Cultura Consumo e Identidade

Cultura Consumo e Identidade Livia Barbosa...




Resenhas - Cultura Consumo e Identidade


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Tauana Mariana 19/08/2013

Consumo, cultura e identidade
Organizado por Lívia Barbosa e Colin Cambbell, o livro é uma coletânea de artigos diversos em seus objetos, mas ligados pelo interesse na relação entre a cultura, o consumo e a identidade.
Para quem inicia pesquisas sobre o consumo, assim como eu, o livro é essencial para mostrar-nos reflexões distintas e semelhantes, além de nos ofertar o conhecimento da bibliografia e dos autores referência nesse contexto. Assim, leio esse livro e aumento a minha lista de leituras, orientada por pesquisadores que já estão envolvidos e imbricados neste ramo de pesquisa.
Abaixo, segue a transcrição da íntegra de um breve resumo de cada artigo, disponibilizado por Lívia Barbosa na introdução da obra.

O livro:
Este livro é dividido em quatro partes distintas, mas integradas de forma a dotá-lo de um sentido didático que permite ao leitor usá-lo como uma introdução aos modernos estudos de consumo. Dirigi-se tanto ao público acadêmico das áreas das ciências sociais, da comunicação e da administração, quanto a um público mais profissional das áreas de marketing, propaganda e negócios.
A primeira parte tem um caráter mais conceitual e fornece um panorama geral da constituição dos estudos contemporâneos sobre o consumo e alguns de seus principais debates. As demais seguem uma tradição mais sociológica e etnográfica e se subdividem em três seções distintas, que tratam de temas relativos à sociedade de consumo e à relação entre cultura e consumo e entre identidade e consumo.
Colim Campbell, com o capítulo “Eu compro, logo sei que existo: as bases metafísicas do consumo moderno”, e Laura Graziela Figueiredo Gomes, com “Madame Bovary ou o consumo moderno como drama social”, são os autores que enriquecem a seção sobre a sociedade do consumo.
Campbell demonstra que, embora o consumo seja frequentemente visto como uma das atividades mais mundanas, para não dizer fúteis, da vida social, um olhar mais acurado pode indicar que se conecta com alguns dos elementos mais centrais da cultura e da sociedade contemporâneas, quais sejam as crenças acerca do que é a verdade e a realidade. E, em vez de aprofundar a crise de identidade, como afirmam vários autores, entre os quais Bauman, o consumo se apresenta como um caminho para solucioná-la. A ênfase moderna no individualismo e nas emoções, paralelamente à exposição das pessoas a uma vasta gama de produtos e serviços, permitem que os indivíduos descubram “quem são realmente” e, assim, enfrentam seus problemas de identidade. Campbell afirma ainda que o consumismo moderno implica a crença no poder dos sentimentos, quando profundamente vivenciados, de mudar o mundo. Isso representa uma visão de mundo verdadeiramente mágica, exemplificada fora da esfera do consumo no atual movimento Nova Era. O autor conclui observando que, com base nessa análise, seria justificado aprovar que a nossa não é apenas uma sociedade ou mesmo uma cultura do consumo, mas uma civilização do consumo.
O capítulo de Laura Graziela Gomes discute o personagem mais conhecido de Flaubert, madame Bovary, que nome ao seu romance mais famoso, considerado por vários críticos literários o primeiro romance verdadeiramente moderno. O interessante acerca desse livro é que Flaubert percebe, antes de qualquer cientista social, a importância do consumo para a subjetividade moderna, e descreve as principais características que adquire em nosso universo social. É justamente por essa acuidade literária do autor que Laura Gomes toma madame Bovary como o protótipo da consumidora moderna, e, através dela explicita os mecanismo e as lógicas que instruem o consumidor contemporâneo.
Ema Bovary vive imersa em um mundo interior de sonhos e fantasias, o “sonhar acordado”, que alimenta grande parte da interioridade do indivíduo moderno e lhe permite um prazer auto-elusivo. Ancorado em emoções e não nas sensações produzidas pelos sentidos. Seus sonhos e fantasias são alimentados pela novela romântica, outro fenômeno cultural crucial da modernidade, que Emma lê de forma incessante. Mergulhada nos prazeres do “sonhar acordada” e estimulada pela leitura dessas obras, nossa heroína acaba se afundando em dívidas e no adultério, ao tentar transformar “seu lar”, sua vida e ela mesma no material de seus sonhos. Nesse processo, que culmina com sua trágica morte, vários ingredientes-chave de uma nova forma de consumo que iria dominar o mundo moderno são analisados por Laura Gomes, entre eles a importância da vida interior como motor do desejo, a consequente insaciabilidade e o potencial de transformação que isso acarreta, e a inevitável discrepância entre a realidade exterior e o sonho interior. Em suma, a autora nos oferece uma visão “de dentro” de alguns dos mecanismos do consumo contemporâneo, utilizando-se das palavras, dos sentimentos e dos sonhos de Ema Bovary.
