Carla.Parreira 02/03/2024
Terminei de ler o livro O palhaço e o psicanalista: como escutar os outros pode transformar vidas (Christian Dunker, Cláudio Thebas). Melhores trechos: "...O ganha-pão dos psicanalistas baseia-se no fato de que escuta não é apenas acolher incondicionalmente o que o paciente diz em toda a sua inteireza, apreciando-o como uma obra de arte, completa e organizada em si mesma, por suas próprias regras e razões. Escutar não é, definitivamente, funcionar como um espelho gratificante apreciando tudo que o outro diz, batendo palmas para qualquer manifestação e aceitando o que quer que seja, única e exclusivamente, porque procede daquela pessoa. Palhaços e psicanalistas são pagos para dizer o que as pessoas não querem ouvir, ainda que digam o contrário... Escutar com qualidade é algo que se aprende. Depende de alguma técnica e exercício, mas também, e principalmente, de abertura e experimentação. É uma arte difícil de dominar porque seus efeitos visíveis acontecem no outro em um tempo real e segundo as leis do improviso: o riso, a metamorfose, o humor, a mudança de atitude com relação a si mesmo, ao mundo e aos outros... Tiramos uma conclusão importante para a arte da escuta. Ela começa pela atitude de renunciar a exercer o poder que nos é atribuído. Para escutar, é preciso, como fazem o palhaço e o psicanalista, suspender o exercício de poder. Daí que a escuta seja uma atitude ética e política... O palhaço é um louco sábio que sabe que toda vida é uma loucura e tenta tirar as pessoas das suas próprias loucuras loucas... Nossa loucura é outro nome que damos para a vulnerabilidade, condição essencial e matéria prima de nosso trabalho, mas, também, meio e caminho para que algo diferente seja criado. Escutar o outro é concorrer para que sua loucura produza algo mais e além de mais loucura... Escutar é abrir-se para a experiência, acolhendo a vulnerabilidade e a contingência na qual ela nos coloca. Escutar é jogar, representar e viajar... Fazer da escuta uma 'experiência' é deixar que as palavras e os corpos nos cheguem, nos afetem, nos atravessem. Requer estarmos vulneráveis e dispostos para a aventura... Por isso a escuta também é a arte de nos tornarmos outros para nós mesmos, e deixar que o outro se torne um habitante de nós..."