Lendas do Universo DC: Quarto Mundo - Vol. 2

Lendas do Universo DC: Quarto Mundo - Vol. 2




Resenhas - Lendas do Universo DC: Quarto Mundo - Vol. 2


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Paulo 22/12/2022

Essa é uma segunda edição com uma série de coisas acontecendo e, lá no fundo, alguns conceitos sendo inseridos ao poucos. Não é uma edição lá muito movimentada e achei algumas histórias meio complicadas de curtir, mas no geral é um material muito bom. A gente precisa analisar que no meio deste segundo volume temos quatro revistas então vai ter algum personagem que não vai ser interessante ou algum arco de histórias que não vai agradar a todos. É normal em um mix. Sim, disse mix e já percebi alguns dos leitores se contorcendo do outro lado. Todo o conceito do Quarto Mundo foi desenvolvido ao longo de alguns anos por Jack Kirby e ele nunca fez questão de criar um grande evento interconectando tudo. São só edições mensais que possuem situações comuns, personagens compartilhados, ideias que atravessam revistas. Quando compilamos tudo junto, o que acontece é um mix de histórias. Não é algo em detrimento como são os mix da Panini na atualidade, muito pelo contrário.

Vocês não esperam realmente que eu faça alguma crítica negativa da arte do Kirby, certo? O que gostaria de trazer são alguns detalhes e pequenas coisas que percebi nesta edição. Na revista do Jimmy Olsen, Kirby começou a brincar com outras maneiras de explorar as cores. Por exemplo, em um determinado momento em que eles estão experimentando uma invenção chamada solarfone, eles entram em uma espécie de outra dimensão. Kirby muda a coloração de uma maneira que parece uma mistura maluca de raio-X com visão noturna. O efeito é completamente psicodélico e consegue entregar o que ele queria: algo que não pertence à nossa dimensão. Gosto de como existe toda uma explosão de cores por suas páginas e isso é uma de suas marcas registradas. O fato do Senhor Milagre usar uma cor berrante ou os Novos Deuses serem uma combinação doida de rosa com amarelo ou branco, cinza e vermelho é uma demonstração que estes seres extraordinários existem em uma espécie de outro mundo que não o nosso. São avatares da grandiosidade, acima dos seres humanos. Percebam como os seres humanos de suas histórias são... comuns. Usam um terno e gravata, ou uma camisa de gola alta ou um chapéu. É um contraste nítido em relação aos super-heróis e aos deuses. Isso vale também para as cidades: enquanto Nova York é um lugar comum com arranha-céus e vizinhanças perigosas, Nova Gênese, Apokolips ou o Habitat são lugares saídos de alguma imaginação fabulosa.

Também aproveitando para falar do arte-finalista, Vince Coletta, é incrível como ele realça os traços poderosos de Kirby. Nas edições em que ele está presente, temos um traço ainda mais afiado. A preocupação com perspectivas e em não deixar nada sem a passada de uma pena é essencial para fornecer riqueza às cenas. Coletta está em uma das edições do Senhor Milagre e essa é uma edição que explora bastante as expressões feitas por Scott Free. Seja o personagem tentando criar uma saída para alguma situação difícil, tendo alguma recordação ou simplesmente focando em seus inimigos. A expressividade é importante principalmente quando o personagem está olhando em nossa direção, como se estivesse quebrando a quarta parede. Seus traços acabam se tornando mais marcantes para o leitor, e o papel do arte-finalista nesses momentos é crucial para que o esforço do artista não tenha sido em vão.

Confesso que achei as edições do Jimmy Olsen as mais fracas deste segundo volume. Toda a confusão provocada pelo DNAlienígena não me convenceram em nada. Talvez porque o conceito tenha me parecido meio bobo, a de um gigante de quatro braços que não tem muita inteligência e só quer comer radiação. Entendo que se trata de outra época e as situações exploradas eram mais simples, mas essa foi uma história que não envelheceu bem. Inclusive a solução para acabar com os vilões foi algo saído de um desenho do Papa-Léguas. Okay, estou sendo ranzinza. No pano de fundo, Kirby tenta explorar o papel de Morgan Edge como principal ativo da Intergangue e seu envolvimento com Darkseid. Dominar os meios de comunicações parece ser algo que Kirby deve explorar mais nas próximas edições até porque temos outro personagem interessante que foi introduzido, mas que falo mais abaixo.

O ponto alto dessa edição são as duas histórias do Povo da Eternidade. Na primeira delas, eles são apresentados ao Mantis, um adversário bastante poderoso cujas habilidades chegam próximas às de Darkseid. Ficou implícito uma certa animosidade entre os dois personagens com o grande vilão afirmando que seu interesse está apenas na equação Antivida. Me recordo de que o Mantis apronta algumas boas em futuras histórias. Não há muito tempo para colocá-lo como realmente ameaçador, mas o pouco que deu para ver foi o suficiente para querer ver mais do vilão em futuras histórias. Na segunda história, temos a introdução do Glorioso Godfrey, uma espécie de profeta da Antivida. Ele criou um culto para Darkseid em que os seres humanos que adentraram nele se tornaram servos fieis e são capazes de morrer por seu líder. Kirby faz uma associação óbvia a Hitler, mas é interessante ler essa história hoje com tantas pessoas empregando a religião para seus fins egoístas. Godfrey não se importa com seus fieis, apenas com ele mesmo. O personagem não possui nenhuma habilidade extra além de seu carisma e sua capacidade de encantar multidões. É um espelho dos líderes messiânicos de hoje.

