O Ceticismo Filosófico

O Ceticismo Filosófico André Verdan


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O Ceticismo Filosófico





Graças às obras do médico grego Sexto Empírico, que deixou uma exposição sistemática e completa da filosofia cética, esta nos é tão ou melhor conhecida que a maior parte das outras doutrinas da Antigüidade. Contudo, a difusão, o renome e a influência do ceticismo nunca se igualaram às do platonismo, do aristotelismo, do epicurismo ou do estoicismo. Isto se deve principalmente a duas causas. Em primeiro lugar devido ao fato de que esta atitude filosófica, que implica um questionamento radical do conhecimento sensível e racional, não poderia ser compatível com uma tendência profunda do homem: a que o leva a buscar, pela especulação, verdades incontestáveis e solidamente estabelecidas para fazer delas o fundamento, o apoio de sua existência. O espírito humano dificilmente consente em reconhecer seus limites: não é de sua natureza confessar-se incapaz de chegar a certezas absolutas. Por detrás da diversidade cambiante dos fenômenos, ou seja, das aparências, o pensamento ocidental procurou, durante séculos, apreender o que e. Definir o Ser-em-si, o Bem por excelência foi, durante muito tempo, o fim supremo de suas investigações. Ora, o ceticismo não cessou de recusar à inteligência humana a capacidade de conceber estes princípios. Como reconhecer a importância de uma “doutrina” que contesta o valor de todo empreendimento filosófico tradicional?
Além disso, os próprios termos “ceticismo” e “cético” foram, sobretudo a partir do século XVIII, objeto de um mal-entendido que contribuiu, em certa medida, para fazer conhecer mal o sentido e o alcance verdadeiros do “pirronismo” grego. Estas palavras foram usadas — e o são ainda — para designar a atitude própria de Voltaire, que consiste em colocar em dúvida as afirmações da fé religiosa, submetendo-as à crítica da razão ou da experiência sensível. As noções de ceticismo e de incredulidade foram, às vezes, identificadas e até confundidas. Esquecia-se, assim, que em sua essência o ceticismo se coloca em oposição a todo otimismo racionalista, uma vez que, longe de aceitar a razão como critério infalível de verdade, ele se esforça, ao contrário, para desvelar seus limites, preconizando ainda a submissão às crenças e às tradições religiosas.
Relegado, mal-conhecido, o ceticismo representa às vezes o parente pobre entre as doutrinas filosóficas que a Antigüidade nos legou. Contudo, o pensamento dos tempos modernos lhe deve mais do que comumente se pensa. No século XVI ele aparece a Montaigne como uma filosofia plena de sábia modéstia, capaz de rebater as pretensões e o orgulho da razão. E compreende-se que os humanistas cristãos, seguidos por Pascal no século XVII, tenham considerado o pirronismo não uma doutrina pérfida, mas um auxiliar da fé, próprio para revelar a insuficiência de nossas “luzes naturais” e tornar evidente a necessidade, para o homem, de procurar a Verdade por outras vias que não as da razão.
Se é verdade, além disso, que a dúvida radical de Descartes, por mais provisória que seja, constitui o ponto de partida de toda a filosofia moderna, estamos no direito de considerar o ceticismo — filosofia da dúvida por excelência — um fenômeno mais importante que uma etapa transitória e definitivamente ultrapassada do pensamento antigo. De Berkeley a Husserl, passando por Hume e Kant, toda uma corrente filosófica — ao mesmo tempo oriunda de Descartes e em reação contra seu sistema — se inscreve, em vários aspectos, no prolongamento da reflexão iniciada pelos céticos gregos.

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