Carta sobre o Humanismo

Carta sobre o Humanismo Martin Heidegger




Resenhas - Carta sobre o Humanismo


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Thara 09/01/2010

Duas Pérolas
* O homem não é o senhor do ente. O homem é o pastor do ser. Neste "menos" o homem nada perde, mas ganha, porquanto atinge a verdade do ser. Ele ganha a essencial pobreza do pastor cuja dignidade reside no fato de ter sido chamado pelo próprio ser, para guardar a sua verdade.

* A linguagem é assim a linguagem do ser, como as nuvens são as nuvens do céu. Com seu dizer, o pensar abre sulcos invisíveis na linguagem. Eles são mais invisíveis do que os sulcos que o camponês, a passo lento, abre pelo campo.
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hmorita 24/11/2015

Tradução
Não vou julgar a qualidade do texto de Heidegger, mas sim desta edição brasileira de baixa qualidade. A tradução é ruim e a diagramação barata, em geral o livro é de má qualidade.
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Erick 02/04/2021

crítica às essências
A questão do Humanismo perpassou toda a história da filosofia ocidental. Podemos remontar aos préssocráticos a busca insaciável pela sabedoria e aos gregos do período clássico a investigação metódica do conhecimento como caminho para o bem viver dos homens. Tal caracterização coloca o problema humano no centro da questão. Pensadores como Heráclito e Parmênides aspiravam compreender o princípio da natureza e em nenhum momento postulavam o homem como um fim em si mesmo. O desejo deles era, a partir de sua condição humana, compreender a natureza e o funcionamento das coisas como totalidade cósmica, quer dizer, sua cosmovisão em nenhum momento postulava a condição humana como distinta do destino da natureza. É no período clássico, com Platão e Aristóteles, que há tal ruptura entre homem e natureza para conceder ao homem a condição de ente privilegiado, ou seja, a questão da finitude transforma se em lógica, ética e física. Quer dizer, um pensamento propriamente técnico.
Iremos, portanto, partir desses dois nomes para compreender o que significa o humanismo, onde Heidegger situará sua intervenção. A posição platônica, através do personagem Protágoras, consiste em afirmar que "o homem é a medida de todas as coisas", ou seja, tudo deve regular-se tendo o homem como centro e modelo; tal posição constitui-se como uma antropologia idealista. A posição de Aristóteles é um humanismo propriamente metafísico - a metafísica da substância -, por atribuir uma essência fixa ao ser do homem e que, independentemente das singularidades históricas, culturais, de classe, espaço, tempo etc, manifestar-se-á e lhe concederá uma natureza humana - a famosa definição Aristotélica através do gênero e da diferença específica: homem racional. Todos os humanismos que Heidegger descreve em seu texto se filiam ou a Platão ou a Aristóteles. Os romanos, o cristianismo e o marxismo ligam-se a Platão, por terem uma ideia de como o homem deveria ser, contudo, desprezando como ele efetivamente é. Já o humanismo renascentista estaria vinculado a uma metafísica substancialista, que impingem uma essência determinada ao ser do homem, ora a virtude, ora a liberdade.
No século XX, o tema assistiu disputas teóricas ferrenhas. Diversos pensadores interviram no debate sobre a legitimidade da definição de homem e sua posição em relação ao mundo. Tal problemática nos impõe barreiras que nos remetem a uma certa cautela na cristalização da situação.
O cuidado que temos que ter ao falar de humanismo consiste em não confundir metafísica e epistemologia, uma vez que o discurso metafísico tenta ser, desde Aristóteles, a ciência do ser enquanto tal, da maneira mais geral, enquanto a epistemologia tenta definir paradigmas válidos para o pensar, a teoria do conhecimento propriamente falando. Ocorre que para se fazer metafísica, quer dizer, para determinar as estruturas determinantes do ser, é necessário partir de algum conhecimento. Não nos iludamos, nem os pressocráticos partiram do nada. Com isso, toda metafísica está inundada de epistemologia. Por outro lado, sempre que empreendemos uma compreensão sobre nosso conhecimento, as formas e métodos de recortar o real para objetificá-lo, pressupomos uma metafísica, ou seja, partimos de uma pré-compreensão do ser, ou como diria Heidegger, ‘a verdade do ser está no fundamento da pesquisa sobre o ser dos entes’. Se não nos detivermos por um momento nessa distinção, consideraremos certos métodos científicos, no caso, o paradigma válido atualmente nas ciências positivas, como o único que nos possibilita acesso a verdade do ser – a ideia fixa heideggeriana.
