Quanto assombro cabe na vida de uma mulher? De qual primeiro ódio fomos alvo na vida? De quem é o corpo da mulher? Quanta força ancestral é ancoragem para nos equilibrarmos no impossível?
A memória que dá pancadas, mas pode retirar da repetição, a discussão que culmina no primeiro tapa, o sal que vai acumulando nas vistas, um silenciamento que puxa outro, e outro e mais outro, até sermos engolidas.
Estamos desaprendendo a aceitar, a cuidar porque somos obrigadas, a seguir roteiros que não constam em nossos desejos, estamos desaprendendo o apagamento de nossos corpos, descobrindo o próprio tom em coletivos, em alianças com nossas ancestralidades e intuições.
O grupo Escreva, Garota! reuniu em seu II Prêmio Literário vozes de mulheres diversas ficcionando as histórias de todas nós. Palavras que convivem com o mistério, rompendo mordaças visíveis e invisíveis de mãos, lábios, Estado, família, biologias sobre nossos corpos e histórias.
Aqui a escrita é o poder das palavras que a Vida sussurra em nossos ouvidos, forças e afetos empenhados pelo mundo de dentro e pela carne. Nossos afetos medicalizados, nosso sangue coagulando nas veias, nosso desejo submetido, dão lugar à reinvenção de cada uma de nós e do que podemos juntas.
Escrever e criar para não termos vergonha de ser gente, por direitos humanos, por memória, pela multiplicidade do que é ser mulher, como desafio ao colonialismo social. Sem promessas ou dívidas, somos nossas insuficiências, vulnerabilidades e nossa perseverança no intento de sermos quem somos.
Escrever e publicar nossas vozes de mulheres é um ato político. E estamos só começando.
Priscila Tamis
Psicóloga, escritora e poeta.
Desde 2021, é integrante do grupo Escreva, Garota!
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