A história de Genovena, mulher madura e amante de muitos homens, e de Vítor, um jovem inexperiente de 23 anos, cujo amor desenfreado conduz a trágicos eventos.
Vestiu-se quase com devoção; foi-se florir e, fumando um charuto caro, dirigiu-se à Rua das Flores. Por um refinamento de voluptuosidade, não se apressava e ia gozando tudo devagar, o ar, o sol, as fachadas alegres, porque a tudo o seu amor transbordante lançava, sobre todas as coisas, como um reflexo amável.
Uma das primeiras obras “realistas” de Eça de Queirós, escrita logo após o “Crime do Padre Amaro“, entre 1877 e 1878, quando o próprio era cônsul em Newcastle, Inglaterra; no entanto, só em 1980, mais de 100 anos depois de ter sido escrita, é que esta obra teve a sua primeira publicação, altura em que deixou de estar na posse dos herdeiros e passou a pertencer ao domínio público.
Com a obra completa, mas não revista para publicação (o manuscrito original apresentava pequenas incoerências narrativas e palavras omissas), não se sabe ao certo porque é que Eça, depois de ter delineado a história, a tenha posto de parte. Muitos especulam que a ideia narrativa por detrás da “Tragédia da Rua das Flores” tenha crescido e motivado Eça a escrever “obras maiores” a partir do que já escrevera. De facto “A Tragédia da Rua das Flores” tem muitos elementos narrativos, cenas, diálogos, situações e até nomes de personagens que aparecem em “Os Maias” e ainda uns outros em “O Primo Basílio“; o que leva muitos críticos literários a olhar para esta obra como apenas um esboço, ou um estudo literário de Eça, razão pela qual o autor nunca a considerou para publicação.
Seja como for, a obra não deixa de ter o seu espaço único entre o conjunto literário “queirosiano”, explorando, como no grosso das obras de Eça, a critica social e a exposição de temas tabus da sua a época. Escrita com toda a vigorosidade e amenidade própria da escrita do autor, diz-se que foi inspirada num artigo de um jornal que dava conta de que um corpo teria sido encontrado, sem vida, no passeio da rua das Flores, em Lisboa. Estado afastado de Portugal e sendo os jornais nacionais os únicos pontos de ligação que Eça tinha para se manter actualizado sobre o que ocorria no país, tal situação, ocorrida numa zona nobre da cidade (a rua das Flores é uma das ruas que liga o cais do Sodré ao Chiado) e que Eça conhecia tão bem, deve tê-lo deixado extremamente intrigado. Partindo do mesmo espírito criativo sobre investigação criminal que desenvolvera em “O Mistério da Estrada de Sintra“, Eça começou por delinear e desenvolver uma hipotética história sobre quem seria aquela pessoa e que acontecimentos teriam ocorrido para culminar naquela situação. O resultado é um estudo psicológico de uma paixão mórbida entre um jovem rapaz e uma mulher com o dobro da sua idade – um tema tabu para a altura – que encobre algo ainda escandaloso e trágico.
Romance / Literatura Estrangeira