É Mentira, Terta?

É Mentira, Terta? Chico Anysio


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É Mentira, Terta?





"Roberta – E aí, seu Pantaleão? Qual é o causo de hoje?

Pantaleão – Tem causo não. Só umas estórias besta.

Roberta – Sem uma historinha eu num saio daqui...

Pantaleão – Então é aí mesmo que eu num conto...

Terta – Conta a história do poste de Jaboatão...

Pantaleão – Pois bom. Sucedeu-se em novecento e vinte sete... Eu tava em casa lavando o rosto...

Pedro Bó – ... com água?

Pantaleão – Não, Pedro Bó. Com mijo. Pedro Bó, tenha paciência...

Terta – Conta a estóra, home.

Pantaleão – Pois bom. Quando eu acabe de lavá o rosto, chega compadre Bil já com uma montaria pronta pra me levá pra Jaboatão.

Roberta – O quê que era?

Pantaleão – Num vê a senhora que uns caçador tava no mato, um deles sentiu sede, e começaro a subi num coqueiro mode pegá um coco. E ta subindo, ta subindo, e nada de chegá no coco. E ta subindo e ta subindo e nada de chegá no coco. Quando ele já pra cima das árve, qui olho pra riba, qui viu. Num era um coqueiro, era um poste. Ele olhou, disse que tinha bem mais uns trezento metro pra cima e uma luzinha acesa lá na pontinha.

Roberta – Cruz credo.

Pantaleão – Pois bom, eu não acreditei muito, porque era uma históra de caçador e por incríve que pareça tem caçador que mente, mas eu fui lá. Cheguei lá já tava tudo os maioral da cidade, prefeito, discutindo com deretor da laite: vocês que botaro esse poste, num fumo, fôro, num fumo, fôro, num fumo, o vigário já tava dizendo que era praga do maligno, quando eu matei a charada.

Pedro Bó – Com um tiro?

Pantaleão – Não, Pedro Bó, com uma cabeçada igualzinha a uma que eu vou te dá agora no baixo ventre.

Roberta – Pelo amor de Deus, seu Panteleão. Acaba a história...

Pantaleão – Pois bom, num tinha mistério nenhum... é que uns 40 ano inhantes aquilo tinha sido terra dum japonês que passou dois ano adubando o terreno. Dispois teve lá um desgosto com a muié, largou tudo e vortô pro Japão. Dois ano dispois a laite passou posteando o terreno, botou o poste no lugá adubado, o adubo do japonês tava concentrado, o poste cresceu.

Roberta – Vige.

Pantaleão – É mentira, Terta?

Terta – Verdade!



Pantaleão Pereira Peixoto pode ser do Ceará, do Piauí ou de Pernambuco; da Bahia, de Sergipe ou das Alagoas; da Paraíba ou do Rio Grande do Norte. Apesar de que, na minha modesta opinião, rio-grandense-do-norte ele não é, porque, se fosse, Luís da Câmara Cascudo saberia dele primeiro que eu – humílimo cearense de cariocas vivências e que tomei conhecimento desse cabra valente a ponto de fazer, das coisas que ele viveu, uma ruma de folhas já impressas como qualquer um pode constatar. A não ser que Cascudo o tenha conhecido sem, todavia, lhe dedicar o afeto merecido. Ninguém no mundo viveu tantas histórias incríveis quanto o marido de dona Tertuliana e pai de criação de Pedro Bó. O que aconteceu de mais inacreditável com ele foi que todas as histórias por ele vividas, todas com o testemunho de dona Terta, aconteceram em 1927.



Com um olho perdido em virtude de um graveto a ter atingido numa das suas andanças pela terra seca do sertão nordestino e sempre com o pé descansando no assento de sua cadeira de balanço, Pantaleão vivia contando seus feitos aos que lhe faziam uma visita. E se alguém como ele perguntar : “É mentira, Terta?” Ela inacreditavelmente responderá, como sempre: Verdade ."

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