Queria Estar Lendo 05/04/2017
Resenha: Império de Tempestades
Eu talvez nunca tenha capacidade física e emocional de me expressar a respeito de Império de Tempestades, mas farei o meu melhor. Porque o que a Sarah J. Maas fez nesse livro pode ser resumido com a frase: "enfiou uma faca no seu coração e girou a lâmina em 360 graus. E você a agradeceu por isso.".
A guerra se aproxima. Aelin precisa de aliados, de um exército. Precisa provar-se a Rainha que foi Prometida. Ao lado dos guerreiros feéricos, ela parte em uma jornada para encontrar as chaves de Wyrd restantes, artefatos mágicos capazes de derrotar o senhor das trevas que iniciou todo aquele conflito. Em meio a tantos personagens e arcos impactantes, é chegada a hora de marchar para os campos de batalha.
"— Prefiro morrer amanhã a viver mil anos com a vergonha de um covarde."
Pra começar vamos falar da polêmica: divisão do livro. Extremamente desnecessária. Juntos, os dois tomos dão o tamanho exato de Rainha das Sombras. Não comprei os livros físicos e não vou comprar até a Galera Record lançar uma edição única. A quebra de clima quando o tomo 1 acaba é bastante desapontadora, e eu quebraria a janela de alguém jogando o livro na direção dela caso não tivesse o tomo 2 em mãos imediatamente após a leitura do primeiro. Portanto, de novo, foi ofensivo da parte da Galera Record dividir um livro que não precisava, em nada, dessa divisão. Motivo pelo qual eu fiz uma resenha só. E se eles ousarem fazer isso com Corte de Asas e Ruína a chapa vai ferver.
Sarah J. Maas entrega o que eu considero um dos melhores livros de fantasia dos últimos tempos. Repleto de intrigas políticas, traições e estratégias surpreendentes, Império de Tempestades foi o tipo de obra que te impossibilita de viver sem que você termine a sua leitura. É uma história completa, com todo tipo de emoção. Vai rir, chorar e se desesperar durante as suas quase 700 páginas completas, e vai agradecer aos céus por ter conhecido essa saga.
"Destruir um símbolo pode destruir a determinação dos homens tanto quanto sangue derramado."
Falando a respeito dos personagens, talvez essa resenha se torne uma Bíblia infinita, porque há tanta riqueza e desenvolvimento bem escritos que eu nem mesmo sei desenvolver um texto sobre cada uma das figuras compondo essa série fantástica.
Aelin, a protagonista, se encontrou como comandante. Ela é uma rainha em toda e qualquer nuance de sua personalidade, e o modo como a Sarah te entrega isso nas páginas do livro é de arrepiar. Aelin é uma líder nata. Está na sua magia, na sua voz, no seu sangue. Ela é a Herdeira do Fogo, a Rainha que foi Prometida, uma feérica selvagem e destemida ansiosa para cumprir o que prometeu a si mesma e a seu povo: a liberdade. Sua luta contra um mal crescente é de uma complexidade quase psicológica. Toda a pressão e a tensão que Aelin enfrenta durante o decorrer do livro te prendem a essa jornada de sacrifícios, a essa certeza de que o caminho de uma monarca é trilhado através de escolhas arriscadas e perdas irreparáveis.
Aelin está disposta a tudo para salvar o seu reino e as pessoas que vivem nele, principalmente, até mesmo colocar-se como escudo para qualquer perigo que se estenda sobre eles. Ela é o tipo de personagem intensa, bem construída e que te arrebata desde o primeiro instante. Ainda aquela garota marrenta dos primeiros livros, pouco inclinada a acatar ordens, disposta a discutir e provocar, mas também uma mulher furiosa, impiedosa e cheia de poder. Coração de Fogo, de fato, como as lendas correndo soltas pelos reinos já cantam.
"Ali estava ela, coroada em chama, um bastião contra a noite reunida."
Ao lado dela, seja em presença e em apoio, Rowan também se sobressai como um dos melhores deste livro. Ele é tipo de fidelidade e coragem, um bravo guerreiro dobrado pelo amor incondicional. O que existe entre ele e a Aelin é arrebatador e inestimável. Os dois são um inteiro, se pertencem e se reverenciam. O quanto o Rowan está disposto a arriscar pela Aelin é uma coisa que me deixa rolando no chão, real oficial. Ele é todo inquebrável, arisco e um feérico imortal selvagem e temido por todos que o conhecem, mas também é um coração amoroso e um sorriso único para a sua Coração de Fogo. O amor entre eles é tão puro e importante para a história, e tudo o que eles fazem em prol desse amor é o que te deixa mais quebrada.
"O feérico fazia a magia de Aelin cantar."
