A primeira lembrança de Jeannette Walls dá o tom de O castelo de vidro. Aos três anos, preparava cachorro-quente no fogão. Estava sozinha, de pé em uma cadeira. Quando se virou para oferecer uma salsicha ao vira-lata da família, sentiu um calor no lado direito do corpo. As chamas avançaram por seu vestido até o rosto; sua mãe a socorreu e a levou para o hospital, de onde sairia três semanas depois, retirada à força por um pai bêbado que considerava a atenção médica desnecessária.
Cenas como essa se acumulam neste livro de memórias, que vendeu mais de 2,7 milhões de cópias. Criada de forma nada convencional, a escritora cresceu em meio a constantes mudanças de cidade, enfrentou a fome e aprendeu tudo do jeito mais difícil. "Se não quiser afundar, melhor descobrir como nadar", disse-lhe seu pai, observando-a no meio da piscina.
De forma surpreendente, Walls narra suas desventuras sem julgamento: não demoniza seus pais nem os enaltece. Apenas relata suas memórias, a partir do ponto de vista ingênuo de uma criança. Fez, talvez, o que certa vez lhe disse sua mãe: "Seu pai e eu somos quem somos. Aceite isso".
Uirá Machado, editor da Ilustríssima
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