Naiana 03/03/2022
De Drácula a Louis
Acho que poucos que me conhecem sabem que tive uma adolescência gótica lendo contos de terror que recebia por e-mail. Nunca gostei de filmes de terror, mas a literatura com criaturas sobrenaturais, vampiros, lobisomens, bruxas, múmias, sempre me atraiu. Anne Rice é um nome que me atraiu já tem um tempo, é referência em histórias vampirescas, meu primeiro contato com ela foi com o filme baseado neste livro, que gostei bastante e apesar de ter assistido há alguns anos, só agora tive a oportunidade de ler o livro (e reassistir o filme para relembrar o que tinha visto, é, o livro é melhor, para variar por ser mais complexo e trazer outras fatos suprimidos para que a história coubesse no filme, empresas de televisão e streaming, fica a dica, daria para fazer uma bela série com as obras de Rice, conteúdo para anos de série tem...).
De Drácula a Louis
Dois vampiros mais distintos é bem difícil de se ver. Bran Stocker se tornou minha paixão, com ele escreve bem, como a leitura de sua oba dar sede de saber o que vem a seguir, Drácula, um dos maiores, se não o maior de todos os vampiros, vampiro visceral, com sede de sangue e de beleza, astuto, a essência do mal, pai de todos os vampiros. Louis por sua vez se torna um vampiro melancólico, que busca respostas para sua existência, o porque de sua vida, qual a essência do bem e do mal. A leitura também é distinta, um te leva no ritmo acelerado, e o outro pede mais calma, pede que analise junto com Louis suas perguntas e respostas quando as adquire. Dois vampiros que amei conhecer e passear por suas páginas.
Entrevista com o Vampiro conta a história de Louis, como ele conheceu Lestat, se tornou vampiro e como essa nova condição de vida o afetou tão profundamente. A diferença de personalidade entre Lestat e Louis é o atrito que une e afasta os dois personagens, Louis a princípio ligado a Lestat pela necessidade de conhecimento, que nunca chega de fato por essa vias, raros momentos em que consegue extrair alguma informação que lhe seja útil; enquanto Lestat é atraído por Louis pelo seu estado de espírito inconformista, assim pela necessidade que tem de manter certo padrão de vida que não consegue sozinho, já que Louis dono de terras e escravos antes de se tonar vampiro, sabe como administrar e fazer dinheiro de forma que Lestat se quer imagina.
No livro somos apresentados a família humana de ambos também, Lestat com seu pai cego e inválido, Louis em sua mãe, irmã e irmão, irmão este que foi o motivo de toda a sua melancolia, de seu abandono da vida humana, por querer se punir e se livrar da culpa, mas essas condições são inerentes de sua essência e jamais o abandonam, aliás, creio que se pode dizer que a culpa e o autoflagelo é o que torna Louis quem é, um vampiro capaz de sobreviver aos séculos, pois "não sente" necessidade de companhia, apenas de autopunição e solidão. Essas aspas são pela contradição, pois a todo momento ele tenta se ligar a algo, ao sentimento de amor, de companheirismo, de bondade, mas a todo momento se vê cercado pela maldade que o faz sentir culpa e buscar se isolar.
A complexidade da obra e deste vampiro é fascinante, e a entrada de Cláudia nesse "círculo familiar" vampiresco traz mais complexidade ainda a narrativa, principalmente em questões morais, já que Cláudia é uma eterna criança, ao mesmo tempo filha, companheira e amante de Louis, algo que ainda tento não me incomodar tanto, já que teoricamente ela se tornou uma mulher no corpo de uma criança, no passar dos anos, mas a sensação de pedofilia ainda é um soco no estômago difícil de digerir completamente, até porque não tenho muita certeza se essa variação e filha para amante de fato ocorreu com o passar dos anos ou meio que sempre existiu. Há ainda o lado sexual relacionado ao ato de sugar o sangue de suas vítimas, em alguns momentos o livro me deu a impressão de que os vampiros não sentem necessidades sexuais, exceto ao morderem duas vítimas, o ato de sugá-las seria o verdadeiro ato de paixão, arremetendo ao sexo, e o amor muitas vezes mencionado na história seria como a atração entre dois seres, seja pelo intelecto, seja por suas condições. Cláudia e Louis sentem amor um pelo outro, às vezes mesclado pelo ódio, principalmente pela condição em que foram criados e a necessidade que Louis tinha em se prender a algo e proteger a menina de Lestat. Seu amor por Lestat não fora tão forte, extinguiu rápido e ficou a co-dependência segurando-os, mas ainda assim, havia uma atração criada pelo vínculo de criador e criatura e pelo espírito nostálgico de Louis. E há o amor mencionado posteriormente entre Louis e Armand, o dito mais velho vampiro conhecido naquela época, mas este amor provém da necessidade de Louis por conhecimento e em Armand pela necessidade em permanecer jovem, em criar um vínculo com o tempo em que estava inserido, muito distante do tempo em que fora criado.
Ao se separarem de Lestat, Louis e Cláudia vão a Europa e por lá buscam encontrar outros de sua espécie, busca infrutífera por muito tempo, perigosa demais também, já que os dois nada sabia sobre ser vampiros além da necessidade de beber sangue para sobreviver. Apenas em Paris conseguiram encontrar um bando de vampiros e é ali que Armand se apresenta aos dois e somos encaminhados ao fim da história.
Ah, quase esqueci de falar de mais um personagem importante, o repórter a quem Louis conta a sua história, sempre muito presente no início do livro, interagindo com Louis no decorrer de sua narrativa, seja questionando ou fazendo com que Louis questionasse sua falta de questionamento. Senti um pouco a sua falta na terceira parte do livro, ele meio que se cala e Louis vira o narrador absoluto da história, e só retorna na quarta parte do livro. Essa ausência me fez falta, a interação dos dois era boa e as vezes trazia um pouco de fôlego a momentos tensos ou com questionamentos de natureza moral.
Enfim, foi uma boa leitura, houve alguns momentos parados, mas não ao ponto de diminuir a obra. Aguardando ansiosamente pela leitura de Vampiro Lestat e as demais obras vampirescas da Anne Rice,.