Amor Contra o Ódio

Amor Contra o Ódio Karl Menninger




Resenhas - Amor Contra o Ódio


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Carla.Parreira 15/11/2023

Amor contra o ódio
Eis alguns trechos que mais gostei: ??O grito da criança recém-nascida tem um tom, não de lamento, e sim de ira? O ódio precede necessariamente o amor na experiência humana. Acredita, porém, que isto é um erro primitivo do espírito que se torna hábito inveterado antes que a razão possa dissipá-lo? O medo e o ódio são emoções tão inextricavelmente amalgamadas e regularmente associadas que é difícil fazer distinções uteis. Entretanto, isto podemos dizer: o medo consciente e racional serve a uma função útil; adverte-nos contra os perigos reis e tem levado a humanidade a erigir defesas contra o perigo, a fome, a doença e outras ameaças externas. O medo irracional que nos paralisa e inibe, como veremos, não é o medo do perigo real e sim uma espécie de medo de nós mesmos, um medo de nossos ódios ou dos ódios causados por nós nos outros ou projetados sobre eles. O medo é frequentemente a única manifestação exterior do ódio?
Com uma educação adequada e com o que podemos chamar experiência normal, ela (a criança) vai gradativamente sendo capaz de distinguir entre os objetos que deverão ser exatamente temidos, odiados e combatidos, e os que podem ser mais rapidamente aceitos, utilizados e amados? Todas as espécies de equívocos e juízos errôneos terão de ser mais tarde corrigidas por uma prova contínua da realidade que exige muitos anos para a obtenção de um grau razoável de precisão. Nesse tempo, a expressão do ódio é mobilizada e dispersada em direções desfavoráveis, ao passo que o fluxo de amor é escasso ou esbanjado em relações inconvenientes ou vãs? É um dos objetivos reconhecidos da educação lidar com a agressividade da natureza da criança, isto é, modificar no curso dos primeiros quatro ou cinco anos a atitude da criança para com estes impulsos que tem em si. O desejo de ferir as pessoas, e mais tarde o desejo de destruir os objetos, passa por toda espécie de modificações. É habitualmente restringido, depois suprimido por ordens e proibições; um pouco mais tarde é reprimido, o que significa que ele desaparece da consciência da criança. A criança não ousa nunca mais ter conhecimento destes desejos. Há sempre o perigo de que eles poderiam voltar do inconsciente; levantando-se, portanto, todas as espécies de proteção contra eles: a criança cruel manifesta piedade, a criança destruidora torna-se hesitante e ultracautelosa?
A lógica e a razão implicam alguma aptidão para ver além do presente imediato, e isto, naturalmente, a criança não pode fazer? Nas sociedades primitivas em que os adultos deixam as crianças à vontade e não lhes põem óbices, a criança pode achar por si mesma satisfações sucedâneas que poderão posteriormente parecer-lhe melhores do que as originais? Na sociedade contemporânea, ao contrário, quando se dão sucedâneos de satisfações, sua seleção é amplamente determinada pelos gostos do adulto? A criança não só terá de sacrificar muito de sua liberdade, como deverá fazê-lo de maneira polida e de bom grado? Uma repressão, porém, só será bem sucedida se a criança tiver atingido maturidade suficiente para aceitá-la temporariamente e para achar outras saídas mais tarde. Se as experiências não são severas demais, a criança perdoa e esquece. Porém, se a repressão lhe é imposta prematura ou excessivamente, é quase certo ela desesperar-se, mais cedo ou tarde, liberando impulsos incontrolados sob forma de neurose, conduta desordenada, ou outras formas de anormalidade? A grande frustração que a criança moderna da sociedade civilizada sofre não é devida inteiramente a rígida repressão de seus prazeres naturais e de seus hábitos não sociais; também é resultado do fato de que se vê privada da provisão extra de amor que os seus sacrifícios exigem? Os pais, em geral, tratam o filho como eles mesmos foram tratados por seus próprios pais, muitos anos antes, realizando assim uma vingança há muito adiada e transferida pelas injurias e sofrimentos que suportaram. É bastante estranho, porém, que tais pais raramente percebam o ódio que seu comportamento envolve. Defendem sua atitude com as mais respeitáveis racionalizações? Quando uma criança é transferida para uma mãe substituta, em idade tenra, isso muitas vezes aumenta-lhe a carga de ódio sem desenvolver-lhe a capacidade de amar?
