Naiana 20/04/2022
Malandragem, fofoca e/"ou" livro histórico
Acho que foi o livro mais divertido de Jorge Amado que já li. Em Capitão de Longo Curso Jorge já tinha se desencantado com o partido comunista e passa para uma fase de retratar mais a população brasileira em sua essência, e sinceramente, esse livro é a tradução exata disso, se não for da população brasileira com um todo, ao menos a de Salvador.
O livro é ambientado em sua maior parte no subúrbio de Salvador, em Periperi, que na época retratada era o local para onde ia os aposentados da cidade, para "aproveitar" a velhice, se tornando um local agitado apenas nos períodos de férias, quando os jovens enchiam as casas de veraneio fechadas e traziam escândalos que rendiam prosa para todo o período de paradeiro.
Quem conta a estória é um narrador que diz buscar A Completa Verdade sobre as Discutidas Aventuras do Comandante Vasco Moscoso de Aragão (subtítulo da obra) e com isso escrever um livro para concorrer ao concurso do Arquivo Público, e em vários momentos a estória do Comandante Vasco Moscoso de Aragão se mistura com a sua própria estória. O narrador não é nem um pouco confiável, a verdade dos fatos varia para ele de acordo com suas afinidades e conveniências, e a estória do Comandante que no decorrer do livro se torna duvidosa, principalmente quando seu antagonista, Chico Pacheco, após ir embora de Periperi por se sentir humilhado e substituído pelo Comandante, que considera um canastrão, retorna coma informação e provas de que a vida do comandante seria muito diferente do que ele sempre pintara. O Comandante Vasco Moscoso de Aragão se sentindo desmoralizado pensa em ir embora, quando um chamado para socorrer um navio que perdera seu comandante e precisa seguir viagem até Belém do Pará, e sua grande oportunidade de provar quem Chico Pacheco foi quem inventara calúnias sobre ele à população de Periperi.
Com muitos causos, fofocas, tretas, desvios morais e éticos, acompanhamos a vida do Comandante Vasco Moscoso de Aragão, da comunidade de Periperi, e do nosso narrador, "nada tendencioso", mas que traz esse questionamento, que traduz e resume a dualidade do texto: "[...] Está a verdade naquilo que sucede todos os dias, nos quotidianos acontecimentos, na mesquinhez e chatice da vida da imensa maioria dos homens ou reside a verdade no sonho que nos é dado sonhar para fugir de nossa triste condição? [...]".
Enfim, é uma leitura bem divertida, com alguns trechos parados, de fato, mas que não comprometem o livro, só sinto que seja tão pouco falada e conhecida, só esbarrei nele por ter adquirido a coleção de minha avó, apesar de que, como estou gostando muito de passear pelas obras de Jorge, provavelmente nos esbarraríamos em algum momento de qualquer forma. E que venha o próximo livro.