Segundo o Caldas Aulete, o Aurélio, o Houaiss e outros bons dicionários afins, migalha, substantivo feminino, é “uma quantidade ínfima de qualquer coisa”, i.e., “restos, sobras, sobejos de coisas sem importância, desnecessárias ou desprezíveis, insignificantes, supérfluas”, em suma, “coisa nenhuma, nada”. Não poderia haver outro título mais apropriado para este novo livro de poemas de André Luiz Pinto – aliás, nona obra de uma carreira que teve início há 20 anos, com o surpreendente Flor à margem (1999) –, pois é a consolidação de um projeto poético minimalista, relativamente recente, nascido com Mas valia (2016) e Nós, os dinossauros (2016), livros escritos e lançados de modo quase simultâneo pelo autor.
Nesse sentido, Migalha forma uma trilogia com esses dois volumes anteriores, já que tem em comum com eles o desejo de dizer muito, em poucas palavras, acerca daquilo que quase ninguém percebe (“O essencial é invisível aos olhos”, alerta Saint Exupéry, via Mario Quintana). Mas vai mais longe que seus antecessores: ao dizê-lo, o faz de maneira ainda mais vertical, mais profunda. É a radicalização de um processo, em sua plenitude. Porque o poeta, esse migalheiro, vem, ao menos desde o início da modernidade, se ocupando de coisas aparentemente sem importância, bagatelas, essas “coisas findas,/ muito mais que lindas” (cf. Drummond), para eternizá-las no poema e revelar a todos as potencialidades das “grandezas do ínfimo” (na sábia expressão de Manoel de Barros). - Ricardo Vieira Lima
Poemas, poesias