Há uma lenda popular que diz que são os homens que desejam a satisfação sexual e a procuram egoisticamente em mulheres passivamente dóceis, mais ou menos transformadas em vítimas. Este mito do macho como animal sexual e a fêmea como uma frigida madona é um resíduo vicioso, hipócrita das éticas paulinas e vitorianas que simplesmente não tem fundamento em fatos. Realmente a sua própria persistência ante a evidência prova a que ponto a frustração sexual está presente entre as mulheres? Enquanto que antigamente ter filhos era a função mais importante de uma mulher e a prova de seu êxito, hoje é considerado às vezes como sinal de resignação, de descuido ou da falta de ambição? Imitação é a adulação mais sincera, mas continua sendo adulação; contém uma ameaça baseada no ódio inconsciente, além do amor evidente? Os homens cuja necessidade de amor os leva aos riscos e esforços necessários para manter relações sexuais com mais de uma mulher, mostram antes uma deficiência do que um excesso em suas faculdades masculinas?
A forma de autodestruição peculiar às mulheres é o repudio da própria feminilidade? As mulheres são o sexo prejudicado? Uma mulher que tenta extrair imunidade daquilo que lhe parece um mundo do homem, sofre realmente um excesso de ódio e uma falta de amor. Isto confirma sua impressão original de que a vida é hostil e injusta para as mulheres, e a faz agarrar-se as prerrogativas da feminilidade, ao mesmo tempo em que repele sua verdadeira significação? Quando uma garotinha se sente esmagadoramente ultrapassada pela mãe, como uma rival, a solução fácil é voltar-se para o pai como um ideal de identificação? Muitas mulheres tem um medo consciente da gravidez, mas isto não deve necessariamente resultar em esterilidade. Seja qual for a sua origem, uma aversão inconsciente à gravidez, que é insuficiente ou incapaz de produzir esterilidade, pode revelar-se na dificuldade e sofrimento da gravidez e do parto. Posso dizer, pela experiência da clientela, que em algumas mulheres o grau de desconforto tanto na gravidez como no parto tem sido diretamente proporcional à intensidade de sua indignação em ter de atravessar esta fase de seu papel de fêmea. O vômito excessivo na gravidez é reconhecido por muitos obstetras como uma expressão fisiológica de protesto e um gesto de repulsa. Creio que este mesmo protesto pode exprimir-se numa dor excessiva, antes e durante o parto? O que é doloroso e desnecessário no parto normal não é devido à anatomia da mãe ou da criança, e sim à atitude com que se encara e se enfrenta a experiência?
O conhecimento da verdade não pode fazer mudanças súbitas e revolucionarias, mas conhecer a verdade pode ajudar a tornar-nos mais livres, senão inteiramente livres. Na medida em que podemos ver a verdade com clareza, ela é que os homens e as mulheres por seus objetivos inconscientes frustram não apenas uns aos outros, mas também os filhos? Segundo a teoria psicanalítica, a consciência é um censor interiorizado, exercendo uma influência sobre as decisões do ego semelhantes à voz dos pais e professores na infância. Parte dele parece ser consciente, e detém certos ideais; porém a julgar pelas consequências, é certo que uma parte maior dele é inconsciente e age de maneira punitiva, regateadora, muitas vezes cruel e desonesta? Por esta razão, pessoas grandemente conscienciosas são muitas vezes pessoas cruéis, duras, destruidoras. São muitas vezes mais, ainda mais severas com elas mesmas do que com os outros, embora isto pareça menos importante para o mundo? Os sistemas religiosos cresceram e prosperaram sobre uma consciência cultivada. Podemos então resumir o destino da energia agressiva na pessoa teórica normal na qual foi apropriadamente neutralizada pelo amor, da seguinte maneira: um pouco dessa energia foi completamente recalcado; um pouco foi expresso diretamente em autodefesa ou proteção aos outros; um pouco é expresso em sublimações; um pouco interiorizado como consciência. No individuo menos normal teríamos de admitir a porção que é diretamente expressa contra os outros como crueldade, roubo, assassínio, provocação e outros, assim como aquela que é dirigida novamente contra si própria, como depressão, neurose e suicídio?