Dessa forma, a questão da validade do conhecimento humano o coloca no epicentro de tal problemática. O exercício teórico do pensamento torna-se central. É necessário, assim como Heidegger, empreender um pensamento radical para penetrar na questão despido de pressupostos. No entanto, o próprio Heidegger parte de um solo bastante problemático para sua empreitada, a saber, a filosofia transcendental, não um transcendentalismo do tipo kantiano, que promove uma cisão entre objetos do conhecimento e a coisa-em-si incognoscível. Mas um transcendentalismo acercado da problemática medievalista, como "ens transcendentalis". Tal questão nos põe no seio do humanismo antropológico, por ter a constante necessidade de definir o ser do homem.
Ora, a problemática heideggeriana é, desde o "Ser e Tempo" desvencilhar-se de tal tradição humanista que promoveu o esquecimento do ser através do entulhamento de metafísicas. Na sua Correspondência com Hannah Arendt, dizia ele: "Tudo gira em torno do dasein e procuro alcançá-lo através de um abandono das noções de sujeito e de consciência"(p.74). Ambas noções - sujeito e consciência - caracterizam o pensar moderno vinculado a representação de um objeto do mundo por
um sujeito consciente de si; logo, pressupõem uma ruptura impensável em pensamentos monistas, como o oriental ou o de Espinosa. O esforço dessa monumental obra que é "Ser e Tempo" é justamente encontrar uma definição de ser que não transubstancie-se na definição de seus entes, quer dizer, o ser dos entes nada que tem que ver com o ser em si mesmo; existe uma compreensão pré-ontológica que distingue tal dimensão da esfera ôntica, propriamente dos entes, "o que é". Diz ele: "o ser dos entes não 'é' em si mesmo um outro ente(...) Ser está naquilo que é e como é, na realidade, no ser simplesmente dado, no teor e recurso, no valor e validade, na presença, no 'há'"(p.32). Heidegger peca ao usar o termo 'simplesmente', pois passará o resto de sua vida tentando demonstrar tal simplicidade, mudará sua compreensão de verdade, e tal dado nunca se dá tão simplesmente como imaginara.
Ao abordar a questão do humanismo, ele é enfático que o termo é desnecessário e constitui uma "desgraça". Todas implicações de compreender o homem como ente privilegiado estão presentes no texto de Heidegger. Por isso, sua recusa de filiação ao humanismo. Entretanto, o humanismo que ele recusa não constitui o humanismo em geral, mas apenas o humanismo platônico, aquele que tem o "homem como medida de todas as coisas". Heidegger certamente não tem o homem como medida de todas as coisas, mesmo se realizarmos uma aproximação que o texto permite entre o homem e o dasein. Mas em nenhum momento ele recusa a ideia de essência humana. Tal pressuposto constitui um humanismo de filiação aristotélica, que permeou toda a Escolástica, talvez o período histórico que mais influenciou o pensamento heideggeriano. Diz Heidegger nesta "Carta sobre o Humanismo": "humanismo é isto: meditar e cuidar para que o homem seja humano e não desumano, inumano, isto é, situado fora de sua essência. Entretanto, em que consiste a humanidade do homem? Ela repousa na sua essência" (p.17). Entendemos que o essencialismo é o primado de todo humanismo.
Segundo Heidegger, "a humanitas do homo humanus é determinada a partir do ponto de vista de uma interpretação fixa de natureza, da história, do mundo e do fundamento do mundo, isto é, do ponto de vista do ente na sua totalidade" (p.20). Essa condenação da permanência no ser dos
entes talvez seja o cerne da crítica heideggeriana a todo tipo de humanismo. Contudo, sua ideia de ser ex-tático como ponto fixo da essência do homem e processo de exteriorizar-se em direção ao ser permanece essencialista. Diz ele: "O estar postado na clareira do ser é o que eu chamo a ex-sistência(...) A ex-sistência assim entendida não é apenas o fundamento da possibilidade da razão, ratio, mas é aquilo em que a essência do homem conserva a origem de sua determinação"( p.24). O humanismo de Heidegger consiste em afirmar que apenas o homem pode projetar-se para escutar o ser; isso não impede que outros entes 'sejam', no sentido ontológico. A metafísica humanista começa quando concedemos uma dignidade especial para o homem enquanto ente privilegiado. A distinção fundamental da metafísica aristotélica entre ato e potência está operando sub-repticiamente no humanismo heideggeriano: na essência do homem -sua potência - está contido tudo aquilo que ele pode ser. Ele não pode ser nada mais do que sua essência o permite. Para ele a essência do homem é sua ex-sistência, e a existência é realidade efetiva do real, o ato. Diz Heidegger: "Este 'ser' do aí, e somente ele, possui o traço fundamental da ex-sistência, isto é, significa o traço fundamental da in-sistência ex-tática na verdade do ser" (p.26).
