Flávia Menezes 17/03/2022
AS CRIANÇAS DA CAIXA DE PAVLOV.
?O Instituto?, de Stephen King, publicado em 2019, é uma história que traz a discussão sobre a ética profissional por trás dos experimentos científicos realizados em humanos. Um assunto que já havia sido abordado antes pelo autor, em 1980, em seu livro ?A Incendiária?, que preciso ressaltar, realizado de forma brilhante, e que neste se aprofunda ainda mais, trazendo a questão do quanto o poder e o controle, alimentados pela ganância daqueles que governam, em situações como essa ficam muito acima dos direitos humanos.
Os experimentos descritos pelo King em seu livro tem como base o Behaviorismo, o que me lembrou muito a minha época da faculdade, quando li sobre experimentos behavioristas em que, em algumas pesquisas, as pessoas estudadas enfiaram tubos pela garganta, onde eram inseridos líquidos, sem qualquer sedação.
Outra lembrança que me veio à mente durante a leitura foi da série ?The Right Stuff?, baseada em fatos reais descritos no livro homônimo de 1979 de Tom Wolfe, e lançada em 2020 pela Disney+ em conjunto com a National Geographic, desenvolvida por Mark Lafferty, e tendo como um dos produtores executivos o nome de Leonardo DiCaprio.
No seriado, o governo americano, visando vencer a corrida espacial contra a antiga União Soviética, lança o programa espacial Mercury, onde 11 pilotos americanos foram escolhidos pela recém-desenvolvida NASA, para ir para o espaço. Na série, eles trouxeram tanto a questão dos excessivos testes médicos e físicos que foram realizados, tal como acontecia na história do King, bem como discutiram muito sobre os problemas que envolvem testes experimentais.
A cena em que o piloto Alan Shepard entra na cápsula onde ficará durante o seu lançamento para o espaço, e descobre que todo o controle será remoto, é de gelar a espinha. Já pensou em como esses homens foram cobaias, podendo morrer unicamente para que seu país vencesse uma corrida especial? O que aliás aconteceu, resultando na morte de Gus Grissom (algo que infelizmente não pode ser explorado nessa série, já que ela foi cancelada em sua primeira temporada, porém que pode ser acompanhada no seriado ?The Astronauts Wives Club?).
Confesso que ler a parte dos experimentos foi a mais difícil para mim. Além de toda a ausência de humanidade e da crueldade com a qual eram feitos nas crianças (o que, como diria Christian Grey, é meu limite rígido!), ainda houve a questão de que, para mim, eles pareciam muito sem propósito, e não traziam muitos resultados. O que me fazia pensar: então por que insistir em algo que não tem resultados nenhum? Confesso que isso me deixou um pouco entediada (além de chocada!) durante a leitura. Mas é algo muito particular.
Porém, importante mesmo é ressaltar que a narrativa do King nesse livro é absurdamente rica em detalhes, e traz essa ousadia dos livros mais recentes dele, em começar a história em um ponto, mudar para outro, e depois intercalar uma história com a outra. Eu acho isso totalmente fascinante, nos tirando daquele lugar comum das histórias lineares e excessivamente cronológicas.
Além disso, King nunca peca quanto ao desenvolvimento dos diálogos e personagens. São todos tão fascinantes, e com vilões tão cruéis, que você continua a história porque já está totalmente apegado(a) aos personagens.
Aliás, sobre essa questão dos personagens, eu preciso dizer, me encanta a forma como o King tem de ressaltar o quanto o ser humano não foi criado para ser sozinho. O quanto seus personagens são mais fortes quando descobrem seus pares, e toda a lealdade entre eles é estabelecida. Simplesmente não há como terminar sem ter uma lágrima descendo pelo rosto, depois de todo o afeto que criamos com seus personagens, e do quanto também nos tornamos parte dessa ?família?.
Mas esse é o King, e o Mestre não erra nunca. E a cada livro que eu leio, me sinto mais presa nessa rede do Kingverso, fazendo parte da história desses personagens, como se fossem da minha família. Afinal, como posso continuar me sentindo sozinha, quando juntos realmente somos muito mais fortes? Ah, King! Quem acha que sua escrita é só sobre terror, não sabe o quanto você é mesmo um Mestre das Relações!