De todos os métodos disponíveis para observar as energias agressivas da humanidade para uma direção útil, o trabalho toma o primeiro lugar? É claro que o poder de destruição do baleeiro é diferente do lenhador, e o poder de destruição do lenhador é diferente da do mineiro, e o do mineiro é diferente da do cirurgião; todos eles, porém, estão trabalhando contra uma coisa qualquer num esforço de dominar uma situação ou um material e produzir por fim uma coisa qualquer? O trabalho ficou dissociado do prazer na medida em que se dissociou da iniciativa individual. A concepção do trabalho como servidão que cada um sente de certa forma, e que algumas pessoas sentem em grau muito alto, está inseparavelmente ligada a esta resistência à autoridade. Com o decorrer do tempo, com o desenvolvimento da sociedade, esta autoridade projetou-se para dentro, e o trabalho ? que tinha sido anteriormente um livre extravasamento de energias agressivas ? ficou rodeado de certo halo sentimental de sacrifício. Era definido como enobrecedor e considerado um fim em si mesmo. Mas ainda era trabalho? A satisfação no trabalho pode estar relacionada às maneiras em que o instinto erótico pode de fato neutralizar os elementos destruidores na sublimação do trabalho? Talvez três quartas partes dos doentes que procuram os psiquiatras sofrem de uma deterioração que lhes vela a satisfação com o trabalho ou sua capacidade de trabalho? O trabalhador, usando suas energias agressivas para salvar os outros, está salvando a si mesmo? Sua necessidade econômica torna o trabalho um meio para um fim, importante pelo que produz; sua necessidade psicológica torna-o um fim em si, importante pelo que faz? Aqueles que louvam exageradamente a alegria do trabalho são provavelmente pessoas que não são obrigadas a fazer alguma dessas coisas?
O divertimento é um estimulante melhor para o crescimento e o desenvolvimento do que o trabalho porque corresponde às exigências da natureza numa maneira natural e oportuna? No divertimento as emoções tornam-se purificadas de grande quantidade de propriedades desagradáveis e perigosas que aderem a elas? O fato da atividade do divertimento não ter objetivo final importante distingue-a nitidamente do trabalho? É conceito geral de que se gosta mais do divertimento do que o trabalho. Não é sempre ou necessariamente verdade. Muitas pessoas parecem gostar do trabalho mais do que do divertimento, porém são consideradas neuróticas, excêntricas ou gênios? O divertimento capacita a pessoa a voltar àqueles agradáveis intervalos da infância em que se podia fazer apenas o que se quisesse? Além disso, no divertimento ela pode despojar-se dos disfarces? Não há necessidade de se controlar, não há necessidade de ser hipócrita? Quanto mais complicada se torna a civilização, e quanto mais intenso e minucioso vai ficando o mecanismo de viver, tanto mais necessidade se tem de criar o divertimento, ou seja, essa fuga provisória da realidade? As agressões e hostilidades que se presume serem absorvidas pelos jogos extravasam do recalque para a consciência, e o resultado é uma briga. Isto se aplica não somente ao brinquedo da criança como ao jogo do adulto, e não somente as formas físicas de divertimento, mas também as competições mais simbólicas como os jogos de mesa?
