Lendas do Universo DC: Quarto Mundo - Vol. 5

Lendas do Universo DC: Quarto Mundo - Vol. 5




Resenhas - Lendas do Universo DC: Quarto Mundo - Vol.5


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Paulo 25/06/2023

Essa é uma edição que é dureza de conseguir encarar. Não pela arte porque estamos falando de um mestre nisso, mas pelos roteiros que não envelheceram bem. Curiosamente, esta é uma edição essencial para a mitologia do Quarto Mundo por causa de duas edições: uma do Povo da Eternidade e a dos Novos Deuses. As demais histórias possuem um roteiro cuja qualidade é bastante duvidosa. Amo o Kirby, mas não dá para concordar com 100% do que ele produz. Por isso precisamos ter a cabeça no lugar e avaliar as coisas pelo que elas são. Vale o registro que mesmo tendo passado várias décadas algumas das histórias nesta edição ainda reverberam no universo DC nos dias de hoje. E estamos falando de algo escrito em 1972. Em todo caso, qualquer história do Kirby vai pelo menos te divertir por algumas horas. Nesse sentido, a edição está muito boa.

A arte do Kirby nas seis histórias que fazem parte deste volume são de altíssimo nível. O homem está voando nos quadros. O grau de detalhamento dele é absurdo. É fácil pegar a última história, que envolve batalhas dimensionais e muita ação, para citar como Kirby entende de composição de cena, mas é nas histórias mais simples como nas do Jimmy Olsen que podemos ver o quanto ele usa seu tempo para dar vivacidade ao que está acontecendo no cenário. Por exemplo, o cenário de cientistas malucos onde se situa a Fábrica do Mal é repleta de bugigangas que parecem realmente aterrorizantes. Ou como os personagens são miniaturizados e o cenário ao redor se transforma e parece uma cena de "Querida, encolhi as crianças" muitos anos antes do filme ser produzido. Ou as máquinas insanas que Scott Free usa para treinar seus números de fuga. A criatividade de Kirby é gritante. Mas, é lógico que qualquer fã de ficção científica vai se concentrar é nas edições que pesam a mão mais nesse gênero. Na do Povo da Eternidade, tem um quadro de página inteira com a vitória dos romanos sobre os bretões e colunas e mais colunas de legionários retornando que é algo de você passar vários minutos observando. O cuidado com os uniformes, o posicionamento dos personagens no cenário e Julio César no meio. Curioso que ninguém cita o nome do César, mas nós somos capazes de deduzir quem é facilmente.

Mesmo com uma quadrinização comum de quatro a seis quadros, a maneira como Kirby consegue tirar o máximo das cenas é impressionante. Uma qualidade do que ele faz é que ele guia o olhar do leitor pelas páginas, dando destaque ao que precisa ser central, escondendo o que só vai ser abordado depois e detalhando o cenário para dar uma sensação de todo. Ou Kirby pode usar o posicionamento do personagem, seja mais à frente e maior ou mais atrás e menor, para tornar uma situação mais impactante. O efeito Kirby já é bastante conhecido, mas nas mãos do Rei ele adota uma outra perspectiva porque o autor sabe quando e como usar. Mike Royer e Vince Coletta estão como arte-finalistas e ajudam a polir ainda mais a arte do Kirby fornecendo os contornos e outros detalhes de cenário que tornam as cenas mais tridimensionais. É como se estivéssemos vendo arte em movimento.

Vamos lá comentar algumas histórias e vou repetir o que fiz antes começando pelas duas melhores. A última história é a dos Novos Deuses e Kirby volta no tempo para nos mostrar a história do conflito entre Nova Gênese e Apokolips, mas dessa vez pelo lado de Apokolips. Fiquei surpreso de ver que o famoso planeta de Darkseid era um mundo verdejante como Nova Gênese. Determinados acontecimentos vão transformar o planeta naquele mundo tecnomecânico que parece uma sucursal do inferno que já conhecemos. Os primeiros personagens apresentados são Izaya e Avia, um casal de Nova Gênese. A relação entre os dois mundos girava em uma paz tênue que é quebrada logo nas primeiras páginas com a morte de Avia e o louco desejo de vingança de Izaya que leva os dois mundos à guerra. Fica claro que existe uma disputa de poder entre Darkseid e seu tio, o Lobo da Estepe. Nesse momento da história de Apokolips, Heggra, a mãe de Darkseid, é a líder do mundo. Enquanto o Lobo da Estepe é um guerreiro sádico e cruel, preferindo se banhar no sangue da batalha, Darkseid usa uma pele de cordeiro para esconder seus planos de dominação.

Disparada a melhor história deste volume e põe disparada mesmo. Um roteiro inteligente, que junta os pontos deixados em diversas histórias ao longo dos volumes anteriores para construir uma cronologia que é simples de entender e Kirby pode construir mais a partir daí. O leitor não se perde em nenhum momento e mesmo situações que se situam mais longe do que estamos acompanhando nas revistas possuem sacadas geniais. Kirby queria entregar logo alguns segredos para poder partir para o próximo ato das suas histórias. Então era importante fornecer aos leitores um chão no qual pisar, dando condições para que ele compreenda a estranha relação de forças entre os dois mundos e como a Terra se situa no meio de tudo isso. Além disso, tem dois segredinhos deixados quase no final desta história no qual veremos as consequências explodindo no próximo volume.

