Val 20/09/2023
Lasca, um pedacinho da barbárie comunista.
A bestialidade assume o comando deste pouco conhecido romance desde seu início. Tudo é admirável em Lasca, de 1923, do siberiano Vladímir Zazúbrin, proibido por mais de setenta anos nos domínios russo e soviético e publicado há pouco no Brasil na Coleção Acervo: 21 da Editora Carambaia.
A linguagem extremamente dinâmica – por vezes figurativa -, narrativas rápidas, metáforas e linguagem cinematográfica surpreendem e envolvem-nos a partir da primeira página, quando deparamo-nos com a selvageria física e psicológica da cruel da Tcheká – a Comissão Extraordinária para Luta contra a Contrarrevolução e Sabotagem, polícia política antecessora da KGB comunista soviética.
Com a intenção de ser preciso na descrição das crueldades, Zazúbrin, também um prisioneiro dos bolcheviques na Sibéria, chega a ser exaustivo nas descrições de atrocidades sanguinolentas. E não podemos culpá-lo pelo exagero, pois se trata principalmente de uma denúncia histórica, além de uma novela política de época.
Nesta obra o fanático protagonista tem a Revolução Comunista como uma deusa e tudo faz em seu nome, em sua honra e é a ela submisso. Este é o seu destino. Sua vida. E assim Zazúbrin demonstra o ambiente, o comportamento, a dramaticidade de um negro período histórico onde não podemos chamar seus participantes de humanos. Nem de animais, pois nem estes, irracionais, jamais chegaram a tamanha carnificina. E o pior: sem remorsos. Um período que marcou de forma indelével a história e o povo russos.
Pelos meados da obra o médico, pai do protagonista e também vítima da barbárie, manda um recado: “... sua doença, a doença de todo o povo russo, indubitavelmente é curável e, com o tempo, desaparecerá sem deixar rastro, e para sempre. Para sempre, pois o organismo que padece dela produz anticorpos suficientes. Adeus.”. Mas, pelo que parece, essa moléstia – já modernizada - ainda circula no seio dos russos que detém o poder na atualidade.
Na sequência, Zazúbrin surpreende novamente e brinda-nos com uma pérola do carrasco chamando pela própria mãe, pedindo proteção após um pesadelo. E como tudo na vida e na história, basta um desvão involuntário e tudo muda, até radicalmente sem nosso controle. Como escreveu o editor Valerian Pravdúkhin, à época, “Aqui temos diante de nós um herói como a história da humanidade ainda não viu. Aqui há a tragédia interna desse herói, que não suportou sua façanha heroica” diante do colapso de Srúbov, que sucumbe diante da repressão que ele mesmo comanda na Tcheká.
E da mesma forma, após a glasnost soviética, milhares de publicações então proibidas e censuradas pelo “Terror Vermelho” vieram ao público. Iniciava-se assim, desta forma, pela escrita, a grande denúncia sobre os barbarismos impetrados pelos comunistas.
Ao condenar os nazistas pelos seis milhões do Holocausto judeu, a Humanidade se esquece dos 17 milhões de euroasiáticos exterminados pelos comunistas, de diversas formas bastante cruéis, a mando de Stalin, gerindo sua revolução operária a partir de 1917. Dentre esses episódios, sem dúvidas, destacam-se a transformação da Sibéria num grande açougue humano, e o chamado Holodomor, onde o regime totalitarista de Stalin assassinou 7,5 milhões de ucranianos apenas pela fome.
Um detalhe: seus parceiros de comando da revolução foram também por eles assassinados. Traídos, Lenin foi morto em 1924 e Trotsky – após fuga espetacular pela Ásia Central, Europa e América do Norte - foi assassinado no México em 1940.
Por seu pesado teor, este é um livro para ser lido apenas por quem se interessa pelo assunto e deseja conhecer em detalhes o que foi o grande açougue humano estabelecido no começo do século passado pelo regime totalitarista dos comunistas a comando de Stalin.
Valdemir Martins
20.09.2023
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