A garotinha trata de fato sua boneca como se fosse uma criança, porém não lhe dá somente amor, e sim, a menos que seja excessivamente inibida, ódio também. Trata-a como ela própria foi tratada (o que significa que castiga a boneca como foi castigada), e dessa forma desforra-se da mãe. Ou trata a boneca como deseja que a mãe a tivesse tratado ? outra forma de vingança contra a mãe. As vezes trata a boneca como gostaria de tratar os irmãos e irmãs, o que é ainda mais provavelmente agressivo? O mesmo se dá com os meninos. Gostam de brincar com cubos, construindo torres ou casas com eles, e sentem grande fascínio por trens ou automóveis de brinquedo. Ao se observar atentamente como manipulam estes cubos, o que fazem com estes trens e automóveis, compreender-se-á logo que as fantasias mais violentas e destruidoras são representadas por eles? As pessoas que não se divertem são potencialmente perigosas?
É muito mais fácil ilustrar a utilização terapêutica do divertimento no caso do teatro do que no caso das muitas formas de terapia recreativa? A base de tal tratamento é a teoria de que os doentes são pessoas dominadas por seus impulsos destrutivos, e que estes impulsos são autodestrutivos em vez de exteriormente agressivos porque a pretendida aplicação da agressão exteriormente foi perigosa demais. Poder-se-ia dizer que os doentes ficam doentes mentalmente quando suas sublimações lhes faltam, quando não conseguem mais trabalhar ou divertir-se? Chegamos por fim aquelas formas de divertimento mais requintadas e estilizadas ? a dança, a arte e a música. Estas modalidades têm aspectos tanto ativos como passivos. Pode-se desfrutá-los por participação ou vendo-os ou ouvindo-os? A objeção puritana a dança, sob o pretexto de que representa uma relação sexual levemente disfarçada estava intuitivamente certa em sua interpretação? Da mesma maneira, a música e a arte proporcionam um profundo prazer erótico que está provavelmente relacionado psicologicamente a satisfações anteriores ao prazer sexual?
O problema da vida está em controlar e dirigir as agressões? A agressão e a sexualidade, porém, sendo partes integrantes da natureza humana, estão fadadas a funcionar, tanto para o bem como para o mal, enquanto a vida durar. Se fizer a tentativa de negar seus direitos e excluí-los da participação na vida para sempre, terão de desviar-se para canais de ódio e de destruição? Segundo as teorias psicológicas, as tendências agressivas da criança, são dirigidas contra a autoridade dos pais e trazem um desejo de suplantá-los. Mas suplantar e substituir os pais significaria renunciar as vantagens inerentes a sua dependência deles. Esta é a base do conflito que tem como resultado o recalque? A religião soluciona esse conflito construindo uma autoridade grande demais para ser destruída, bondosa e benevolente demais para ser odiada?
Geralmente uma pessoa com uma crença forte num Deus de justiça e de bondade é aquela que foi aquinhoada com um progenitor amante e incorruptível ? embora seja também verdade que às vezes se encontra justamente o fenômeno oposto: uma pessoa cujos pais eram tão decepcionantes que a criança cedo criou a ilusão de um bom pai imaginário a quem ela subsequentemente identifica com o conceito histórico de Deus. Infelizmente, muitas pessoas que abraçam a religião não tem este padrão. São perturbadas por dúvidas, perseguidas por uma sensação de pecado, inclinadas a rituais e cerimoniais coercivos, e propensas a profunda tolerância. Estas coisas representam suas grandes indecisões e ambivalências para com a autoridade?
