Gustota 06/07/2014Bolaño em pílulasO homônimo do Chapolin tem um talento inigualável para escrever calhamaços incrivelmente fáceis de ler, mas neste "Putas Assassinas", ele consegue um estilo enxuto daquilo que estamos acostumados a ver em "2666", "Detetives Selvagens" e "Noturno no Chile": autobiografia confundida com fina ficção, personagens alemães excêntricos,a femme fatale latina, referências ambíguas a intelectuais latinos e muitas e muitas biografias de poetas que talvez ou nunca tenham existido.
Nas esquinas dos contos, podemos ver um Roberto Bolaño jovem e tímido arrumando encrenca em acapulco com seu priápico pai em Últimos Entardeceres da Terra"; um Bolaño exilado perdido entre os chilenos de esquerda em "Dias de 1978"; a incrível (talvez verídica?) história de um amigo fotógrafo enfrentando um dilema moral na Índia em "O Olho Silva"; um curioso conto de formação que mostra não só uma constrangedora paixão pelo poeta mainstream Pablo Neruda, mas também seu rompimento com o mestre Jodorowski pelo mesmo motivo em "Carnê de Baile".
No entanto, é quando a imaginação de Bolaño flui que eu acho que sua escrita se agiganta como poucos ou nenhum escritor latino consegue alcançar. No conto de humor negro "O Retorno" sobre um sujeito que morre na França e trava uma inusitada amizade com o maior estilista do país, que por acaso também é o necrófilo que abusa de seu morto corpo.
No conto "Buba", meu favorito, vemos uma curiosa relação de amizade e ocultismo entre jogadores chilenos e um africano no Barcelona, e um estranho pacto mágico que consegue tirá-los da mediocridade. Aqui a sensibilidade com que os personagens são tratados é fora de série, e tenho certeza que a Ivete Sangalo participa deste conto sob o pseudônimo de Liza.
Para quem gosta do "Detetives Selvagens", há também o conto "Fotos", capítulo perdido do livro com uma reflexão do poeta peregrino Artur Belano a respeito de um livro de fotos de poetas.
Para os iniciados no autor, espere um estilo único, espere por reviravoltas pouco usuais e em momentos inesperados e espere também por finais anti-clímax, mas que não poderiam ser mais pró-climax, pois deixam sempre o gancho em aberto para a mente fechar nossas próprias interpretações.