Pandora 03/06/2020Dorothy Hardesty Douglas, a Dolly, é uma mulher rica e poderosa, cujo pai foi presidente dos Estados Unidos quando ela era criança. Querendo minimizar a solidão e a infelicidade que via nela, Leonard Jakobs, um antigo funcionário da Casa Branca, construiu e lhe deu de presente uma miniatura perfeita da residência presidencial. Porém, achando-se velha aos 13 anos para brincar com casas de bonecas, ela desprezou o presente. Ironicamente, quando já era viúva e avó, ela resgatou a casa perdida entre as coisas do falecido pai e deu-a para a nora, uma famosa miniaturista, reformar.
Um dia, ela recebe um envelope com um misterioso conteúdo que a leva a Roger Tinker, e a partir daí a casa de bonecas passa a ser palco de coisas muito estranhas.
O livro é um pouco lento e confuso de início, por causa dos vários personagens que vão sendo meio que jogados na trama. Mas quando a autora começa a se concentrar por algum tempo em alguns deles e passamos a conhecê-los melhor, a narrativa se torna mais interessante.
Adoro casas de bonecas em miniaturas: é uma ?paixão de meia-idade?, como Nick, um diretor de museu, se refere ao hobby de Dolly. Então ao imaginar a Casa Branca toda decorada em miniatura já achei o máximo. Mas eu não estava preparada para o que acontece depois que é muito... bi-zar-ro e interessante.
Posso dizer que o ocorre após do desaparecimento de uma certa personagem é a melhor parte da narrativa. Os efeitos psicológicos numa pessoa que perde o controle sobre a própria vida são retratados de forma brilhante. Essa parte é cerca de 30% da história. Parece pouco, mas traz um peso significativo ao valor do livro.
Infelizmente, depois dessa passagem a autora parece se perder no caminho que traça rumo ao final, levando a um desfecho que, se não é de todo ruim, poderia ter um impacto muitíssimo melhor se as escolhas fossem outras.
De qualquer forma, o livro retrata, através da personagem Dolly, os perigos que advém das ações de uma pessoa manipuladora e psicopata que tem fama e dinheiro suficientes para agir além de todas as regras sem consequências. Some-se a isso um jovem cientista brilhante e ambicioso, porém imaturo e suscetível e a m* está feita.
Lembro que quando eu era criança ou pré-adolescente, não me lembro direito, assisti fascinada a um filme na TV em que a menina brincava com sua casa de bonecas em miniatura e enquanto ela mexia nos bonecos dentro da casa, na verdade estava manipulando a vida real de pessoas representadas por aqueles bonecos. Assustador! Mas para uma criança aquilo parecia tentador: decidir o que os adultos iam fazer e não o contrário.
Divagações à parte, a história das casas de bonecas em miniatura é interessante: a primeira de que se tem notícia foi construída em 1558, a mando de Albrecht V, duque da Baviera, para sua filha. Porém, em virtude da riqueza e do detalhamento da obra, o duque acabou por incluí-la entre a sua coleção de obras de arte.
No início, as casas em miniatura tinham dois propósitos: um deles era a exibição. Eram objetos para adultos. As primeiras, feitas na Alemanha, Holanda e Inglaterra estavam associadas à riqueza e eram símbolos de status, uma vez que serviam para exibir as caras miniaturas de seus donos. Na Holanda, elas eram chamadas de china cabinet (armário de porcelana), pois se abriam como um armário e podiam ser trancadas.
No século XVIII, surgiram as baby houses, que ao contrário das china cabinets - que expunham caras e raras miniaturas -, eram versões pequenas das casas de seus donos, com os mesmos objetos e mobília em tamanho diminuto.
O segundo propósito era o ensino. Aí se encaixam as Nuremberg kitchens (cozinhas de Nuremberg, assim chamadas porque a cidade era a principal produtora de brinquedos na Alemanha do século XIX). Era um cômodo só, a cozinha, com lareira ou fogão, vassouras, panelas e vários utensílios domésticos. As mães ensinavam a suas filhas, de uma forma a parecer divertida, como serem boas futuras donas de casa. Era comum que as mães passassem suas cozinhas para as filhas por várias gerações e em algumas famílias, a cozinha de Nuremberg fazia parte da decoração de Natal e era um brinquedo usado só nessa época. Mas as meninas continuavam ganhando itens para suas cozinhas em aniversários e outras ocasiões. Apesar de ter se popularizado no século XIX, a primeira Nuremberg kitchen teria sido dada em 1572 à Anna e Dorothea, filhas de Augustus, príncipe-eleitor da Saxônia.
Muito populares nos anos 70, mas depois um tanto esquecidas, há alguns anos o interesse por casas de bonecas e miniaturas voltou a crescer. De todos os tipos, tamanhos e propósitos, para crianças e adultos, para exibir ou brincar.
E mais uma curiosidade: a casa de bonecas mais famosa do mundo pode ser visitada no Castelo de Windsor, na Inglaterra. Projetada pelo arquiteto Sir Edwin Lutyens entre 1921 e 1924, envolveu 1.500 pessoas entre artistas e artesãos e foi dada à Rainha Mary de Teck, por seus esforços durante a 1ª Guerra Mundial. A rainha instituiu um regime de austeridade no palácio, com racionamento de alimentos, e visitou combatentes feridos e moribundos no hospital.
A casa tem 2m de altura e é uma réplica de uma residência de luxo estilo eduardiano com sala de estar, biblioteca, sala de jantar, quartos, banheiros, dependências de empregados, cozinha, adega e uma garagem com automóveis como Daimler e Rolls-Royce. Tem elevadores (que funcionam!), água corrente e eletricidade. Além do mobiliário luxuoso e enxoval completo, estão em exposição miniaturas de livros de escritores famosos como: Sir Arthur Conan Doyle, Rudyard Kipling, Thomas Hardy e Somerset Maugham.
Nota: Informações sobre casas de bonecas adquiridas na Wikipédia, The Atlantic, Londres para principiantes e Mental floss.