Acelera SP

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Resenhas - Acelera SP


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Nelson 08/12/2019

Cyber Cultura
Fruto de um crowdfunding realizado no final do ano de 2017, Acelera SP foi publicado no começo de 2018 e traz consigo uma série de críticas políticas e sociais contemporâneas. Digo contemporâneas sem exagero, pois estamos falando de temas que alardeiam nosso cotidiano desde o começo da polarização política atual. Isso se torna bastante claro já no título: “Acelera>>SP” era o slogan usado por João Dória à prefeitura de São Paulo, conhecido por promover ideias neoliberais em sua campanha. Vale lembrar que Dória se tornou réu por improbidade administrativa devido ao uso do slogan.

O projeto é de autoria de Cadu Simões, um historiador graduado e que atua como quadrinista desde os anos 2000. Detentor de um prêmio HQ Mix, Cadu é mais um guerreiro que atua no mercado independente de quadrinhos e se publica pela Internet de forma gratuita e também através de crowdfunding, tendo como sua obra mais conhecida o comic “Homem-Grilo”, além de ter desenvolvido outra HQ com influências cyberpunk, a “Nova Hélade”.

Já o ilustrador Juliano Kaapora é cursado em Ilustração e História em Quadrinhos pela Quanta Academia de Artes. Desde de muito cedo, Juliano trabalhou em diversos segmentos com suas ilustrações e tem como destaque sua participação em obras como “O Guarani” (coleção Ópera em Quadrinhos, Editora Scipione) e “O Vira-Lata” (revista Imaginários, Editora Draco).

Pelas temáticas abordadas, é de se imaginar que há uma forte opinião política entremeada a história de Acelera SP. Cadu Simões, em momento algum, tenta esconder sua inclinação política e faz da obra um grande debate ao explorar as condições dos personagens que habitam essa grande São Paulo futurista. Há também (ao meu ver) uma crítica ao modelo de arte tornado mero produto de consumo, através de uma personagem artista e representante da socialite.

O desenvolvimento da trama se foca na locomoção de um dia na vida de Amaynara, Marcos, Rodrigo e Isabela e tem como plano de fundo a atual situação dos povos indígenas brasileiros que restaram e formaram as ZADs, Zona Autônoma a Defender.

Por ser um one-shot, Acelera SP entrega uma história rápida e com final fechado, tendo em suas últimas duas páginas uma entrevista em formato web sobre as ZADs. Apesar desse interessante formato, que esclarece questões sobre o surgimento e funcionamento desses locais, a HQ já havia deixado boa parte delas entendidas e outra subentendida. Isso criou uma redundância (na minha opinião, é claro), que teria sido melhor aproveitada explorando os personagens em mais páginas. Em uma história pequena e fechada, o uso de duas páginas acaba fazendo diferença.

A trama consegue costurar a história de todos os personagens e usa a locomoção urbana como agulha. Não me recordo de ter lido algum outro conteúdo tão focado em um aspecto e isso foi um atrativo interessante. Ainda mais quando as referências aqui são tão atuais: Uber, carros autônomos e os tão aguardados carros voadores (quadricópteros, apesar deles não aparecerem nas ilustrações).

Ainda sobre referências, há algumas detectáveis, por exemplo o estilo de Amaynara, que lembra o visual de muitas personagens femininas do cyberpunk. Em uma cena, há uma pichação na parede escrito “Akira”, que também se mostra influente na motocicleta de Amaynara e que também compartilha certa semelhança com a motocicleta do filme Tron (2010). Em outra pichação, lê-se “Nova Hélade”, que ao pesquisar, se revelou ser outra obra influenciada pelo cyberpunk do autor Cadu Simões.

As características cyberpunk no universo de Acelera SP não estão focadas no elemento cyber, portanto não espere por implantes cibernéticos e inteligências artificiais. É o punk que move a história em uma luta contra o sistema. As desigualdades sociais permeiam cada página, demonstrando ao ponto que a grande São Paulo chegou, ao ter se reduzida a uma corporatocracia (ou corporocracia), onde os governantes foram trocados por administradores e CEOs. A degradação do meio ambiente e a luta pela sua conservação também entram nesse mérito. Sem acrescentar qualquer tecnologia futurista, a HQ revela como o cyberpunk, que nasceu como um futuro próximo, é um retrato da nossa atualidade. Por isso, eu vejo a obra como um postcyberpunk que flerta com o nosso quase ignoto tupinipunk.

Como eu adquiri minha HQ através do financiamento do coletivo, ela veio acompanhada de dois postais, um marcador de página e os panfletos sobre as outras obras do coletivo Petisco. A capa é a única parte colorida, o miolo é todo em preto e branco, enquanto as últimas páginas, que se dedicam a entrevista, lista de apoiadores e estudos, recebem uma escala de cinza. Não encontrei qualquer defeito em minha edição.

Acredito que vale comentar que a obra se encontra registrada em Creative Commons. A arte de capa é assinado por Gil Tokio e parte das ilustrações são de autoria de Sam Hart. Na página do Catarse é possível encontrar mais informações sobre o universo de Acelera SP, que complementam a história de cada personagem.

site: https://cyberculturabr.wordpress.com/2019/12/08/hq-acelera-sp/
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