Não deixa de ser curioso que o ritmo implacável de nossas gerações termine por abafar o espanto que deveríamos sentir por vivermos predominantemente nesses lugares extraordinários que são as cidades. À paisagem natural com seu horizonte móvel opusemos uma paisagem maciça e espetacular, e que, no entanto, se impregna de tal modo em nossos sentidos que não notamos o quanto ela concorre para seu entancamento; o quanto ela modula nossa relação com o tempo e o espaço.
Com este livro, Cristina Freire contribui para desvendar o quanto da cidade está em nós e o quanto de nós perde-se na pátina que vai se depositando nas paredes dos prédios, na imperceptível maceração que os nossos passos impõem nas calçadas de pedras. Seu objeto de estudo é a análise de dois monumentos da cidade de São Paulo, o monumento a Ramos de Azevedo e o prédio do monumento - MASP. Utilizando-os como exemplo, ela lança sobre esta malha geométrica e previsível do traçado urbano uma outra malha cujo desenho plasma-se em ruas, prédios e monumentos, que guardam dentro de si a lembrança de um tempo anterior e que são capazes de alimentar a memória da percepção.
E para dar conta desse objeto multifacetado, a autora inicia seu texto dando-nos a mão com um texto encantado e encantador sobre a fruição estética que se pode obter deambulando pela cidade. Em seguida, com sensibilidade e segurança, ela vai cruzando a Psicologia Social, a História e a Estética, esta a partir de alguns momentos particulares da produção artística deste século, para ao final nos oferecer a cidade como o lugar onde o maravilhoso prossegue vivendo. (Agnaldo Farias)