Jô 15/04/2024
Começamos nossa jornada pouco depois do desembarque do RMS Etruria do livro anterior. Audrey Rose Wadsworth e Thomas Cresswell estão em Nova York. Audrey está perambulando pelo distrito dos açougues da cidade, junto de sua prima Liza, quando é informada de um assassinato. Um corpo de uma mulher foi encontrado não muito longe dali e ela parte, junto de Thomas e seu tio, um perito muito conhecido e famoso, para investigar. Sabemos que ficou um mistério desde o navio, sobre uma figura sombria que pode ter desembarcado junto com eles.
Lidando com sequelas de um evento traumático no navio, Audrey Rose sofre com dores frequentes. A autora admitiu que também sofre de dores e queria colocar essa característica na protagonista de maneira a fazer as leitoras se identificarem. Admito que essa parte ficou interessante, porque eu sofro de dor crônica e houve momentos em que me identifiquei muito com o sofrimento de Audrey Rose, de como ela precisa dar tudo de si ainda que esteja tremendo de frio e de dor. Audrey também é uma moça vaidosa, que gosta de belos vestidos, de compras, e essa parte também aparece no livro, talvez até demais, sobrepujando suas qualidades de investigadora e perita.
Eu já conhecia a história de Holmes, o homem do título, por ter lido a ótima biografia dele que também foi lançada pela DarkSide. Por isso fiquei esperando para ver como a autora colocaria esse homem tão complexo na trama. E fiquei esperando, e esperando, e esperando... Audrey, seu tio e Thomas começam investigando mortes misteriosas que parecem ter uma semelhança inquietante com outro assassino que eles já investigaram antes. E apesar de saberem que não é possível, eles também sabem que não podem descartar nada. A polícia de Nova York está nervosa e está pressionada pela imprensa e pela opinião pública.
E aí a autora faz algo realmente irritante, algo que já vem desde o terceiro livro, que acabou tirando meu interesse por esse aqui. Ela esquece tudo isso, esse assassino terrível que tem eviscerado mulheres como um açougueiro pela cidade para focar... no casal. É isso aí. São mais de 250 páginas em que a autora trata de uma grande crise no relacionamento dos dois jovens, uma que foi resolvida em duas linhas de texto perto do final, e que poderia ter umas 150 páginas a menos. Estou desde o começo dessa série torcendo para que eles se peguem logo de uma vez para focarem nas investigações. Mas é um fogo que aparece do nada e toma conta de todas as situações.
E os crimes? E os assassinatos? E aquelas mulheres brutalizadas? E o thriller vitoriano de investigação que a sinopse me prometeu? E as cenas de autópsias, as perseguições? A autora optou por focar no romance, seja por pressão das leitoras, seja pela pressão dos editores, sei lá, mas continua vendendo os livros como romances investigativos. O assassino, os crimes, são apenas um detalhe na vida amorosa de Audrey Rose e Thomas. O casal, os dramas, os choros e todos os empecilhos para que o nobre (e absurdamente jovem casal) fiquem juntos tomam todo o espaço da narrativa que poderia ser brilhante e não é. Ao invés de quatro livros, fiquei com a impressão de que deveriam ter sido apenas dois.
Não me entenda mal. Eu gosto de bons romances. Audrey e Thomas são ótimos personagens, inteligentes, astutos, mas perdem o cérebro quando estão perto um do outro e a autora dá um espaço descomunal para o amor ameaçado deles. E são ameaças que, convenhamos, foram muito fracas, desde o livro anterior e neste livro aqui. A resolução foi toda fácil demais para 250 páginas de choro e drama. Eu não aguentava mais. Se o livro se vende como uma obra investigativa, entregue isso para quem está lendo e não foi entregue. E o que foi não é nem suficiente para criar a tensão que vemos nos primeiros livros.
Quando o tal Holmes, o maligno do título aparece, depois de quase 300 páginas de blá blá blá sobre o sofrimento de Audrey e Thomas, eu já estava tão de saco cheio que não ligava mais para quem morria ou vivia, se pegariam esse sujeito ou não. Só queria que o livro acabasse. A autora teve a oportunidade de criar a protagonista mais incrível neste segmento, mas criou uma moça boba e deslumbrada por um rapaz a ponto de perder a inteligência. Isso não é empoderamento.
Gostei da forma como a autora transferiu a ação de Nova York para Chicago, ainda que isso tenha demorado muito para acontecer, o que poderia ter salvado o livro bem antes. A cidade tinha sofrido um incêndio devastador em 1871 e estava se renovando, tornando-se um centro de arrojo e avanços em comparação a outras cidades. Continuar a caçada ao assassino misterioso na cidade condiz com a biografia do Holmes original e a cidade, além da Feira Mundial, estão bem descritos.
A edição em si é muito bonita, caprichada, seguindo o padrão dos livros anteriores. A tradução está muito boa, tendo ficado a cargo de Jana Bianchi e não encontrei problemas de revisão ou diagramação.