Maciel.Heliton 05/09/2023
Uma leitura para despertar.
Comecei lendo corriqueiramente. À julgar pela numeração de páginas, considerei um trabalho rápido para devorá-lo, mas me surpreendi. No meio do livro, quando já havia deglutido porcamente as informações até ali, de uma forma inesperada o tom de Mito passou a ser meu filtro. E já em algumas linhas percebi que teria de lê-lo novamente desde o início. Considerando que todos os personagens são um só - como o próprio autor descreve no início - eis sua lenta auto destruição representadas por personagens que carregam metafóricamente suas condições humanas ou vítimas. Seja sua vaidade, sua ganância, sua "namorada chata nutricionista e psicóloga " ou Lucídio, a morte espreita que nunca mostra os dentes, o livro pode contar sobre a avaliação dessas características do próprio autor e como elas morreram uma a uma ao atingir seus excessos, se perdendo em sua própria fome e conscientemente se entregam aos seus fins. Mesmo relutantes. Fica mais fácil para algumas morrerem conforme compreendem que esse é seu destino, que já não cabem mais ali e que a morte faz mais jus do que sua existência. Daniel - o único sobrevivente - é o excesso gordo e desajeitado sobrevivente do autor, aquele que poderia ser morto também, mas que sobrevive para contar a história ao lado do Spector, e que também garante a vida de um escritor falante, de muitas palavras, de Veríssimo, que precisa do dinheiro. Daniel é o que sobrou do próprio Veríssimo, é o guloso permitido e alimentado por ele, aquele necessário que possibilitou esse grandiosíssimo escritor transbordar até os dias de hoje, me fazendo refletir sobre meus próprios lutos necessários. Uma obra que satisfaz.