Coisas de Mineira 10/02/2021
Não namore Rosa Santos é o primeiro romance da autora Nina Moreno, que escreve sobre mulheres latinas perseguindo seus sonhos, sendo publicado em 2019 pela editora Plataforma 21.
Vamos acompanhar três gerações de mulheres Santos: a avó, Milagros, que fugiu de Cuba grávida, e viu seu marido se perder na travessia; Liliana, que nasceu em Porto Coral, nos Estados Unidos, se apaixonou por um jovem pescador e, grávida, viu seu amor sendo tragado pelo mar; e Rosa, que cresceu entendendo que a vida amorosa de sua família acabou criando uma atmosfera amaldiçoada em torno de suas escolhas.
Rosa tem tanta consciência da maldição que a cerca que ficou completamente focada em seus estudos – é uma das melhores alunas, e acaba buscando por uma faculdade que lhe permita fazer uma parte de seus créditos na ilha de seus ancestrais… ela quer conhecer Cuba, e quem sabe entender a maldição, bem como descobrir suas raízes.
“Eu era uma coleção de hifens e palavras bilíngues. Sempre pega no meio. Duas escolas, duas línguas, dois países. Nunca muito certa ou suficiente para qualquer um. Meus sonhos foram financiados por um empréstimo feito muito antes de mim, e eu paguei com culpa e sucesso. Paguei de volta cuidando de um jardim cujas raízes não consegui alcançar.”
Mas contar à avó não é tarefa fácil. Principalmente quando uma incorporadora se interessa por Porto Coral, e a possibilidade da modificação desse canto latino nos Estados Unidos poderia diminuir ainda mais os laços com suas origens. Para evitar a incorporação, Rosa sugere que o festival da Primavera, que seria desmarcado por conta da notícia, reverta o lucro para o financiamento de bolsas universitárias, pois um programa de estudos poderia ser a ponte para que fossem certificados como distrito de Conservação.
É quando ela se reencontra com Alex, um colega que estava alguns anos à frente na escola, e que tinha partido para estudar. Rosa demora a conectar esse novo rapaz – musculoso e tatuado, com o carinha magricelo e calado que se sentava ao seu lado no intervalo da escola, mesmo porque ele tem cara de poucos amigos.
Assim, entre a difícil decisão de contar a avó que pretende voltar a Cuba, o retorno da mãe – que é uma artista celebrada, e, portanto, nômade, a possibilidade de perder Porto Coral, Rosa terá também de enfrentar sua maldição e, talvez, se permitir apaixonar por um garoto com um barco!
“Até a ideia de eu me aproximar do mar assustava os velhos pescadores e estressava meus amigos. Se eu entrasse no mar, talvez atraísse algo mais antigo e mais selvagem que eu. Algo que coletava ossos e dava a luz furacões. Eu estava destinada a encontrar tristeza lá também, assim como tinha ocorrido com minha mãe e minha abuela.”
Sabe aquele livro que cai na mão da gente, de uma forma completamente despretensiosa, e que surpreende? Foi assim com Não Namore Rosa Santos. As mulheres dessa família são maravilhosas, fortes, apaixonadas e apaixonantes.
A autora trouxe uma cidade portuária muito linda, e me vi passeando pela comunidade de Porto Coral, com pessoas que cresceram juntas e que são muito unidas. Mesmo o trio de senhores fofoqueiros e instagramers! A atmosfera latina é muito forte, e a cultura e os valores são muito bem representados.
Rosa é uma protagonista com muitas nuances, uma aluna aplicada, bem virginiana, daquelas que organizam listas e fazem planos minuciosos, mas que sente a dualidade de nacionalidade muito forte, por isso a necessidade de se reconectar com suas raízes. Sua avó é uma cubana apaixonada por seu país, mas viveu todas as dificuldades políticas que cercaram a ilha, e mesmo com uma abertura atual, não consegue se imaginar de volta. Liliana nasceu, acreditando ser a culpada pela fuga dos pais, e Rosa se vê na obrigação de construir um futuro que avó e mãe almejaram, como um prêmio para os sacrifícios das duas.
“É culpa da minha mãe. Ela se apaixonou por um rapaz com um barco e agora fica vagando sem rumo, constantemente chateando a mãe dela e me deixando a ver navios…”
Não namore Rosa Santos também tem romance. Não é a trama principal, mas é uma delícia de acompanhar. Alex é um garoto muito doce – apesar da carranca e das tatuagens, que se mostra presente nos momentos mais importantes. É um raio de luz em muitos momentos tristes.
“Ele tinha gosto de tangerina, e eu não conseguia mais me lembrar do sabor das minhas antigas balas favoritas de morango. A primavera havia se tornado verão antes da hora por causa de um beijo.”
Esses dois são perfeitos juntos! Alex consegue respeitar Rosa, sem pressioná-la. Entende e até incentiva Rosa, e ainda por cima é um excelente confeiteiro…
Mas o romance foi apenas uma parte de Não namore Rosa Santos. Mesmo com toda a fofura dos dois, o que me prendeu foi o relacionamento dessa família. Elas se amam, mas precisavam enterrar o passado e se perdoar. O amadurecimento, tanto de Rosa quanto da família, foi bem forte e cheio de lições. Família é um laço que nós carregamos para toda a vida, mesmo que esteja cheio de nós e partes frágeis!
Enfim, vale ressaltar que Não Namore Rosa Santos traz muito dos misticismos, das brujarias, ervas e sinos do vento, maldições e encantamentos que cativam também. É uma estória que me surpreendeu, mesmo com um final bem agridoce, mas daquelas experiências que a gente quer repetir mais uma vez!
Por: Maísa Caravalho
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