Nas edições dos Novos Deuses, que estão muito boas também, temos o Orion precisando se adaptar ao estilo terrestre. Ele adota uma identidade secreta de forma a poder trabalhar com os humanos que ele salvou de Apokolips. A primeira edição tem dois objetivos principais: mostrar mais sobre Nova Gênese e falar o que é a equação Antivida, que também é abordada nas edições do Povo da Eternidade. Nova Gênese é uma cidade que flutua acima de um planeta verdejante. Ela se destaca por sua tecnologia onde todos os seus habitantes estudam e se desenvolvem para criar um mundo melhor. Conhecemos o Grande Pai, uma espécie de líder para os Novos Deuses e que conhece os horrores provocados por Darkseid. Kirby deve ter se inspirado nas imagens clássicas das pinturas que tentavam representar o Deus cristão. O Grande Pai é um homem alto, imponente, com um longo cabelo branco e uma barba branca, segurando um cajado. Apokolips aparece brevemente com mais detalhes e percebemos que o planeta é alguma espécie de construto de rochas vulcânicas com lava sendo expelida por toda a parte. Kirby monta uma dicotomia entre o verde da natureza e a tecnologia sendo usada para aprimorá-la e do outro lado um uso indiscriminado da ciência, destruindo um planeta e o transformando em uma terra estéril.

A equação Antivida representa a retirada da capacidade dos seres vivos de poderem fazer suas próprias escolhas. Sim, é isso mesmo. Com ela, Darkseid retiraria o livre arbítrio e a partir disso seria um líder incontestável. Desde sua concepção, o vilão é um nilista que não se importa com os meios para alcançar seus objetivos. Não vemos um pingo de emoção ou sentimento em suas movimentações; apenas um jogador controlando peças. E ele precisa ter tudo em seu controle, caso contrário precisa virar o tabuleiro e mudar o jogo. Procurar algo que lhe dê controle absoluto de tudo é um passo natural para um ser assim. Nessa edição conhecemos também Desaad, o braço direito do vilão. Um personagem que é quase como um feiticeiro ou um sacerdote cujas tramoias se baseiam na exploração do medo das pessoas. Fiquem ligados em Desaad porque ele acaba servindo como o principal aliado de Darkseid e muitas tramas giram em torno de situações ou inventos de sua criação.

Preciso citar também a introdução do Corredor Negro na segunda história do Orion. Logo no começo da história, ficamos sabendo que o personagem seria uma espécie de avatar daquele que busca as pessoas que faleceram. É a morte inevitável, mesmo para um deus. No entanto, para agir na Terra, ele se apossa do corpo de um homem que está em estado vegetativo. Um ponto bem legal dessa história é o Corredor Negro observando o funcionamento de uma comunidade assolada pelo crime organizado. Ver bandidos pequenos explorando outras pessoas e como uma criatura acima da compreensão humana analisa esses pequenos conflitos. Kirby monta essas reflexões vez ou outra e nos coloca para refletir acerca da condição humana. E de como estes seres tão à parte da humanidade se relacionam conosco.

Já em O Senhor Milagre, parte do passado de Scott Free começa a ser revelado. E o motivo de ele ter alguns aparelhinhos tão interessantes, como uma caixa materna. A própria caixa materna usada pelos Novos Deuses. É aí que descobrimos que Free era um órfão criado em um lugar administrado por uma mulher odiosa chamada Vovó Bondade. Que, por incrível que pareça, é uma das subordinadas de Darkseid. Portanto, esse é o link das histórias do personagem com a narrativa do Quarto Mundo. Ou pelo menos o seu ponto de entrada já que em breve veremos uma tal de Grande Barda chegando. Essa é uma edição que explora as habilidades do personagem e nos permite entender melhor como funciona a ideia de um especialista em fugas em uma narrativa de super-heróis. E Kirby consegue fazer isso funcionar como uma luva.

Uma boa segunda edição com boas histórias aqui e ali e outras nem tão empolgantes assim. Vale muito pela enorme quantidade de personagens introduzidos aqui (embora alguns não bem desenvolvidos ainda) e que terão uma enorme importância para o universo DC como Godfrey, a Vovó Bondade, o Corredor Negro, Desaad e o Grande Pai. Ainda estamos em uma fase de colocação de peças em um grande tabuleiro cósmico e Kirby divide ainda sua atenção por todos os lugares. Começamos a ver algum afunilamento, mas isso parece estar a algumas edições de distância. De toda forma, temos a incrível arte de Kirby que continua a nos encantar por páginas e páginas a fio.

site: www.ficcoeshumanas.com.br
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