Marc 15/07/2020
Há certos lançamentos, tanto em livros, quadrinhos ou cinema, que mais valem para fazermos um diagnóstico do público do que pela história em si. Considero esse o caso dessa história aqui. De um lado temos Geoff Johns e Gary Frank, dois nomes de peso e toda a boa vontade da editora com os criadores (boa vontade que só quer vendas maiores, claro); mas de outro temos o fantasma daquela que muitos consideram a maior hq de todos os tempos, Watchmen.
Assim, tinha até uma certa expectativa, porque só de ter coragem de lidar com esses personagens, teríamos que dar um desconto para a dupla. A história começa muito bem, me parece. Tentando mostrar os impactos da ação de Veidt e como, alguns anos depois, tudo foi se assentando. Mas lamento que essa direção não foi seguida e entramos numa masturbação insólita sobre os personagens da DC, principalmente o Superman, a quem, supostamente, tentou-se fazer uma homenagem. Francamente, se eu fosse homenageado dessa forma, passaria a olhar com desconfiança para meus “admiradores”.
Não é uma história complexa, mas complicada, confusa. E é complicada porque o autor não sabia o que fazer, mas precisava fazer muitas coisas ao mesmo tempo, como homenagear o superman, watchmen e manter o espírito de uma história com grandes revelações finais, que fazem o leitor não acreditar no que está acontecendo. Mas acho que falha em tudo isso. Quando o grande plano é finalmente revelado, parei de ler e dei umas boas risadas com sua inocência. Parecia algo planejado pelo frajola ou willie coyote... Ou, quem sabe, o cérebro da dupla de ratos, tentando sempre conquistar o mundo todas as noites. Mas, sem o humor desses queridos personagens.
Querer manter uma simetria com watchmen em todos os capítulos fez muito mal ao andamento dessa história, porque a forma aprisionou o conteúdo, fazendo com que ele às vezes corresse e outras levasse longas páginas de tolices sem sentido e sem importância alguma para a história. O resultado, devemos dizer, começa muito bom, mas acaba muito mal. Não sou um dos defensores de Alan Moore, o considero um hipócrita, metido em uma porção de coisas que abomino e desejo manter distantes da minha vida, mas tenho que reconhecer que ele é capacitado e planejou sua história com muito sucesso. Claro que há erros, como o de se deixar levar pelo pessimismo, imaginando que apenas uma solução violenta e não pensada poderia resolver uma situação difícil. E há o conceito de que a sociedade precisa ser consertada, o que faz com que Alan Moore, no fundo, absolva Veidt e o considere o verdadeiro herói de sua série, mesmo tendo sacrificado alguns milhões de pessoas (nada demais, sabemos, quem corrobora dessa ideologia sempre pensa assim). Eu até diria, Alan Moore não absolve, mas se identifica com Veidt, o que faz com que sua história perca muitas possibilidades no final.
Digo isso tudo para mostrar que embora não aconteça esse erro banal nessa história, por outro lado o personagem não foi tão bem desenvolvido, de modo que seu grande plano parece mais uma piada, ou um devaneio de adolescente, do que um plano de um vilão verdadeiro e poderoso. Ah, falando em poderes, se a história é uma grande homenagem a superman, ele deveria ter feito algo mais do que simplesmente ficar falando o tempo todo. A sensação que tive, pensando bem, é que watchmen representa o sonho de poder de Alan Moore e essa história representa um leitor tentando dar sentido a toda sua imensa coleção de quadrinhos, só imaginando como seria se o justiceiro, por exemplo, encontrasse o Batman...
Por esses motivos, quando vejo elogios rasgados a essa história, penso que além de não terem compreendido muito bem watchmen, que é uma história que precisa ser lida levando em consideração o viés político de seu criador, também faltou um pouco de olhar crítico aqui. Quero dizer, elogiar uma história que é um grande ajuntamento de personagens, com um “plano milabolante” no final para fazer tudo ter sentido, sei lá, é frustrante. Quantos leitores jamais contextualizaram a hq de Alan Moore, tendo conhecido primeiro o filme de alguns anos atrás e depois a revista? Mas isso não é a reclamação de quem se considera um leitor antigo, nada disso. Só estou lembrando que watchmen foi escrito dentro do contexto da Guerra Fria e significava o desespero de alguém que não via solução para o mundo. Agora, essa história parece ser um mero exercício, bem desligada da realidade concreta que vivemos, mas, ao mesmo tempo, profunda vítima dela, porque joga na cara do leitor o esgotamento desse meio, como se o poço de boas ideias tivesse secado e não houvesse mais nada de bom a se publicar.