O pessimismo filosófico a respeito da vida está ligado a inibições internas de alegria e satisfação próprias, que, por sua origem e destino segundo a análise, só podem ser consideradas como artefatos na evolução do individuo. E encontramos, além disto, que a deterioração do natural gosto pela vida é mais frequentemente resultado dessas inibições internas do que do infortúnio infringido de fora, por mais sério e mais duro que seja? A esperança é a consciência de que temos forças dentro de nós, seja qual for o nome que lhes derem? O ditado de que a antecipação é melhor do que a realização reconhece o fato de que as experiências da personalidade em se preparar para um acontecimento são, muitas vezes, tão vivas e tão estimulantes que a realização verdadeira se torna parte menor do todo? Toda a pessoa tem dois mundos em que exprimir suas esperanças ? um mundo de realidade interior e um mundo de realidade exterior. Crescer consiste em amalgamar num grau considerável estes dois mundos, embora nunca completamente? Os adultos que não podem renunciar à predominante imaginação sonhadora da infância, que continuam a viver num mundo particular apartado do mundo real, são considerados esquizofrênicos. As ilusões dos esquizofrênicos, como os sonhos acordados das crianças, são as esperanças e os desejos. Não são esperanças ou desejos irreais. No consenso geral, não correspondem ao mundo como nós o conhecemos, e, portanto, são irreais para nós; porém são reais para a pessoa esquizofrênica, e determinam seu comportamento, sua alegria, sua vida real. O pessimista, ao contrário do esquizofrênico, mas como todas as personalidades neuróticas, tem um mundo de realidade tanto interior como exterior, mas é incapaz de conciliar ambos de maneira a lhe proporcionar uma satisfação normal?
Ter filhos é apenas natural, e muitos acreditam que não deveríamos tentar aplicar a inteligência ao que é uma lei natural ou a vontade de Deus. Parece-me, porém, que se não formos inteiramente pessimistas, se tivermos mesmo alguma esperança de que nossos filhos agirão melhor do que nós agimos e de que seus filhos agirão melhor do que eles, seremos obrigados há pensar um pouco nas circunstâncias em que as crianças vem para o mundo? Muito mais importante do que os exemplos dramáticos em que a hostilidade de uma mãe arruína a vida de um filho indesejado, são os efeitos mais gerais do ódio maternal recalcado. Enquanto uma criança reage a isto com uma doença mental aguda, dezenas de crianças reagem de maneiras mais sutis, criando barreiras de legítima defesa contra a percepção íntima da sensação de ser indesejada. Isto se pode evidenciar numa luta teimosa ou num plano em que se procura atrair a atenção por um comportamento desagradável e até por atos criminosos?
As mulheres que são capazes de criar filhos, mas preferem esbanjar sua afeição com cães, gatos e passarinhos, que estremecem horrorizadas à ideia da gravidez, estão mostrando uma imaturidade de desenvolvimento psicossexual que evidencia uma inaptidão para a maternidade. Um playboy adulto que prefere passear com um grande cão policial em vez de ter um filho, nunca se tornaria um pai conveniente, por mais fecundações que realizasse. Peço que observem que eu disse em vez de; evidentemente os animais não são um mal em si mesmos; na verdade, proporcionam escoadouros consideráveis para o amor? A hostilidade inicial evidenciada pela nenhuma vontade de ter o filho é simplesmente traduzida em formas mais disfarçadas da aversão à criança?
Quando leio que a instrução existe para habilitar-nos a viver e a viver de maneira mais rica, penso em alguns de meus amigos analfabetos das fazendas do oeste ou dos sertões no norte, e comparo a riqueza e a plenitude de suas vidas à esterilidade, ao vazio e a frustração das vidas de muitas pessoas pretensamente instruídas. Quase me parece, às vezes, que a instrução é uma coisa qualquer que obrigamos as crianças a suportar a fim de impedi-las de gozarem a vida. Tenho certeza de que muita criança tem os mesmos sentimentos? Então porque que nós aprendemos? Porque as crianças se dispõem a realizar a renúncia às satisfações infantis e lutar em direção da maturidade emocional e intelectual? Por uma razão fundamental: porque precisam do amor que temem perder se não aprenderem, e que acreditam poder conservar fazendo as renúncias necessárias para a aceitação das partes da realidade. Em outras palavras, as crianças aprendem principalmente a fim de agradar à professora e aos pais que ela representa. O padrão específico do saber é, naturalmente, adquirido muito antes de terem visto uma professora, mas é reforçado, desenvolvido, deturpado ou estragado por professoras subsequentes, segundo as personalidades dessas professoras.
