente quanto a essa premissa de passar por cima de qualquer ética, moral, justiça ou escrúpulos em prol da revolução. Crítica essa, que diga-se de passagem, é totalmente válida e relevante.
Quanto a outros aspectos, como a ideia de igualdade, de melhora da vida dos menos favorecidos, não são nem citados durante o livro, e muito menos criticados, por isso creio que seja uma forma de crítica especifica (totalmente válida, e pertinente como já ressaltei) aos "meios" utilizados durante o período do livro, como é ressaltado no trecho "A humanidade futura recusará a 'felicidade' criada sobre o sangue das pessoas"
Gostei muito como o autor utiliza da psicologia das cores em diversas partes do livro, sugerindo até uma mudança de cor na bandeira da União Soviética.
É um livro de fácil e rápido leitura, acho totalmente válida a leitura, para qualquer pessoa, seja de esquerda ou direita, creio que há reflexões a se tirar.
Como é de praxe da coleção acervo da Carambaia, a diagramação é ótima, é um livro muito confortável de ler, o posfácio também é muito bom e o preço é totalmente acessível, creio que seja possível se ler em uma tarde.
Recomendo a leitura.
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