Se as páginas pudessem ser de pele, não seria preciso descobrir porque goza o poema. Toda especulação em torno da relação entre arte e prazer teria seu fim se nos livros pudéssemos sentir textura e calor de um corpo que escreve em si. No lugar de palavras, braços, pernas abertas, cruzadas, fechadas, que vão saindo obra afora e se confundindo também com o corpo do leitor — alvo da relação que se insinua. No lugar da revelação de um sentido, a produção de uma interminável cadeia de sensações faria o poema acontecer; leitor e poeta exaustos afinal.
Engana-se quem pensa que enquanto lê não está gozando junto, procurando uma posição mais confortável para encontrar seu prazer, mesmo que não exista conforto nenhum no sexual de que é feita a arte. Raro é esse momento da entrega ao desejo do corpo, assim como é rara a manifestação irrefreável do desejo poético. As páginas desse livro não são de pele em sua realidade material, mas a maestria com que o poeta oferece seus versos como partes de corpos inebriados de prazer, faz-nos pensar que sim. A raridade está nas mãos de William Soares dos Santos e na poesia que evoca ao tocar tantas silhuetas, enquanto produz sua arte e transforma em obra-prima um organismo que não para de se contorcer, agora do lado de cá, pronto para entrar em nós e nos deixar, também, desejar a sua entrada.
Morgana Rech
Poemas, poesias