catð 03/04/2024
Matadouro e Rios voadores
O Conto Matadouro se passa em uma fazenda na pequena cidade de Buruti Pequeno, onde uma garotinha animada se despede de Irene, sua mãe, quando tem a escolha de se mudar para Goiânia com a Madrinha. Irene já se sentia mal por ter aceitado a ideia, mas, ao se passar dois meses e receber a notícia de que sua menininha esperta foi morta por um ônibus, Irene surta.
Por ter sido diagnosticada com epilepsia quando pequena, Irene sempre foi considerada burra, mas não era só porquê não conseguia ler que não era esperta; morando com seu irmão, cunhada e sobrinha, sua opinião nunca foi levada a sério, ?sua filha estará segura? eles disseram.
Quando está perto do amanhecer, Irene se encontra a caminho do matadouro dos porcos, onde o irmão trabalha e, ao encontrar o que procura, volta para a casa, para o quarto da sobrinha, com uma faca na mão; e depois, ao quarto do irmão. Se Irene matou ou não o resto de sua família, fica a decisão do leitor, mas ao sair de casa com apenas uma bolsa e um óculos escuros para se esconder em Goiânia, fica clara sua ação.
O Conto Rios Voadores se passa na cidade de Buriti Pequeno durante um episódio de enchente. ?Depois de meses de estiagem, veio da Amazônia os rios voadores?. Onde moradores rezam para Santa Bárbara torcendo para que a chuva amaine, o que não acontece. Pessoas fogem de suas casas carregando tudo o que podem, torcendo para que a água não estrague o que tanto se esforçaram para comprar; pegam filhos e animais de estimação tentando esconder o nojo que sentem por ter que andar dentro da água suja de dejetos de todos os moradores da cidade. Tentando alcançar a igreja, único ponto que fica no topo da cidade, e que a água raramente chega.
O padre se prepara para abrigar todos, tantos que nem chega a caber na igreja, seja adultos, idosos, jovens, crianças, cachorros ou gatos, todos são bem vindos. É possível ouvir apenas preces e orações chorosas dos pais, rezando aves marias, mas o padre sabe que ninguém chegara para ajudar, e que os mais ricos e o prefeito fugiram há horas em seus carros de luxo, sabendo que uma intensa chuva vinha, enquanto pessoas choram de fome, frio e sede, já que nem a água das torneiras é potável mais.
?O padre sempre comenta que um trator só tratora, já o ser humano pode planejar o plantio, arar, adubar, semear, colher; não há máquina melhor que as mãos do homem. Mas só os que têm dinheiro ? e pouco usam as mãos para trabalhar ? puderam se safar da tromba que devasta a cidade.?
O único que não parece se importar com a terra se desfazendo é Zezinho, o até então único mendigo da região, que gargalha ao ver todos desesperados, torcendo para a água coloca-los para correr.
Quando acordarem de manhã, não lhes restara mais nada, as lojas e moradias terão sumido, e a única visão é de um imenso rio, com Zezinho boiando feliz, que engolira Buriti Pequeno, uma cidade que logo logo ninguém lembrara que existiu.