Mais à frente "estamos nós no caminho certo para a essência do homem quando distinguimos o homem, e enquanto o distinguimos como ser vivo, entre outros, da planta, do animal e de Deus?" Aqui ele flerta com certo pensamento oriental, com Espinosa e certamente com os pressocráticos Heráclito e Parmênides. Como já indicamos, tal distinção – ruptura ôntica - é condição de possibilidade para o advento do humanismo, a compreensão do homem como ente privilegiado, a finitude sobrepondo-se a infinitude.
De fato, como já apontamos, deve ser feita a distinção entre metafísica e epistemologia para se alcançar um conhecimento efetivo da realidade humana. No entanto, percebemos que no interior da tradição metafísica, só duas posições a se alinhar - e que estão pressupostas nas atitudes epistemológicas: a posição da transcendência e a posição da imanência. Heidegger nitidamente postula-se no time da transcendência. Diz ele: “o ser é transcendente como tal”. A própria problemática que define o horizonte da questão do humanismo reduz-se a essa cisão, que é a conexão do finito com o infinito. A primeira postura entende o ser como transcendental e, em decorrência disso, o conhecimento que podemos ter dele é bastante inadequado. Já na tradição imanente, que caracterizaremos também como materialista, o ser é imanente, o que significa que o infinito tem precedência e o finito apenas o expressa de um modo determinado.
Um nome central disso que caracterizamos como tradição da imanência é Nietzsche – outra influência central para Heidegger. Diz Nietzsche: "Heráclito terá sempre razão quanto a sua afirmação de que o ser é uma ficção vazia. O mundo aparente é o único que existe: o mundo verdadeiro é apenas uma adição enganosa". Interpretamos tal 'adição enganosa' como simples transcendência baseada numa busca pela Ideia, pelo Paraíso, pela coisa-em-si, pela verdade verificável (neutra), pela Substância, pela liberdade humana ou o sentido do Ser.
Portanto, a noção de transcendental - em oposição à imanência materialista - é o centro ontológico de toda tradição idealista, assim como seu suporte epistemológico e político, a ideia de representação. O entrelaçamento dessas duas noções, a de transcendência e a de representação, nos encaminha para uma metafísica da substância e promove o que Nietzsche chama em "Crepúsculo dos Ídolos" de fetichismo da linguagem, a crença desmedida na linguagem humana como transubstanciação subjetiva da racionalidade que nos garante como suportes de predicados (objetos) de qualidade distintas do sujeito, que desemboca na ideia de 'Eu-substância', oposto a um mundo objetivado, do qual esse ego não se percebe como parte, mas como uma totalidade ensimesmada, uma mônada ideológica - o homo economicus, o indivíduo-consumidor, o cientista positivista, o cristão e o humanista.
Diz Nietzsche: "Caímos num fetichismo grosseiro quando tomamos consciência dos pressupostos fundamentais da metafísica da linguagem, ou seja, da razão. Tal fetichismo consiste propriamente nessa busca demasiada pelo ser, pela essência das coisas tal como a definição do homem como gênero e diferença específica. Essa tradição materialista (ou metafísica imanente) nega toda ideia do ser como causa (seja como causa da transcendência, seja como causa da representação epistêmica). À maneira do existencialismo, diríamos que o homem não tem um ser, mas apenas existência histórica, corporal, psíquica e instintiva. Ao dizer que “a linguagem é a morada do ser”, Heidegger atribui a essa capacidade de articular som e sentido uma primazia na descoberta do sentido do ser, algo que poderia ser não só mostrado, como falado. E essa capacidade linguística é onde Heidegger aposta todas suas fichas, quando desde “O Crepúsculo dos Ídolos” sabemos que “não podemos nos afastar de Deus porque ainda acreditamos na gramática”.
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