Este livro é um esforço de compreensão do Rap enquanto um Gênero do Discurso que abriu novas perspectivas de uso da linguagem em nosso país, à partir de um olhar bakhtiniano: explorando as raízes sócio-históricas e o contexto político-cultural, buscamos localizar as bases originais que constituíram o alicerce sobre o qual os rappers teceram o seus discursos ritmados em forma de rimas. As “palavras dos manos” foram o resultado prático do amadurecimento político e artístico de uma juventude que crescia entre as gangues e o movimento negro e esta pesquisa foi desenvolvida por alguém que observa e fala à partir de dentro do movimento.
Adriano Bueno é rapper (MC) e formou-se em Pedagogia pela Unicamp em 2010. Atualmente é trabalhador da Secretaria de Cultura de Campinas.
Por Adriano Bueno
O presente estudo visa lançar luz sobre o processo de formação do rap brasileiro como um gênero discursivo, conforme o conceito estabelecido por Mikhail Mikhailovitch Bakhtin, apresentando o discurso das gangues de rua e do movimento negro como suas raízes sócio-históricas fundamentais. Constatamos, em primeiro lugar, como a fala da gangue marcou profundamente o rap de Los Angeles e a fala do movimento negro, por sua vez, definiu o rap de Nova Iorque, apontando como o grupo de rap brasileiro Racionais MC’s formulou uma síntese destes gêneros, o que, somado a uma cultura de classe mais sólida proposta pela esquerda marxista brasileira, resultou numa proposição que garantiu características singulares ao rap nacional.
Num segundo momento, indicamos como o signo verbal do rap – a palavra – refletiu: a luta política travada pelos rappers do ponto de vista de classe, raça e até mesmo gênero, em menor grau; as transformações que o rap sofreu ao assumir uma postura hegemonicamente militante em substituição ao caráter festivo inicial; além da constituição de uma identidade, marcada por sua posição territorial mediada pela atuação do “outro”. Por fim, concluímos apontando como DJs e MCs manipularam os signos para comporem novas estratégias militantes para a superação do racismo, o que resultou na legitimação social de expressões anteriormente estigmatizadas, ligadas à cultura da periferia dos grandes centros urbanos brasileiros.