São comandantes, líderes, e em um mundo perfeito poderiam se abraçar e constituir uma família e serem felizes pelo tempo que fosse. Mas estão em guerra, o seu mundo colapsa, e esse não é o cenário para a felicidade plena e completa. Eles a encontram mesmo nos lugares mais sombrios, mas ainda há muito a ser enfrentado antes da ansiada paz. Rowan, em sua posição de guerreiro solitário, sem terras e sem muito a dar para Aelin além da devoção, tem uma das melhores cenas do livro justamente por causa disso - o tipo de cena que te faz urrar.
"Tudo que Rowan tinha a oferecer à rainha eram a força da espada, a grandeza da magia e a lealdade do coração. Tais coisas não venciam guerras."
Aedion e Lysandra compõe outra parte da corte da Herdeira de Fogo, uma corte que se forma aos poucos, o tipo que poderia reconstruir o mundo. Aedion, sempre fiel e dedicado à prima, tem grandes momentos emocionais no decorrer do livro. Seu passado retorna para que ele o confronte, e há muito ressentimento no general para se deixar levar pelo perdão. Ao lado de Lysandra, Aedion tem seus momentos mais humanos e frágeis - e é aí que o ship se torna uma coisa desestruturadora. Eles se entendem pela solidão, pelo deslocamento quando se encontram no mundo, e por ambos terem perdido tanto durante a vida. Aedion ainda é destemor, mas também deixa escapar seus momentos de fragilidade, de desespero, momentos que mostram um guerreiro ansioso pela vitória, mas temeroso quanto aos custos dela. Especialmente com a campanha de Aelin para reunir aliados; guiar uma guerra não é nada fácil, e ela é uma rainha jovem, na qual poucos lordes acreditam. Aedion é seu apoio, mas também mantém questionamentos pertinentes, coisas que, mais para o fim do livro, entregam respostas surpreendentes. Anota o que eu tô dizendo: a cena na praia. Você vai cair de joelhos no chão; chorando.
"— Se perdermos esta guerra, a escuridão reinará para sempre."
Lysandra, por outro lado, tem uma participação muito mais física e emocional do que verbal dentro do grupo acompanhando a rainha. Ela é marcada pelos horrores de seu passado, por sacrifícios e por traumas que dificilmente se dissiparão de sua memória, mas é uma mulher tão incrível e poderosa, uma metamorfa única e impressionante. Ao lado de Aelin, Lysandra entrega à obra as melhores cenas de ação e de irmandade, sempre disposta a tudo para ajudar sua comandante. A perspectiva que fica é que Lysandra está se acostumando com um novo mundo, com sua liberdade, e se adaptando a isso. Se adaptando aos sorrisos e ao apoio e a entregar seu coração para grandes causas.
Agora vamos falar sobre o meu arco e minha personagem favoritos: Manon Bico de Ferro e sua jornada de redenção. A anti-heroína medonha, macabra e perturbadora nunca perde a pose de bruxa má, e por isso tem o melhor arco do livro. Manon é muito de frieza, ao mesmo tempo em que começa a responder seu coração. Uma comandante destemida que faz tudo por suas guerreiras, inclusive sacrifícios irreparáveis. Perceba como todo mundo nesta birosca adora fazer sacrifícios e me pergunte se eu tenho coração pra isso: não tenho. Determinado momento a coloca ao lado da corte de Aelin, e a aliança entre ela e a Coração de Fogo é uma coisa poderosíssima, girl power, destruidora, pense em todos os termos que puder para designar essa união.
"E Manon entendeu naquele momento que havia forças maiores que a obediência, e a disciplina, e a brutalidade. Entendeu que não nascera sem alma; não nascera sem coração."
Manon não vê Aelin como sua comandante - porque a bruxa não se curva diante de ninguém - mas uma igual, e por isso a relação das duas é impactante. O fato de a Bico de Ferro aceitar um caminho que não o da escuridão, aquele trilhado por ela até aquele momento, mostra um crescimento de personagem absurdo. Suas interações com os outros membros da corte de Aelin são incríveis, e o desenvolvimento das suas emoções e da maneira com que ela encara a ideia de um novo mundo, um livre da opressão e da crueldade, arrancam todas as suas lágrimas.
E é aí que entra o melhor ship dessa birosca: Dorian x Manon. Sim, eu, que a queria com a Elide, fui dobrada a amar Doranon como se não houvesse amanhã. Eu culpo Sarah J. Maas por todos os meus problemas emocionais e psicológicos.
"Seis voavam para o castelo de Dorian, para a torre. Para o rei. Dorian daria a elas um rei."
