tbbrgs 25/08/2022
Três Guinéus: como evitar a guerra?
Virginia Woolf está entre as escritoras que mais tenho lido nos últimos anos: esse é o sexto livro que leio dela, apesar de ser o primeiro que decido resenhar. A escrita dela nunca antes tinha me deixado na mão, sempre a considerei fluida, fossem ensaios ou ficção. Mas, pela primeira vez, me vi diante de uma leitura densa.
Em Três Guinéus, Virginia tentou estabelecer uma conexão entre o patriarcado e o militarismo e, para isso, criou dois personagens: uma missivista e um advogado. Esse advogado teria enviado, três anos antes, uma carta à missivista pedindo sua ajuda num esforço para evitar a guerra. Assim, surgiu Três Guinéus, que consiste na carta em resposta dessa missivista ao advogado. No entanto, o percurso argumentativo criado por Virginia é difícil de ser seguido, pois essa carta é dividida em três partes e as duas primeiras partes não respondem diretamente a pergunta do advogado sobre como evitar a guerra, mas traçam um caminho em direção a outras cartas, aludidas ou citadas, que também pedem a ajuda da missivista para duas outras causas (contribuir para o fundo de reconstrução de uma faculdade para mulheres e para que as filhas dos homens instruídos consigam ingressar em profissões e ganhar a própria vida). A partir da argumentação, nessas duas primeiras partes da carta, do motivo pelo qual ambas as causas deveriam ser apoiadas (sob certas condições), Virginia Woolf começa então a esclarecer a questão inicial referente à guerra, na terceira e última parte.
Em suas explicações, ela usa e abusa de casos de pessoas reais e da vida cotidiana, retirando excertos de jornais diários, citações de biografias, fatos da história, dados e estatísticas de livros de referência. Particularmente, foi isso o que tornou a leitura ainda mais difícil: a quantidade de notas no fim do livro explicando o contexto de cada caso, de cada vida, de cada fato e acontecimento era surpreendente.
Dessa maneira, o principal argumento de que Virginia se utiliza é que as mulheres precisam de independência econômica e liberdade intelectual, argumento que, segundo ela, está ligado ao esforço de como evitar a guerra, pois a guerra é um produto do homem. Assim, se as mulheres tiverem oportunidades para ascender através das camadas sociais por meio de sua independência econômica e liberdades intelectuais e, consequentemente, se tornarem as novas líderes da sociedade, elas poderão gerir, então, uma nova, reformulada e pacífica sociedade.
Analisando esse argumento sob uma ótica contemporânea, eu diria que discordo de Virginia, pois não creio que a guerra é um instinto masculino. Não creio em instintos de gênero. Acredito que os homens e as mulheres nascem e logo lhes são determinados papéis de gênero a cumprir. Os homens devem ser durões, não podem chorar e acham que têm esse tal de instinto bélico, um instinto arraigado à masculinidade tradicional que lhes diz que devem ir à guerra, defender a pátria, lutar com bravura e blablabla. Mas, na verdade, eles devem começar a criar uma masculinidade desconstruída, esquecer os instintos de guerra e pensar em como seria uma sociedade livre das armas e das disputas, prezando pela paz. Virginia Woolf, obviamente, não pensa sobre esse aspecto. A crítica sobre os papéis de gênero com relação à masculinidade bélica está ainda muito à frente de seu tempo. Eu quis apenas apimentar a discussão. Fim da resenha.