Se a história dos Novos Deuses representa o elemento mais legal neste volume, as três histórias do Jimmy Olsen são o ponto mais fraco. E aí é aquela história de como certas histórias não envelhecem bem porque o leitor que acompanhava os quadrinhos na época era outro. Hoje nós pedimos um pouco de lógica e não muitas firulas. O arco começa com Jimmy Olsen e a Legião Jovem indo para a Escócia investigar... bem... o Monstro do Lago Ness. Kirby dá um jeito de enfiar a lenda do monstro marinho no confronto dos protagonistas com a Intergangue. Assim, claro, por que não? É lógico que os bandidos interdimensionais vão usar um monstro marinho em um lago na Escócia. Isso vai levar a uma armadilha que vai capturar os membros da Legião Jovem e o Jimmy e os levar até a Fábrica do Mal onde eles irão se deparar com Mokkari e Simyan. Ou seja: é uma operação de Apokolips. Sabe-se lá o motivo... Superman, Guardião e Dubbilex estão investigando um lugar curioso para um esconderijo de um projeto semelhante ao DNAlienígena e Dubbilex começa a desenvolver mais dos seus poderes mentais.

Tem umas cenas que são muito vergonha alheia como o Superman e a trupe em uma discoteca bem típica dos anos 70. Afinal, claro, por que não? Superman entrando de uniforme e capa e a galera dançando a toda com calças boca de sino e óculos anos 70. Paz e amor, broto! É o ar meio canastrão das histórias que fazem elas serem divertidas, mas humor é algo muito subjetivo. Para mim não foi lá muito engraçado, para outros pode ser mais. Tem algumas forçadas de barra para a história seguir em frente e várias conveniências. A maneira como o Jimmy é solto e começa a tocar o pandemônio no lugar é embasbacante para mim. Parece aqueles vilões B que ficam explicando os seus planos maléficos enquanto o herói está cortando a corda que o prende com uma faca escondida. E o vilão faz questão de dar uma risada maquiavélica antes de tomar um soco no queixo. Faltou noção em algumas situações e nexo em outras. Definitivamente não curti.

A narrativa do Povo da Eternidade é uma de viagem no tempo. Os personagens são enviados a diversos momentos históricos e lá eles se colocam em situações perigosas. Apesar de ser uma boa história com alguns elementos que despertam a intriga no leitor, achei que a narrativa como um todo foi mal explorada. Tratou-se quase como pequenas vignettes com os personagens interagindo no passado da Terra. Só que fica a minha questão: por que Darkseid vai usar o Efeito Ômega para enviar o Povo da Eternidade para diferentes momentos históricos da Terra se eles nasceram em Nova Gênese? Na hora em que você procura a própria lógica de existir da história ela meio que cai num contrassenso. A arte está incrível, não é esse o problema. Junto com a edição dos Novos Deuses, é disparada a melhor. No que diz respeito ao roteiro apenas as quatro páginas iniciais que envolvem uma espécie de debate sobre a importância do Povo da Eternidade pelo Pai Celestial é que acabam sendo mais revelador. Esse trechinho dá uma pista do que Kirby vai tratar duas edições adiante.

E, bem... temos que falar de Senhor Milagre número 6. A história é meio... meio... ruim, eu não diria, mas meio sem graça. No meio de histórias boas e ruins, essa é indiferente. E acho isso pior do que achar uma história com roteiro ou arte ruim. Ser indiferente a algo revela o quanto a narrativa é esquecível. É um confronto da Grande Barda contra quatro perseguidoras de Apokolips que faziam parte do esquadrão dela. Fora algumas boas cenas de ação, não há nada tão importante assim acontecendo além de uma necessidade de o Scott Free decidir atacar diretamente ou não Darkseid para se livrar de seus perseguidores. Porém, essa é AQUELA história do Kirby. A famosa história onde Kirby coloca um personagem que é muito, mas muito, mas muito parecido com Stan Lee e o representa como um vigarista que quer tirar proveito das ideias alheias. Funky Flashman está na área. Até a ideia de colocar nome e sobrenome com a mesma letra inicial, uma ideia do Stan para facilitar para o público gravar os nomes dos heróis (Peter Parker, Sue Storm, Reed Richards, Bruce Banner), está presente ali. Funky é um canalha que consegue sua riqueza às custas de outras pessoas, seja por chantagem ou por meios escusos. Na minha visão, essa é uma história onde Kirby ventilou todas as suas frustrações contra seu "velho companheiro" Stan. Uma forma de trollar sem ser direto. Mas, para quem sabe ligar os pontos, lá está.


Esse quinto volume tem muitos pontos baixos em contrapartida aos altos. A arte do Kirby está em seu auge e ele é capaz de criar cenas dignas de quadros com a facilidade que eu tenho de acender um fósforo. A maneira como ele preenche os quadros, cria cenários criativos, compõe cenas de ação é de cair o queixo. Não existe um artista capaz de produzir na escala que o Kirby produzia e na mesma quantidade. Pensar que ele sozinho tocou o barco de todo esse universo é mais revelador de o que o homem podia fazer. Contudo, é preciso pontuar que algumas de suas ideias eram bem complicadas de se entender hoje. Ou seja, para um leitor contemporâneo são histórias um tanto quanto pitorescas como o Monstro do Lago Ness ou a Fábrica do Mal. Ou o Superman em uma discoteca. Ao mesmo tempo temos algumas histórias que se tornaram canônicas para o universo DC como a ascensão de Darkseid. Histórias dos anos 70 que reverberam hoje. Se vale a pena? Claro. Mas, vá preparado para encarar algumas coisas legais e outras nem tanto.

site: www.ficcoeshumanas.com.br
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