A seção sobre cultura e consumo é composta dos capítulos de Tom Fisher e Lívia Barbosa, que enfocam diretamente os esquemas representacionais e classificatórios das sociedades inglesa e brasileira subjacentes à dimensão material dos objetos e suas ressonâncias em nossas percepções e relações com o mundo das mercadorias.
O capítulo de Tom Fisher, “Plásticos: a cultura através das atitudes em relação aos materiais artificiais”, sobre o comportamento dos consumidores ingleses diante dos materiais plásticos, é um saudável contrapeso à excessiva concentração de estudos nas propriedades simbólicas dos objetos, estudos que têm predominado no âmbito da antropologia e da sociologia do consumo nos últimos anos. Salientando que as reações das pessoas às mercadorias são determinadas tanto por suas propriedades físicas quanto por suas associações simbólicas, Fisher emprega o conceito de affordance, de James Gibson, para analisar a complexa relação dos consumidores com os objetos. A pesquisa desse autor revela como a ambígua imagem do plástico (relacionada tanto a dimensão progressista positiva quanto a artificiais negativas) combina-se com um tipo de conhecimento popular derivado do contrato sensorial com o próprio material para se constituir em uma resposta complexa dos consumidores a esse material. Sua discussão do papel visceral que a noção de “nojo” desempenha nas reações e percepções das pessoas em relação ao plástico sinaliza para o fato, frequentemente esquecido, de que nossas relações com os bens e serviços são constituídas levando-se em conta mais do que o gosto e a distinção social. Na verdade, sua conclusão é que a atividade de consumir é tanto sensorial e emocional quanto intelectual, e que nossas relações com o mundo material deveriam ser apreendidas como um jogo entre aspectos físicos e simbólicos.
A ênfase de Tom Fisher no papel significativo que o nojo desempenha nas atitudes dos consumidores em relação ao plástico, juntamente com as percepções relativas ao conceito de “limpeza”, relaciona-se de forma direta e complementar com o capítulo de Lívia Barbosa, “cultura, consumo e identidade: limpeza e poluição na sociedade brasileira contemporânea”, sobre as práticas de higiene e de lavagem de roupas de mulheres brasileiras de diferentes segmentos sociais. Essa pesquisa revelou a existência de um esquema classificatório que se caracteriza pela combinação de princípios pragmáticos poluidores orientando a seleção de roupas a serem lavadas juntas, separadas, à mão, na lavanderia, etc. Já as práticas de lavagem e a escolha de sabão estruturam-se a partir de uma “lógica do concreto”, em que as propriedades sensorialmente perceptíveis dos produtos sugerem os elementos a serem privilegiados. O intrigante trabalho de Lívia Barbosa revela ainda como o conceito de limpeza se combina com critérios estéticos e morais e desempenha papel bastante distinto nas identidades femininas das mulheres dos diferentes segmentos sociais. No caso das mulheres dos segmentos menos privilegiados do Nordeste, sua presença acrescenta elementos positivos a como essas mulheres se veem e são vistas pela comunidade em que se encontram. No caso dos segmentos médios urbanos do eixo Rio-São Paulo, a presença da higiene e da limpeza nada acrescenta que valorize as mulheres perante elas mesmas e seu grupo, embora qualquer indício de ausência de limpeza cause um grande estrago em suas respectivas identidades femininas. Mesmo partindo da análise de práticas cotidianas e prosaicas, Lívia Barbosa levanta questões interessantes tanto sobre o conceito de poluição nas sociedades complexas quanto acerca de informações relacionadas à natureza fragmentada dessas sociedades. Mas talvez o mais interessante para os estudos de consumo seja a relação clara que a autora estabelece entre o sistema classificatório de uma sociedade e suas relações com as práticas de consumo.
A quarta e última parte deste livro trata das relações entre consumo e identidade, um dos temas centrais nos estudos contemporâneos sobre o assunto. Nessa parte, pode-se perceber o consumo em uma de suas concepções atuais e positivas, ou seja, como construtor de algo e, não mais, como exaustão e esgotamento, como no caso de Ema Bovary. Maria Isabel Mendes de Almeida, em “Nada além da epiderme: a performance romântica da tatuagem” e Paulo Gabriel Hilu da Rocha Pinto, em “Mercados de devoção: consumo e identidades religiosas nos santuários de peregrinação xiita na Síria” tratam do tema de forma inovadora […] pp. 13-16.

BARBOSA, Lívia; CAMPBELL, Colin. Cultura, consumo e identidade. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2006.
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