Leitora Viciada 05/09/2011Primeiramente, nunca li um livro de auto-ajuda ou que abordasse temas ligados à Psicologia ou Filosofia que me agradasse. Sempre que eu leio esse tipo de livro, me sinto uma tola, com aqueles ensinamentos e mensagens de superação ou reflexão. Nunca tenho paciência para ler as frases destacadas.
Após ler Raízes e Asas, descobri o verdadeiro motivo pelo qual desgosto desse tipo de livro: os enredos e histórias utlizadas como plano de fundo para a mensagem que o autor tenta passar, são chatos, falsos, vazios, superficiais.
Raízes e Asas é muito diferente. Não tem nada em comum com esses livros, exceto pelas mensagens de reflexão, que tornam-se agradáveis a partir do momento em que se encaixam na história. Não é um ato impensado, muito menos forçado, realizado pelo autor. É o tipo de livro que leva o leitor a pensar e a refletir sobre diversos assuntos, sem o obrigar a isso. É algo natural.
Desde a primeira página, percebemos que aprender sobre algo é um fator coadjuvante. O principal é a história. O resto é consequência, é complementar.
Ronaldo escreve de forma única, com delicadeza e sutileza. Transforma seres como árvores e aves em completos e racionais personagens, com muita naturalidade, nos fazendo crer em seus atos e pensamentos. Até mesmo seres inanimados como a água ou o céu parecem criar vida ao longo da narrativa. É incrível como todo o ambiente toca o leitor e interliga-se, fazendo parte de um todo, chamado vida.
A capa é perfeita, exibindo os personagens principais: Branno, o pássaro migratório, dono de uma incrível habilidade durante o voo, livre e viajante. Ele lidera um grande bando de aves, aonde todos se complementam e se respeitam. O outro personagem, é um pequenino pinheirinho, que vive refém de suas raízes, preso à um vale deserto e vazio, que já foi uma linda floresta. Ele é o único sobrevivente de um massacre realizado pelos humanos, que arrancaram todas as árvores.
O livro é feito em papel reciclado, um charmoso detalhe muito bem planejado, já que toda a história é ecológica; o papel do livro não deveria ser outro!
A forma como o Ronaldo escreve, como eu já disse, além de delicada e sutil, é comovente. Não há como fingir que esse livro é uma mera fábula, e pensar que mensagens sobre proteger e respeitar a natureza é algo batido e já totalmente explorado, porque não é! O segredo está na forma como se escreve. Acredito que temas e assuntos podem ser repetidos e repensados, desde que o autor possua o dom da escrita. E além disso, um estilo único. Você encontrará isso na escrita do Ronaldo.
Adorei a forma como ele narra a história. Ás vezes ela é contada pelo pássaro Branno, e em outras é em terceira pessoa, um narrador.
Outro elogio que faço, e foi o que mais admirei, é como o Ronaldo faz a gente se sentir pássaro, ou árvore, ou terra... Quando ele conta por exemplo, como o pássaro se sente, em reações físicas, passando das penas ao bico e você por um momento se sente pássaro, ou imagina que deve ser assim que o pássaro se sente, conclui-se: que escrita mágica!
A história dura anos e em alguns momentos você se sente triste. Eu pensei em como situações apresentadas ali como únicas e totalmente drásticas, são rotineiras. A caça indiscriminada, matar animais por diversão, por esporte, foi o que mais me chocou. Como as aves sofrem! E não me venha ninguém dizendo que os animais são irracionais e por isso não sofrem. Não acredito nisso, essa é minha opinião. Para mim, eles podem não ter o raciocínio lógico e poderoso como o nosso, porém eles tem sentimentos, eles sofrem sim. Branno, em momentos como esse não parecia apenas um pássaro. E sim um ser vivo como eu, humana! Eu adoro animais e quando os vejo sofrerem por nada, sem motivos, eu fico realmente triste.
Outro assunto abordado é o desmatamento ilegal e sem planejamento. Como todo um ecossitema pode morrer dessa forma. Não se pensa que uma árvore pode ter centenas de ano e uma floresta, milhares. E que animais dependem delas para sobreviverem. Que nós precisamos também. E que isso pode ser destruído muito mais rapidamente do que foi criado.
O livro não é apenas ecológico. Ele trata dos mais antigos sentimentos e dores humanas. Perda, solidão, medo, busca pelo sentido da vida e seu lugar no mundo, família, amizade.
O melhor momento do livro, sem dúvida, é a amizade de Branno com o solitário pinheirinho. Dois mundos totalmente diferentes, se encontram. Desse encontro, descobre-se que todos são parte da vida, que todos existem por algum motivo. E Branno aprende muito mais com o pinheirinho em seu vale vazio do que em viagens feitas com seu bando a vida toda por grande parte do mundo. Quem é que deveria ter coisas a ensinar, quem nunca saiu do lugar ou quem é um viajante experiente? Como isso é possível? É lindo.
Mais lindo ainda é quando Branno resolve realizar o sonho de vida do pinheirinho; mas isso não contarei, você precisa ler esse livro! É uma história maravilhosa, para todas as idades, principalmente para quem gosta de natureza. E quem não gosta também deveria lê-lo; afinal, quem sabe assim não passa a respeitá-la, mesmo não mudando de gosto?
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