Jô 16/04/2024
Adultos é o 14º romance de Marian Keyes, uma das minhas escritoras favoritas de comédias românticas. Traduzido por Caroline R. Horta, traz o estilo conhecido da autora em um formato mais maduro e sutil, com um título absolutamente perfeito para o que entrega.
Os Casey são uma grande família, que passam muito tempo juntos em festas e viagens e se dão muito bem? Ao menos, à primeira vista. Quando segredos sobre diferentes membros da família são acidentalmente revelados em um jantar, não é apenas a relação de cada casal que fica abalada, mas as convicções que cada pessoa tem sobre si mesmo.
Marian Keyes inicia a narrativa de Adultos pela noite do jantar catastrófico, atiçando a curiosidade para o que nele será revelado. Então, retrocede alguns meses no tempo de maneira a situar o leitor. É quando ela pouco a pouco apresenta as personagens e as dinâmicas entre elas, e vai construindo as circunstâncias que levam ao clímax do romance, quase ao final da história, quando todas as confusões viram um novelo confuso e de difícil desembaraçamento. Aliás, a energia caótica que paira por todo livro é sentida desde os primeiros parágrafos.
O livro é narrado em terceira pessoa a partir de múltiplas perspectivas. Demorei um pouco para me situar, considerando-se a grande quantidade de personagens. Contudo, assim que me familiarizei, imergi na leitura e senti as personagens como conhecidas minhas, e mal via a hora de descobrir o desfecho que cada uma teria. Em geral, os livros de Marian Keyes trazem grandes pontos de virada, quando a atmosfera da história deixa de ser engraçada para entrar em uma área mais sensível e melancólica ? sem perder a leveza ? e o véu que cobria a percepção das personagens ? e do leitor ? sobre os fatos é retirado, dando outro sentido ao enredo. Aqui, isso acontece de maneira muito mais sutil, principalmente porque o humor e a melancolia andam de mão dadas desde o início de Adultos. Não há uma mudança de atmosfera ou de entendimento da história, mas sim um momento de clímax, para o qual tudo que foi anteriormente construído é direcionado ? e a partir do qual, haverá drásticas consequências. Há, sim, uma mudança de percepção das personagens sobre quem são e sobre o momento que vivem, quando o estágio delas de negação é enfim quebrado. Contudo, nesse caso, o leitor consegue distinguir a realidade e o que as personagens negam para si, em vez de viver com elas essa negação.
Com comentários engraçados e situações que às vezes beiram o exagero, Marian Keyes constrói com sensibilidade o sentimento de ser adulto, seja após os 40 anos, como a maioria das personagens, seja entre os 20 e os 30, como algumas outras. As dúvidas, inseguranças e vulnerabilidades estão todas lá, mescladas ao contínuo ímpeto de se seguir em frente, demonstrando como essa fase da vida é um constante apostar às cegas de fichas. Relacionamentos, questões financeiras, vida profissional e parentalidade são alguns dos temas abordados em Adultos. Um que merece destaque é o transtorno alimentar, que, em geral, aparece nos livros associado a personagens jovens, e aqui foge desse padrão. A autora explica a doença, retrata com maestria como funciona a cabeça de uma pessoa bulímica e demonstra seu impacto em diferentes setores da vida. Foi uma abordagem responsável e cuidadosa, que também acontece em outras discussões no enredo, como a questão dos refugiados na Irlanda e a pobreza menstrual, inseridos de maneira muito natural no todo.
O que posso dizer é que ri, me emocionei, fiquei aflita e me identifiquei com inúmeras passagens e personagens, terminando a leitura com um sentimento controverso, mas muito real. Nem todas as resoluções são as desejadas, ao menos em uma perspectiva mais romântica, mas são perfeitas para cada personagem. Fiquei com a sensação de que, quanto mais tempo passar e mais eu pensar no livro, mais vou gostar dele. Sem dúvidas, virou um dos meus favoritos de Marian Keyes.