Disse que este era o motivo primordial, mas é preciso mencionar alguns importantes motivos secundários? Um deles é a esperança da criança de conseguir respostas a perguntas estimuladas por sua grande curiosidade a respeito dos fenômenos físicos que não compreenderam inteiramente? Outro motivo secundário é o desejo de obter um poder ou uma autoridade maior por meio de técnicas que parecem propriedade comum de seus superiores. E por fim, é indubitavelmente estimulada a tentar utilizar suas faculdades em expansão para dominar novas situações, impulsos como o que vemos repetido de maneira menor nos adultos que gostam de quebra-cabeças? O que a professora é, é mais importante do que o que ela ensina? A infância é a época de as crianças serem más e os pais (e professoras) serem bons, em vez de o contrário? A identificação das forças dentro de nós constitui o primeiro passo para seu controle; e nossa inteligência deveria ser aplicada na previsão ou na reparação do mal, mais do que em inventar mais formas engenhosas de destruição retaliatória. Aplicado ao indivíduo sofredor, este é o princípio da terapia psiquiátrica; aplicado às dificuldades do mundo, é uma filosofia educacional racional?
Mantida, porém, em proporções justas, a aplicação de amor em objetos não humanos não é um sintoma e sim uma forma ou variedade de amor. É uma forma particularmente necessária para as pessoas para quem os objetos humanos se revelaram insatisfatórios ou insuficientes, principalmente na infância? Tanto o ódio como o amor pode ser dirigido para estes substitutivos não humanos dos pais (as coisas, posses ou objetos)? O amor é prejudicado menos pelo sentimento de que não somos apreciados, do que por um pavor, sentido mais ou menos obscuramente por todos, de que os outros vejam através de nossas máscaras: as máscaras do recalque que nos foram impostas pela convenção e pela cultura. É isto que nos leva a fugir à intimidade, a manter as amizades num nível superficial, a subestimar e deixar de analisar os outros, temendo que nos analisem bem demais? É espantoso como tantos amigos, até parceiros conjugais, passam a vida numa ignorância completa da natureza um dos outro ? além de certas exterioridades mecânicas. O amor é sentido como um prazer na proximidade, um desejo de se conhecer melhor, um anseio de mútua identificação e de fusão da personalidade?
Ser compreendido significa que alguns de nossos piores impulsos assim como os nossos melhores são percebidos por nosso amigo, que sabe tudo a nosso respeito e assim mesmo gosta de nós. Uma vez estabelecidas esta compreensão e identificação mútuas, a amizade funde-se em amor. E como é revelado? Aqueles que não mostram seu amor não amam. Na grande maioria dos casos nosso amor um pelo outro é expresso de maneiras não físicas, no intercambio de ideias ou no deleite comum de um prazer. Uma das formas tradicionais é o ritual de comer ou beber juntos. Receber alimento é a primeira expressão de amor que a criança entende; é sua apresentação ao amor. Portanto o valor simbólico de ser alimentado permanece importante através da vida. No inconsciente, alimento é igual a amor? Outra maneira pela qual se pode incrementar o amor é conversando? Mais importante do que falar é talvez ouvir. Acredito que ouvir é uma das técnicas mais poderosas e influentes do convívio humano. O elemento principal da técnica da psicanálise é ouvir ? ouvir sem criticar, mas com atenção?
A identificação conduz por extensão a um desejo de união. Esta união pode ser idealista, pode ser intelectual, pode ser social, pode ser física. De modo geral, estes são os passos no programa do amor? A capacidade de amar cresce com as oportunidades e ocasiões que lhes são propiciadas para se desenvolver? Liberdade sexual não é promiscuidade? Na mente consciente, o objetivo do amor é considerado rebaixado, mas a tendência natural a identificar os elementos ternos e físicos na intimidade sexual muitas vezes suplanta o tabu social? Se não vivermos para o prazer estaremos em breve vivendo para o sofrimento. Se não considerarmos sagradas as nossas alegrias e as alegrias dos outros, abriremos a porta e deixaremos entrar na vida o mais feio atributo da raça humana, que é a crueldade, raiz de todos os outros vícios? O amor é o desejo do todo, e a busca do todo é chamada amor??
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