Dorian acabou de se livrar da escuridão para ver-se subjugado por ela. Por circunstâncias externas, ele acaba se juntando à campanha de Aelin, um rei afastado de seu trono, e representa a racionalidade e polidez que tanto faltam nos feéricos e insira-aqui-outros-seres-fantásticos-que-integram-esse-grupo. Dorian foi criado para a política, para a guerra, para o comando. Ele foi disciplinado para reinar, para liderar. Seu contato com a própria magia foi de surpresa e de choque e ela é a coisa mais selvagem e descontrolada nele. A jornada de Dorian é quase de redescobrimento, investigando o mundo e entendendo como lutar para protegê-lo. Ao lado de Aelin, ele tem suas melhores interações, mas ao lado de Manon ele é quase uma dinamite.
"E com todo o desejo do rei de sentir seu gosto, ao abrir a boca para ele, Manon encontrou um gosto de mar, como uma manhã de inverno, algo tão estranho, mas familiar, que por fim aquele gemido lhe foi arrancado do interior."
A química entre eles salta das páginas do livro, grita que eles são um casal poderoso, que se entendem, indiferente ao fato de terem vindo de berços tão distantes. Um rei e uma bruxa, ambos tocados pela escuridão, que descobrem um pouco de luz quando estão um com o outro - e que aceitam a penumbra tão bem quanto a temem.
Por fim, o último arco de vital importância para a construção de toda a trama é a da Elide e do Lorcan. A menina que escapou do covil das bruxas, salva por Manon, e o semi-feérico em meio a uma caçada para impressionar sua rainha cruel. Os caminhos deles se cruzam e se entrelaçam e você se vê imediatamente implorando para que a Sarah tenha piedade. O que ela não faz. Não que isso tire alguma estrelinha do ship; esse OTP tem todas.
"Por quanto tempo durará uma única chama contra a escuridão que se reúne?"
Lorcan é um imortal sombrio, abençoado pelo deus da morte, guiado pela escuridão e empoderado por ela. Elide é uma mortal que viu muito do horror e da crueldade no mundo e se cansou de curvar-se diante disso. Ambos muito teimosos e arredios. Eles formam uma aliança para chegar a seus destinos, e essa aliança trilha uma união que nenhum deles esperava existir. Lorcan vê em Elide o tipo de coração e coragem que a própria não parece enxergar, uma jovem mulher destemida que poderia enfrentar toda a escuridão do mundo se quisesse, porque teria bravura para tal. Ao mesmo tempo em que ela vê no semi-feérico um homem maculado pelo medo e pela obediência, um guerreiro que se curvou demais diante de poderes opressores, que aceitou isso como a única alternativa entregue pelo mundo. Ambos enxergam novas possibilidades no outro, e por isso o casal é tão apaixonante. Eles são o recomeço um do outro.
O modo como a Sarah interliga todas essas histórias, todos os traumas e passados, cada coadjuvante que surge com o passar das páginas - oi Gavriel e Fenrys que me fizeram chorar em tantos momentos; oi As Treze, obedientes e fiéis guerreiras do clã de Manon; oi Chaol que sumiu por um motivo maravilhoso, mas estará em meu coração até o seu retorno.
É um livro genial, bem orquestrado e que vai te deixar de queixo caído em diversos momentos. As tramas políticas, as alianças, o fato de a Sarah resgatar tanta coisa dos volumes anteriores - e principalmente dos contos de A Lâmina da Assassina - é tudo tão bem explicado que, quando as respostas chegam, você se joga no chão e chora. Tudo esteve ali o tempo todo, ela só escondeu até ser necessário falar sobre isso. E a dor; ah, céus, quanta dor. Quanto sofrimento. Desde Princesa Mecânica que eu não me acabava de chorar como fiz com o fim desse livro.
"Aelin não era uma salvadora atrás da qual se amontoar, mas um cataclismo a ser sobrevivido."
As batalhas, as intrigas e traições são de tirar o fôlego. Inimigos se aproximam de todos os cantos, e o cerco se fecha sobre a herdeira de Terrasen. Nossa Aelin Coração de Fogo precisa se provar para seus súditos e para si mesma não apenas como comandante, mas como rainha; como uma pessoa disposta a entregar seu coração pelo bem daquilo que rege sua coroa.
"Uma corte que não apenas mudaria o mundo. Mas que recomeçaria o mundo. Uma corte que poderia conquistar aquele mundo... e qualquer outro que desejasse."
Império de Tempestades foi, sem sombra de dúvidas, uma das coisas mais impressionantes que já li. A magia e a guerra se interligam e formam uma obra que te prende na cadeira e te instiga a entregar todo o seu coração para cada um desses personagens. As melhores obras de fantasia são aquelas que te levam para dentro desse mundo mágico, mas que te conquistam pela humanidade e pela força de seus personagens. Na luta contra a escuridão que ameaça seu mundo, Coração de Fogo e seus aliados fazem parte do que eu considero uma das melhores obras de fantasia contemporânea que o mundo já viu.